domingo, 14 de julho de 2013

O que eu faria no lugar do Cabral?

A pergunta do título, claro, é hipotética. Muito dificilmente eu estaria no lugar do excelentíssimo senhor governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Primeiro porque eu não sou político. Segundo porque eu não sou político. Mas, vamos considerar a situação, vamos aceitar este absurdo. Ou melhor, vamos especular: o que um governador deve fazer caso haja uma série de manifestações contra ele, na casa dele, no local de trabalho...

Primeiro, governador, aceite: há uma galera que não gosta de você. Mas não gosta é muito de você. Não gosta tanto de você a ponto de perder noites e noites para enfrentar sua covarde polícia, que usa de abuso da força como instrumento único e diário de trabalho. O senhor, por exemplo, o senhor faria isso no lugar deles? Iria para rua para tomar tiro de borracha e respirar gás lacrimogêneo? Então, em primeiro lugar: respeito-os.

Eles podem ser peões dos seus adversários políticos. Podem ser espiões infiltrados por inimigos do seu secretário de Segurança, para desmoralizá-lo e, assim, acabar com o seu principal capital político. Podem até ser uma minoria raivosa, que não representa a grande massa que votou no senhor e o elegeu e o reelegeu. Mas eles estão apanhando e continuando. Eles te odeiam. E eu, se fosse o senhor, teria medo. Então, a segunda sugestão é: tenha medo. Homens e mulheres com ódio são perigosos. Verdadeiramente perigosos.

Agora, governador, vamos falar claramente: você tem que falar mais. Eu já imaginei que o senhor deveria, como fez Mário Covas em 2000, descer para enfrentar diretamente os manifestantes. Encará-los com coragem e sofrer as consequências desse encontro. Demonstrar - ou fingir - que o senhor não tem medo deles e que vai continuar a agir dentro do que acha o correto. Mostrar, como o comandante das forças policiais do estado, você deveria ser a vanguarda desse embate. Ser um líder, um exemplo, um estadista. Mas eu acho que isso vai ser muito difícil para o senhor. Ao menos, pelas atitudes da sua covarde Polícia Militar, acho que o seu chefe máximo não é muito diferente. Tudo bem. Quem, além desses arruaceiros, não é covarde, não é mesmo?

Mas sejamos claros, governador: o seu cargo não lhe pertence. Não mesmo. O seu cargo pertence àqueles que votaram - no senhor ou contra o senhor. Repare: o seu cargo também pertence a esses aí que estão com raiva do senhor. O seu cargo é do estado do Rio de Janeiro, e de seus cidadãos, mesmo que muitos estejam alijados do conceito de cidadania.

Portanto, governador, o senhor deve aparecer mais em público. Deve dar mais coletivas. No mínimo. Não se portar como um porta-voz, que, muito raramente, dá declarações e some em seguida. O senhor deve mostrar mais o seu rosto fofo, para que as pessoas possam lhe fazer mais as perguntas que todo mundo quer fazer. O senhor não pode sumir porque, como dito ali, o mandato não pertence ao senhor.

Eu sei, eu sei. Jornalistas são chatos. O senhor, inclusive, é um representante da classe. Dos jornalistas, deixemos claro. Não são como os vândalos arruaceiros - deram um nome para eles, "black bloc", legal o nome, né?, em inglês! - não, mas são chatos. Querem saber de detalhes que para você não importa. Só porque querem saber dos seus inúmeros helicópteros. Da sua ligação pessoal com empreiteiros. São demagógicos, isso. Quem não quer fugir do engarrafamento? Quem, se pudesse, escolheria enfrentar engarrafamentos diariamente? Se estivessem no seu lugar, fariam a mesma coisa. Mas, bem, governador, eles não estão, é o senhor que está e o senhor deve explicações, pelo seu cargo.

Sejamos justos, por favor, governador, concorde comigo: o senhor pode se queimar um pouco ao falar muito com os jornalistas. O povo talvez não entenda que você, perdão, o senhor usa os helicópteros por uma questão de praticidade. É muito mais rápido e o senhor é um homem ocupado, cheio de afazeres, tem que ganhar tempo, não pode ficar preso no engarrafamento, etc. etc. etc.. Mas o senhor tem que falar.

Pense nos grandes homens, nos grandes estadistas. Pense em Churchill, talvez o maior político do século XX. Conservador, como o senhor. Queria manter o já em franca decadência império britânico em pé. Chegou a lutar na guerra dos bôeres. Um pouco antes da segunda guerra, foi uma das únicas vozes contra a campanha pacifista que dominava o discurso na Inglaterra e contra a ascensão de Hitler na Alemanha. Olhando agora, em perspectiva, é claro que ele estava correto, mas coloque-se - se possível, claro - no lugar deles, dos ingleses: eles tinham acabado de sair de uma guerra imensa, com muitos prejuízos, muitas mortes, muito sofrimento. A última coisa que eles queriam era outra guerra, e de proporções ainda mais gigantescas.

Mas Churchill, a voz solitária, estava certo e aconteceu o que aconteceu. Logo depois da Inglaterra entrar em guerra contra a Alemanha, Churchill se transformou no primeiro-ministro e sabe o que ele fez? Falou. Falou, falou e falou. Entre todos os grandes feitos de Churchill está o fato de ele ter unido o povo, mostrado que os tempos eram de uma emergência nunca antes enfrentada, mas que o povo inglês nunca iria se render.

Eu sei, eu sei, Churchill era um grande orador. Mas, pense bem: ele também era jornalista, como o senhor. Na dúvida do que falar, peça ajuda ao seu pai, outro grande jornalista.

E, sim, sim, mesmo que Churchill tenha sido considerado essencial para unir a Inglaterra, trazer os EUA para o conflito, e, enfim, ter ganho a guerra, ele não foi eleito pelo povo no primeiro pleito que aconteceu logo depois. O povo, novamente, queria a paz e ele era um homem da guerra. Isso quer dizer que nem sempre conseguimos agradar a todos.

Ah, mas governador, pense só: o senhor não pode nem mesmo concorrer nas próximas eleições. Que maravilha.

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