segunda-feira, 9 de julho de 2007

Escritores

Fomos e voltamos de Paraty - quatro horas de distância da minha casa - num mesmo dia (sábado), só por causa da Flip. E obviamente valeu a pena. Infelizmente tive que retornar. Por mim, passaria a semana inteira na cidade que se transforma, nesse período, na sede de uma espécie de Rock in Rio das letras. E Paraty consegue ficar ainda mais bonita com tanta gente andando pelas suas ruas de pedra-paralelepípedo.

Assistimos a quatro mesas, todas as que pudemos. Não creio que uma tenha se destacado mais que as outras. A primeira tratava de Nelson Rodrigues, o qual me considero um ignorante, apesar de ser o dramaturgo a que mais peças assisti e de ter escrito uma pequena monografia; a segunda sobre os limites entre os formatos de ensaio e ficção - tema que me agrada muito, principalmente por ser fãzão de Borges; a terceira com um argentino (Alan Pauls) sobre como funcionaria o amor em seu romance "O Passado" - que apesar do tema específico e romântico foi bem interessante; e o último com dois grandes jornalistas sobre conflitos no Oriente Médio, terrorismo e essas coisas "sérias".

Cada uma com a sua característica, detalhes, momentos altos, frases impactantes, golpes certeiros. Jabor, em vídeo, falando sobre Nelson Rodrigues é uma aula- sempre (apesar de não gostar muito de sua pessoa física). Cesar Airas respondendo a uma pergunta boba sobre como é se sentir argentino e como está a Argentina hoje em dia foi um espetáculo. Ouvir Pauls junto com uma psicanalista transformar suas palestras, que tinha tudo para serem chatas, em algo interessante, foi, bem, interessantíssimo. E por último, acompanhar Robert Fisk, o maior jornalista de guerra vivo, mesmo com toda a sua coloração "vou salvar o mundo", foi tão empolgante como assistir a uma luta de boxe.

Mas o que mais me tocou, o que vou levar para sempre na memória, foi uma frase perdida, dita apenas para contextualizar toda uma idéia, não sendo nem de longe o interesse de nenhuma das mesas, principalmente porque era uma frase que respondia a uma dúvida que não permeia o cotidiano daqueles que subiram o palco, mas que, para mim, mal saído das fraldas literárias, e que talvez nunca saia mesmo, funcionou como um alento, um narcótico para a minha angústia cotidiana, algo como um raio de esperança, como uma iluminação. Leyla Perrone-Moisés, que participava da primeira mesa, sobre Nelson, disse, não exatamente com essas palavras, porque não consegui anotá-las, mas, com certeza, com essa intenção, que escritor seria aquele que processa as palavras.

Na hora fiz relação com aquela crônica do Veríssimo (a base da minha cadeia literária) sobre o gigolô das palavras e senti uma identificação e tranqüilidade. Soube, naquela hora, que havia os que eram dominados pelas palavras e os que as dominavam - e, sem nenhum traço de empáfia, pedantismo ou orgulho, apenas sentindo ser a verdade que me preenche, soube que eu era assim. As palavras, elas vêm para mim e eu faço o que eu quero. E não o inverso. Tenho uma relação de dominação.

Pela primeira vez, pude me considerar, com um pouco de indiferença, mas não esnobismo, com tranqüilidade, calma e, principalmente, segurança, um escritor. E olha que Airas (ou foi Pauls, o outro argentino?) disse que apenas um a cada mil "escritores" consegue sair das brumas da insignificância. Isso, realmente, não importa.

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