terça-feira, 2 de agosto de 2016

CHINANEWS: No topo de Pequim

Lembram quando eu falei que este bairro aqui era chique para padrões ocidentais, mas que tinha ainda lojas que eram consideradas populares em outros lugares do mundo? Já tenho outra teoria.

Ontem fomos a um bar no topo do prédio que, se eu entendi bem, é o mais alto de Pequim, com 80 andares. O lugar era chique para qualquer padrão do mundo. O nível de frescura era alto. Só não era mais alto que os seus preços. Para dar o tom: havia uma seleção de uísques escoceses de edições especiais cujos preços passavam dos R$ 5 mil. A Coca-cola custava algo como R$ 25. Uma dose do single malte mais barata: R$ 40. A Duvel, curiosa e comparativamente, estava barata para os [altos] padrões brasileiros: R$ 37. E não é porque eles têm uma boa relação com a Bélgica ou com o fabricante da cerveja: a Heineken estava R$ 30. É porque pagamos muito caro, muito caro, pela endiabrada loura no Brasil. [Mas antes de acharem que eu ganhei na mega-sena: não, eu não tomei nem água da bica no lugar.]

Essa era a porta da entrada do hotel que serve de apoio para o bar
No caminho para o lugar, quase fomos atropelados por um Ferrari e pude comprar cinco bombadas bananas e uma pêra vitaminada por 20 yuan, ou cerca de R$10, na rua, numa versão local da carrocinha de cachorro-quente [quando eu entreguei as duas notas de 1 yuan, mal interpretando o “v” dos dedos da vendedora, ela não fez nada além de rir de mim]; também vimos hotéis com inumeráveis estrelas e lustres pesadíssimos, ao lado de jovens executivos agachados de cócoras [depois escrevo minha teoria sobre essa posição]; ou ainda uma jovem da área de tecnologia vindo de rickshaw guiado por um típico malandro da Lapa versão pequinesa. Isto é: o confronto entre as múltiplas Chinas acontece, e muito, mesmo na ilha da fantasia.

O caso das marcas populares se poderia explicar assim. Prossigo.

Como todo mundo sabe, fui criado na aprazível e clima-de-montanha localidade de Nova Iguaçu. Quando nasci tal benevolente cidade ainda vivia longe das [pigarro para limpar a garganta] benesses da modernidade. Em resumo: não tinha shopping. Em outras palavras: Não tinha qualquer elemento que pudesse identificar a cidade com o Ocidente mais capitalista. Em mais outras palavras: não tinha sequer um McDonald’s.

Quando a loja do McDonald’s do primeiro shopping da cidade foi inaugurada, aconteceu o esperado: a procura foi tão grande que o pão acabou. As pessoas faziam filas imensas para pedir o dois-hambúrgueres-alface-queijo-molho-especial-cebola-e-picles-num-pão-de-gergelim. Comer o Big Mac era a certeza de entrar num mundo de privilegiados. Fazer parte de um grupo “diferenciado”. Era ser um tipo de elite. Era, enfim, ser moderno.

O McDonald’s, entretanto, é uma lanchonete extremamente popular em qualquer país que dita as regras para o restante do planeta do que é moderno ou não. Mesmo no Brasil, esse afã pela “novidade” do fast food diminuiu consideravelmente, em cidades maiores. Mesmo Nova Iguaçu já se tornou demasiadamente “moderna”.

O resultado disso é claro. Lá, engarrafamentos bizarros que travam a cidade e transformam o pedestre em um alienígena. Aqui, uma geração de chineses de garotos e garotas que trabalha até 20 horas por dia, dorme muitas vezes nos seus próprios postos, e nem tem tempo de gastar o [comparativamente com os países que ditam as regras] parco salário que recebem, quiçá ter alguma vida.

O Ocidente repete seus símbolos: carro, Coca-Cola, trabalho.

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