sexta-feira, 24 de maio de 2013

Economia dos afetos


É importante destacar aqui que o caminho que nos guiava a deus, esse deus que iluminou os homens-até-aqui, era um caminho que, para usar um vocabulário cartesiano, racional. Obedecíamos às regras desse deus porque tínhamos uma recompensa no fim dele. Ou acreditávamos que a teríamos. Era uma troca, uma barganha. Uma ação racional agora, portanto que negasse a emoção, a impulsividade, a força interna, a vontade, enfim, a vida, nos dava direito a um determinado tipo de privilégio no futuro. Era uma troca entre o não-viver agora e uma possibilidade de vida depois. Era uma poupança de vida. Economizava-se neste momento para quando realmente precisarmos, nós teríamos acesso.

O que Nietzsche fala, com a frase “deus está morto” é que o banco faliu. Que, aliás, ele nunca realmente existiu. Nós renunciamos à vida, economizamos vida, negamos as nossas vontades em função de nada. É claro que esse processo, em um primeiro momento, vai proporcionar um desespero, que é identificado como o niilismo. Mas Nietzsche sugere que utilizemos essa falta de perspectiva, essa dor que causa saber que fomos enganados por tanto tempo, que foquemos essa revolta para a vida. Tentemos, agora que descobrimos que não existe banco, que não há qualquer tipo de poupança dos afetos, que gastemos os nossos afetos o máximo possível agora.

Ele ainda sugere que quanto mais gastamos esses afetos, mais teremos afetos. Como se para estimulá-lo precisássemos mexer nele.

É então que Heidegger explica: podemos até mesmo seguir um deus, mas para esse deus ser um deus que não está morto, ou seja, um deus contra a vida, devemos seguir um deus a partir da nossa vontade de potência, do que vem de dentro da gente, ou, para usar uma palavra dele, do Ser.

Seguir um deus não é um problema em si. Seguir um deus porque somos obrigados a isso, ou porque não enxergamos outra possibilidade, ou por preguiça, falta de autoconhecimento, etc. é. O deus, ou os deuses, devem ser seguidos conscientemente, sendo dominados, ou ao menos estando sob a vigília, o controle de nossa vontade de potência. Melhor dizendo, é a nossa vontade de potência, essa força interna, esse vulcão que explode e nos faz nos movimentar, que escolhe o deus para o qual nós vamos genuflexionar. Com prazer.

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