sábado, 14 de dezembro de 2002

Comédia da Vida Privada

Um pequeno preâmbulo primeiro: Quem dirá que o ano de 2002 não foi o ano dos documentários? Os motivos podem ser diversos – e eu aposto com mais entusiasmo na necessidade das pessoas de verem a vida real na tela, o que pode ser traduzido também pela moda de programas como shows da realidade na tv. Embora (é necessário admitir) seja difícil considerar qualquer tipo de filme um retrato completo da realidade, pela própria presença da câmera que inibe e ou força aos participantes à encenação. Deve-se lembrar, contudo, que o documentário tem como definição primordial “documentar” o que se passa em determinado assunto, logo retratar o real, o que nos faz voltar ao início. Mas chega de antropologia de botequim, vamos aos fatos.

Como é (ou deveria ser) sabido por todos, “Edifício Master”, do hors-concours Eduardo Coutinho, é uma colheita de depoimentos dentro de um prédio no bairro mais heterogêneo no Brasil, talvez: Copacabana. Por uma série de fatores (Copa já foi um bairro elegante há décadas atrás. Junto a isso, sofreu uma forte especulação imobiliária, que construiu espigões de quitinetes, e mais milhares de pequenos outros fatores que colocam Copa no meio do caminho entre a elite elegante do passado e a suburbanização total, no pior dos sentidos, que talvez só se salvou pela proximidade da praia e a distância do resto do mundo), só em Copacabana podemos encontrar um retrato médio fiel de quem somos nós. Nós que freqüentamos cinemas, que temos contas e mais contas para pagar, que suamos para fazermos um curso de inglês, que enviamos os filhos uma vez na vida para a Disney, que vamos à praia religiosamente aos domingos, que compomos a tal da classe média carioca e brasileira.

Foi como se o Coutinho tivesse substituído a tela de cinema por um imenso espelho e, ao entrarmos na sala de projeção víssemos nós mesmos, com nossos problemas de violência nas ruas, de emigração para os países ricos, ou com brigas em casamentos, medo da solidão, esperança em mudança de cidade para realizar algum sonho. São várias crônicas como as “Comédias da Vida Privada”, do Veríssimo, ou “Os Normais”, na tela, que fazem-nos rir por vermos nós mesmos ali em frente. Só que no caso do Coutinho, todas as histórias contadas são reais. Ou eles me enganaram direitinho.

O documentário é simples. Bastou colocar uma câmera em cima do ombro, fazer uma pesquisa anterior bem detalhada, e ter um entrevistador com voz de deus, como o próprio Eduardo Coutinho. Ao contrário do outro grande documentário do ano – “Bowling for Columbine”, do Michael Moore – “Edifício Master” é um filme simplista, de pequenas histórias, de gente comum. Mas, é ai que reside o seu maior mérito.

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