sexta-feira, 2 de agosto de 2002

O que vc quer ser quando crescer, perguntaram para ele entre um gole e outro de café na sala. Eu não sei, ele disse cabisbaixo. Como vc não sabe, insistiram, queriam que ele dissesse algo para impressionar a todos na sala, Vc não tem nenhum sonho, não tem nenhuma vontade, completaram. Nada, nenhum, ele mentiu. queria muitas coisas na vida, mas não tinha coragem de admiti-las por achar sempre que era distante e impossível de atingir. e todas as vezes que via que, talvez houvesse alguma possibilidade de alcançar o improvável, ele achava que não era necessário dizer a quatro ventos. pensava que era quase um pecado admitir seus sonhos publicamente. poderia passar como pretensioso. ou, ainda, tinha medo das vozes dissonantes entre os ouvintes. Vc não quer ser advogado, ou médico, continuaram a questioná-lo, e uma voz no fundo gritou, Engenheiro, o menino tem cara de engenheiro, fala, fala para todo mundo ouvir que vc quer construir pontes, prédios, tudo. ele não respondeu. ficou no canto, como estava, imóvel e com olhar assustado. Eu não sei o que quero, mas tenho certeza do que não quero, disse e surpreendeu a todos pelo tom sério. O que, disse o homem mais próximo a ele, O que vc não quer. Eu não quero ser vcs, respondeu.

ou ainda. Eu tenho certeza, intrigou a todos pela confiança. O que quer, perguntaram em quase uníssono, Eu quero ser deus, esse deus que vcs conhecem e confiam, esse deus que tudo vê e tudo faz, esse deus que cria e destrói com a mesma facilidade, esse deus que tem o poder de dar a vida e matar, esse deus que escolhe os destinos e prescreve os fins, esse deus que decide a sua vontade, e apontou para um homem aleatoriamente, ou a sua vontade, e apontou para outro, ou a sua, e apontou para mais um. Eu quero ser o dono da verdade, eu quero decidir o que vai acontecer e o que aconteceu, eu quero ser a sua vontade, a vontade de todo mundo.
silêncio de todos.

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