domingo, 8 de setembro de 2013

Corporativismo de todos os lados

Minha timeline ferve todas as vezes que um repórter é expulso das manifestações. Todos [jornalistas] chamando de imbecis [o adjetivo mais leve utilizado] os protestantes que convidam indelicadamente o trabalhador da imprensa, geralmente de uma das grandes empresas, ainda mais comumente da Globo e congêneres, a se retirar do fuzuê. Apesar de achar um absurdo essa proibição do direito de ir e vir, eu fico ainda mais constrangido com os comentários que vejo. Parece corporativismo. E é.


Tentarei me explicar antes que eu perca as amizades [virtuais]. Via de regra, os argumentos utilizados por quem reclama dessa expulsão - quando usa de algum argumento, além do xingamento - é algo como "o fulano estava trabalhando". Ou "ele estava denunciando a violência policial". Ou [o meu preferido] "isso é censura".

Temos que entender que o fato de alguém estar trabalhando não o torna mais especial que nenhuma outra pessoa. Ao contrário. Ele é mais desgraçado porque não tem muito direito a escolha [provavelmente teria preferido ir à praia que estar ali]. Daí, argumentar que ele deveria ser aceito porque não está ali por vontade própria não faz qualquer sentido. É como se fosse um prêmio de consolação. É um argumento que clama por caridade, num lugar onde os ânimos estão bastante exaltados. Não acho que funcione.

Também não adianta dizer que ele - o jornalista expulso - estava do lado certo: em vez de denunciar as quebradeiras dos black blocks [por exemplo], estava mostrando o poliça sádico que diz que gosta mesmo de bater nos manifestantes. Naquele momento, o jornalista-expulso não representa ninguém, além da canopla que ele segura. Se ela vier com um globo, em qualquer dos seus formatos, ele será mal-visto.

Essa generalização é certa? Claro que não. Como vimos recentemente no editorial do Globo, que dizia que houve um erro [histórico, não estratégico] em apoiar o golpe de 1964, as Organizações já tiveram dentro de suas redações até comunistas [!]. Mas [e agora quem vai falar não é o jornalista, mas o relações públicas] a imagem da maior empresa de comunicação do Brasil perante uma parcela cada vez maior e representativa da população letrada, classe-média [versão antiga], de ambos os espectros políticos, é péssima. A folha corrida da empresa é longa e as pessoas mais escolarizadas conseguem citar acusações e mais acusações contra o grupo.

Daí, os caras não estão expulsando o fulano-pobre-coitado que segura um microfone [ou um celular, em tempos recentes] com a marca da vênus platinada [sempre detestei esse apelido] e ganha uma mixaria [mesmo] ao fim do mês. Mas a própria coisa-ruim. Ele ali não é apenas um indivíduo, mas uma corporação de quase 100 anos e com muita roupa suja para lavar.

Como essa imagem pode mudar? Como esse ódio - é uma verdadeira raiva! - pode acabar? Certamente não de uma hora para outra. Até lá, os seus funcionários deveriam ganhar insalubridade. É o resultado, suspeito, de ser uma mídia de massa numa época de nichos.

Por fim, dizer que essa expulsão seria censura, pode ser, por mais irônico que pareça, a verdade. Não uma censura do estilo clássico, com um sujeito que lê todo o material antes de ser publicado, mas como um impedimento do ir e vir, que, em tese, está na Constituição e é para todos. Aqueles sujeitos mascarados [as personificações do mal, num duelo dicotômico e simplista entre bem x mal] se auto-outorgaram o poder da força e decidiram quem pode seguir e quem não. Mais ou menos como os traficantes e os milicianos fazem em favelas.

Mas, então, devemos lembrar que o conceito ali não é exatamente a não-divulgação de informações, mas uma tentativa de ataque ao exército do inimigo. Aliás, se há algo que os protestos cada vez mais se parecem é com o formato de uma mini-guerra, em que de um lado ficam as infantarias [os soldados Black Blocks, a inteligência do Anonymous, a comunicação da Mídia Ninja, a organização do Fora do Eixo], e do outro, o poder constitucionalizado, as instituições fixas, tudo o que já há, é ou está. Como sempre, somos pródigos em fla x flus.

Xingar os manifestantes por conta da expulsão de repórteres mostra, a meu ver, um ligeiro desconhecimento das causas mais gerais dos protestos, e de seus atores envolvidos. Além disso, cria uma atmosfera exclusiva, como se os jornalistas fossem melhores, diferentes ou imunes às coisas mundanas [o que não é o caso], como super-heróis de quadrinhos. Assim, fica complicado fazer qualquer crítica aos médicos por conta da vinda dos seus pobres colegas estrangeiros.

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