quarta-feira, 28 de maio de 2003

Vestido de Noiva

Por décadas, e até hoje, toda a obra de Nelson Rodrigues é bastante associada no meio comum a uma alcunha que ele, como dramaturgo, recebeu ainda na década de 50, pornográfica.

O que por si só, já denuncia um certo preconceito. Como se a arte pornográfica fosse menor ou pior que as que abordam outros aspectos. Mas esse nem é o caso.

É certo que as personagens rodrigueanas tem ligações extremas com sexo, traição e tudo que é comumente ligadas à pecaminosidade. Porém, isso foi a forma do autor de mostrar o temperamento forte e imprevisível de suas protagonistas e secundários.

Mas, antes disso ainda, deve-se ater a fatos muito mais concretos da obra de Nelson. Por exemplo, seu belíssimo texto, um clássico que consegue passar por décadas quase incólume e bastante vivo, cheio de poesia em forma de prosa, como costumava afirmar Manuel Bandeira. E principalmente, sua revolução estética, que começou com “Vestido de Noiva”.

Nelson sempre foi uma parabólica que captava tudo a sua volta. Por isso mesmo, não deixou passar em branco “Cidadão Kane”, o que ainda hoje é considerado o melhor filme de todos os tempos. O que foi proposto por Orson Welles, na sua primeira incursão no meio cinematográfico, tinha a ver com a forma como a história era contada, num eterno flashback e flashforward, começando pela cena final com a morte do protagonista e voltando até o início da cronologia.

O dramaturgo ficou impressionado com essa idéia e resolveu adaptá-la para o teatro, porém, a sua maneira. Assim, “Vestido...” não só mexe com o tempo real dos acontecimentos, mas se passa em três ‘tempos’, o presente, o passado, através de lembranças e o delírio da personagem principal.

Como o filme de Welles, a peça começa do fim, a protagonista está numa mesa de cirurgia preste a morrer. O espectador é bombardeado por diversas informações desconexas, que não se encaixam e não sabe o que acontece. Com o tempo, através de um jogo de reconstrução, da procura da verdade, descartamos o irreal para nos ater somente à verdade.

Claro que, mesmo assim, não é tão simples como podemos supor. O dramaturgo brinda-nos com jogos de idas e vindas, voltas, reformas de cenas, modificações, inclusões de outros personagens no meio da história, tudo para desvendar esse mistério. O espectador se transforma num quase detetive que, ao longo da peça, recebe pistas, algumas falsas, outras verdadeiras e monta sua própria resolução.

O que é mais incrível é que, assim como o filme norte-americano, a peça de Nelson, escrita em 1943, continua hoje atualíssima. É ainda mais vanguarda que muitas produções que hoje se julgam modernas. Na época que foi escrita, não tinha nenhuma correspondente no mundo inteiro. Nelson era um autor muito a frente do seu tempo e era julgado no Brasil muitas vezes apenas por seus personagens extravagantes. O que fez amargar um longo período de ostracismo. E ainda sofre com isso.

2 comentários:

Anônimo disse...

aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaameiiiiiiiiiiiiiiii esse conto

CNC disse...

Opa. Obrigado!