domingo, 2 de maio de 2004

Um adendo:

Eu acho que sou uma pessoa de introduções. Algo que, tenho certeza, dificultaria minha vida no rol dos jornalistas, os "diretos". Mas, relendo tudo o que eu tinha escrito aí embaixo, percebi o quanto falcatrua fui, principalmente se tratando de uma pseudo-resenha de um livro de resenhas, ou pelo menos de teses sobre literatura. Não escrevo quase nada de concreto, apenas passeio por cima de um tema, como se flutuasse acima de tudo, superficial pacas. Uso as palavras chavões que caracterizam a análise de uma, ãh, obra-de-arte e me dou como satisfeito. Talvez seja isso mesmo que (eu) queira dizer: nada sobre nada. Só como exemplo, pensei em começar a escrever sobre o livro, já que o terminei, e estou aqui, introduzindo um assunto que não sai do lugar sozinho.

Ao adendo, pois.

Eu queria só acrescentar, agora, findo o livro, que o melhor dele fica para o final. O tal Ricardo Piglia escreve dois textinhos curtos e os intitula de "teses sobre o conto" e "novas teses sobre o conto". Utiliza uns tais de Hemingway, Kafka e Borges como exemplos, a todo momento. A primeira tese é exemplar: um conto sempre conta duas histórias (uma nítida, e uma secreta). E a segunda, complementar: a história secreta é a chave da forma do conto e de suas variantes.

A idéia de Piglia é que o conto por ser tão breve, se resumir a poucos aspectos de um ação ou de um acontecimento, foca no âmago da trama, sempre desfechando como surpresa, pois só ao final ele apresentaria a segunda história, a secreta, que é tanto escondida.

Ele diz que o conto clássico tem um ótimo exemplo com Poe, e é fácil visualizar o que ele quer dizer com "duas histórias" dessa forma. O leitor crê no que o autor escreve como se fosse a única realidade possível, mas então, se surpreende quando descobre a verdade, encoberta, mas que sempre existiu.

Piglia escreve que o conto moderno - de Joyce no Dublinenses, seu exemplo - muitas vezes apresenta essa segunda história, sem uma surpresa ao final, e de maneira ainda mais entranhada, quase desaparecida. Mas ela está ali ainda.

O que mais me chamou a atenção foi, obviamente, uma obviedade que eu nunca tinha posicionado meus olhos. Segundo Piglia, o que faz a diferença entre os autores é somente a forma de encarar essas mesmas duas histórias implícitas e de como contá-las.

Logo de cara, ele cita uma anedota escrita por Tchekhov ("Um homem em Montecarlo vai ao cassino, ganha um milhão, volta para casa, suicida-se") e sugere as maneiras como aqueles lá de cima (Kafka, Borges etc) escreveriam essa(s) mesma(s) história(s) (Ganhar muito dinheiro e logo depois suicidar-se). É interessantíssimo perceber a desconstrução, quase como em uma homenagem aos autores, desses estilos. Percebemos que depois da grande invenção, da criação, é possível fazer uma cópia, sem muita dificuldade.

De todas as formas, assustadores. O livro e essa idéia.

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