terça-feira, 23 de agosto de 2016

#Chinanews: o futuro da linguagem

Um coração sempre quer dizer < 3
Os caracteres chineses são a tentativa direta de uma linguagem que tenta ser mais visual, que tenta ser mais imagens que sons. Por exemplo, o 人, rén, em pinyin, a transliteração oficial, (se pronuncia com um "g" que sugere um "r", ou um som entre esses dois fonemas). Quer dizer "pessoas", "gente", mais de um fulano. Ao olhar para o caractere, não é exagerado falar que parece com o caminhar de um sujeito. Outro exemplo: 口, que quer dizer "boca" e se pronuncia algo como "kou / kŏu", e também parece uma abertura (alguns outros exemplos aqui).

Claro que nem todos o caracteres são tão correlacionados assim. Parece que há várias categorias e estes seriam apenas da categoria "pictogramas", mesmo, que tem exatamente essa características de lembrar um desenho. Na verdade, a linguagem seria infinitamente mais complicada se fosse apenas "representacional". Apesar de uma crença que eu tinha, o mandarim tem início-meio-fim, ou sujeito-verbo-predicado. E tem palavras bem mais abstratas. Tipo 大, dà, que quer dizer "grande" - e já dá para ver que o negócio começa a se desenhar.

De toda forma, mesmo que nem todos os caracteres sejam estritamente pictográficos, eles são, sempre, extremamente visuais. São desenhos, pequenas obras feitas com cuidado. A caligrafia aqui, aliás, é considerada uma arte, tão poderosa quanto, sei lá, a pintura.

Esses símbolos carregam em si um valor muito maior que uma simples letra carregaria. Ele já vem, sozinho, com toda uma carga de significados, que podem se multiplicar dependendo da maneira como a combinamos. Funcionam como uma espécie de emoticons versão -1.0. Como desenhos que ganharam vida sozinhos e foram se modificando ao longo do tempo.

Curiosamente, apesar de o mandarim ter a sua própria grafia de números (一, yi, por exemplo, quer dizer "um"), é extremamente comum encontrar os algarismos indo-arábicos (os que nós usamos) aqui, no meio dos ideogramas e dos pictogramas. Minha explicação-chute para isso é: os números também são símbolos, desenhos que são correlacionados a uma outra informação, como exatamente funciona os caracteres chineses. É o mesmo campo semântico.

Suspeito que, com a proliferação de designers que espalharam universalmente setas para cima e para baixo, botões verdes e vermelhos, carinhas que sorriem, choram e até duvidam, caminhamos nessa direção quando o assunto é linguagem. Não é bem uma surpresa, portanto, que a palavra escolhida pelo dicionário Oxford para representar 2015 seja um emoji: Face with Tears of Joy (só para efeito de comparação, a de 2013, na eleição bienal, foi "selfie"). O futuro da palavra não é exatamente um grunhido, como temia Saramago, mas um desenho - que retrata o grunhido, talvez?

Nenhum comentário: