quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

O Rio e a nostalgia do que não se viveu

Todas as vezes que o tempo fica meio louco no Rio, como foi o caso do dia de São Sebastião, que além de ser o padroeiro da cidade dá o nome para ela, eu penso nos primeiros europeus que chegaram por essas praias. O mesmo acontece quando vou a lugares praticamente intocáveis, como Grumari, com aquele verde luxuriante quase em contato com o mar, revolto, aberto, oceânico.

Aquarela sobre papel sobre cartão do inglês Henry Chamberlain,
vista da sua casa, no Catete, por volta de 1820.

Fico com um pouco de inveja desses primeiros europeus que conseguiram ver uma cidade ainda, praticamente, intocada. Ou tocada por homens e mulheres que tinham um poder e a vontade de destruição muito menor. Era uma cidade com outra geografia. Com morros que não existem mais, com uma orla diferente. Sem prédios.

Olhar para a Grumari citada ali em cima, com a mata Atlântica ainda virgem [ou, ao menos, que me engana nesse sentido] e imaginar, ao mesmo tempo, Copacabana, e aquela selva de prédios, altos, quadrados, sem qualquer bossa, praticamente idênticos, como se fossem um a cópia do outro, dá um pouco de nostalgia do que não se viveu.

No Rio, isso é fácil, né? Já fomos um centro cultural e político ainda mais importante. Fomos o palco de grande parte dos movimentos musicais que se tornaram nacionais até o século XX. Somos vizinhos da História. Esbarramos em placas que nos contam onde Machado de Assis viveu, casou. Frequentamos os bares onde músicas foram escritas. Vivemos nas praias que mudaram comportamentos. Passeamos nos jardins do palácio onde o presidente se matou.

Mas não é a questão humana que mais me traz esse sentimento de ter perdido algo que nunca foi, exatamente, meu. Para mim, é como se a cidade, a estrutura física, fosse minha - mas não apenas minha, eu sei. E alguém, no passado, mexeu com ela, sem me perguntar se eu iria gostar. Por uma questão de cronologia, eu suponho.

Eu queria ver a Praia de Botafogo limpa, por exemplo. Antes do Aterro. Ter a condição de me entrar no mar calmo da enseada e poder, ao mesmo tempo, ficar completamente hipnotizado pelo Pão de Açúcar, que desde os primeiros navegantes chama a atenção com suas formas. Eu vejo a praia hoje e me sinto aviltado. Impedido.

O mesmo acontece quando, nas poucas vezes que passei em frente, vejo a subida para o morro do Castelo. Como era a vida ali, naquele pedaço tão próximo ao mar e ao mesmo tempo do lugar onde a cidade nascia e crescia e se desenvolvia? Nunca terei a minha opinião.

Eu queria ver o assombro na cara dos portugueses, espanhóis, italianos, ingleses, franceses, holandeses, que chegavam aqui e percebiam que tudo que se plantasse, dava. Que as temperaturas não eram tão amenas no verão, nem tão rigorosas no inverno. Que a umidade não era humilde. Que o clima variava diariamente e, às vezes, com mais frequência que diariamente. Que o verde era mais intenso, o azul, mais selvagem, o amarelo, mais quente. Que o nosso tempo era outro, nossa moral, mais flexível, nossa calma, mais contagiante.

Se um dia inventarem a máquina do tempo e me for dada a chance de usá-la, já sei exatamente para quando eu gostaria de ir. Eu gostaria de me assombrar também.

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