segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

O som ao redor

Antes de falar sobre "O som ao redor" itself, gostaria de comentar rapidamente o fato de tê-lo assistido em um cinema. Um cinema comum, num domingo qualquer, início da noite. Certeza de casa cheia, de pessoas que foram ver qualquer coisa, aquilo que conseguiram.



Ir a essas sessões é uma experiência completamente diferente da que eu estou / sou acostumado. Talvez eu não tenha vivido esse compartilhamento, esse estar junto com outras pessoas, tantas vezes. Mais novo, quando muito de nossos costumes e gostos começam a ser formados, quase não ia a cinema. Nova Iguaçu tinha apenas quatro, que eu me lembre, que não passavam filme pornô. Além disso, nos cinemas straight, eram exibidos normalmente filmes de terror, que eu sempre evitei, por medo, ou filmes que não me davam vontade de ir. Provável resultado: não me acostumei a dividir o espaço.

Na sala de projeção neste domingo, por volta das 19h, ao meu lado direito estava um casal muito feliz, muito feliz mesmo. Parecia um dos primeiros encontros. Ele comentava cada movimento de cena, ela ria em momentos inesperados, ambos perguntavam aos personagens do filme detalhes das suas vidas íntimas. Era como acompanhar duas narrativas: a do próprio filme, e a de alguéns tendo contato com o filme. Seria interessante se fosse a única intervenção. E se eu já conhecesse o filme.

Atrás de mim, havia um homem que lia toda e qualquer informação que aparecia na tela. Antes de os capítulos começarem, ele falava: "Cães de guarda", "Guarda noturno", "Guarda-costas". E, auge, chegou a conclusão que todos os capítulos tinham "guardas".

Por fim, ao meu lado esquerdo, ao fim da projeção, um senhor que passou toda a projeção razoavelmente quieto, não segurou sua opinião crítica, feita em tom amistoso de quem não quer, brasileiramente, desagradar ninguém: "Que filme mais sem pé nem cabeça".

Sobre o casal, imaginei que talvez esse seja um outro código que sempre imperou nas salas de cinema, e eu, que desacostumado, me senti deslocado. No fundo, não haveria ali certo ou errado, mas formas diferentes de encarar aquele espaço, e eu apenas tinha optado por uma, enquanto o casal havia escolhido outra.

O leitor me levou a pensar, horas depois, que ele estivesse com alguém com a visão prejudicada. Ele queria ajudar o/a companheiro/a a entender as minúcias do que ocorria, as sutilezas. O que é justo e injusto ao mesmo tempo. Justo com o/a companheiro/a, injusto com quem não está ali.

O último me deu vontade de conversar com ele, lhe perguntar, ou melhor, lhe entrevistar. "Por quê?", lhe perguntaria, "Por que você achou esse filme sem pé nem cabeça?". Ele representa, imagino, um outro perfil do chamado gosto comum. Aquele que é tão diferente da crítica, que usa a crítica de forma contrária. O que a crítica elogia, ele foge, o que ela destrói, ele corre atrás. O que esse personagem busca ao ir ao cinema?, fiquei me perguntando. O que ele enxerga da e na tela? Quais são seus outros divertimentos? Por que ele decidiu por esse filme?

Mesmo quando mostramos a nossa classe "média", quando colocamos um espelho na tela, eles não se reconhecem. Ou será que reconhecem e acham feio? Ou será que reconhecem e dizem: e daí? Ou se reconhecem e falam: não to pagando para ver o que eu vejo em casa.

Ir ao cinema ao domingo às 19h é, acima de tudo, um exercício de paciência, como ir a qualquer espaço público é. Há regras que são formuladas constantemente, limites que são testados, um pequeno microcosmo democrático é formado. Será que eu deveria ter falado com as outras pessoas? Mas quem me dá o poder de investir contra os outros? Quem me elegeu o xerife da sala? Quem disse que a forma como eu quero ver o filme é a única maneira possível? Ninguém. É a única resposta possível.

Nenhum comentário: