terça-feira, 25 de julho de 2006

Visão nada distanciada

Em "Sindicato dos Ladrões", Marlon Brando faz um estivador que, depois da pressão da namorada e do padre, e da morte do irmão, denuncia um assassinato cometido pelo presidente do sindicato para uma comissão que investigava esses assuntos.

O fato seria "apenas" o resumo da trama de um dos maiores sucessos do cinema de todos os tempos se o filme não fosse dirigido por Elia Kazan. Kazan ficou famoso por, além de dirigir inúmeros sucessos da Broadway, delatar alguns homens do teatro / cinema / TV na famigerada comissão anti-comunista do senador McCarthy.

Ou seja, os paralelos são óbvios demais para passar em branco. O filme em si é bom, não excelente. O roteiro é bem construído, Marlon Brando está no auge da fama e deve muito do que o seu nome hoje representa a Kazan. Mas admito que não consegui me desvencilhar. Principalmente porque o filme tende a ser no mínimo maniqueísta.

Ao comparar a delação de Terry Malloy (Brando) com a sua, Kazan traça um paralelo entre criminosos e comunistas - no mínimo um absurdo. O que no primeiro caso é, além de defensável, a única maneira para sobreviver como indivíduo, no outro é uma vingança mesquinha e covarde que tinha o intuito (não único) de tirar o foco das atenções de sobre ele (Kazan havia sido comunista anos antes, mas desistira decepcionado com Stálin e todos os stalinistas - com toda a razão).

Sei que não é aconselhável avaliar uma obra através de uma lente que já nasce manchada, mas é difícil escapar desse viés quando percebemos um alto grau de puritanismo e moralismo na obra. Malloy se admite um vagabundo, sem muita inteligência e que tem na força física seu maior trunfo. Mas o estivador só muda de opinião quando influenciado pela família (a namorada) e pela igreja (o padre). Além disso, Edie (a namorada) insiste que o porto da cidade grande não seria o lugar certo para ele, depois da delação. Restando, apenas, o interior (country) do país. Ou seja, deveria se juntar aos seus, à América mais reacionária que há.

No todo, vale a pena e muito assistir a "Sindicato...". Como diz o site McCarthyism and the movies, só pelo diálogo entre os irmãos Malloy dentro do táxi (1) já valeria. O problema é que sempre fica com o gosto de defesa de tese, mal disfarçado na garganta. Roger Ebert que o diga (2).

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(1)
"Charlie: Look, kid, I - how much you weigh, son? When you weighed one hundred and sixty-eight pounds you were beautiful. You coulda been another Billy Conn, and that skunk we got you for a manager, he brought you along too fast.
Terry: It wasn't him, Charley, it was you. Remember that night in the Garden you came down to my dressing room and you said, "Kid, this ain't your night. We're going for the price on Wilson." You remember that? "This ain't your night"! My night! I coulda taken Wilson apart! So what happens? He gets the title shot outdoors on the ballpark and what do I get? A one-way ticket to Palooka-ville! You was my brother, Charley, you shoulda looked out for me a little bit. You shoulda taken care of me just a little bit so I wouldn't have to take them dives for the short-end money.
Charlie: Oh I had some bets down for you. You saw some money.
Terry: You don't understand. I coulda had class. I coulda been a contender. I coulda been somebody, instead of a bum, which is what I am, let's face it. It was you, Charley."

(2)
"In the film, when a union boss shouts, `You ratted on us, Terry,' the Brando character shouts back: `I'm standing over here now. I was rattin' on myself all those years. I didn't even know it.' That reflects what some feel was Kazan's belief that communism was an evil that temporarily seduced him, and had to be opposed"

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Curiosidade: Eva Marie Saint, que faz Edie, a namorada de Malloy, é Martha Kent na versão 2006 de "Superman".

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