Copacabana transcorria sem pressa envolta numa nuvem agradável de temperatura idem quando, neste ambiente tranqüilo, adentra uma coleção de mulheres de que, se não merecem respeito, anseiam admiração. Por coincidência lia uma coletânea de Antônio Maria e pensei: 'vou parar de cansar as minhas vistas e homenageá-lo de outra forma'. Foi assim, por um bom bocado de caminho. Eu, óculos escuros, mulheres de todos os calibres à minha volta, Copacabana deitada e quieta, sem ondas e cinza, contrastando com o Forte homônimo em seu extremo oriente.
Ontem ele fez o pior dos aniversários. Aquele que ninguém comemora, principalmente o aniversariante. Há 40 anos atrás, o pernambucano de 120 quilos portador de uma gargalhada estrondosa descontava um cheque num boteco e teve um segundo ataque cardíaco, na calçada perto do prédio de quarto e sala em que ele alugava uma unidade.
Costumava dizer que apenas ele e seu amigo Di (Cavalcanti) ainda não possuíam o sonho da casa própria. Autor de um dos clássicos brasileiros mais gravados no mundo inteiro ('Manhã de carnaval', em parceria com Luiz Bonfá. Descobri esse detalhe ontem, já que, de sua música, só leio as crônicas), e morre na sarjeta. A História, eu sei, é clichê. Mas como é curiosa.
Maria (para os menos íntimos), também soube na matéria dO Globo, é visto como um sujeito triste. Isso, como irretocavelmente afirma João Máximo, porque sabia fazer samba-canção de suas 'fossas monumentais como eram as daquele tempo'. O curioso, neste caso, é que eu tinha/tenho uma imagem completamente antagônica do sujeito.
Havemos de convir que ele nunca foi, quiçá será, tão famoso ou conhecido como o (Rubem) Braga, para desmitificar qualquer mal entendido. E, essa minha reação particular contrário ao senso comum deve ter como origem, o início de tudo. Só tive contato com o seu texto através de um escritor bem-conhecido pelo seu bom-humor: Verissimo. Numa crônica de três de junho de 1974 (depois reunido em seu 'Comédias da vida pública'), LFV comenta a reestréia de uma peça com texto de Maria: 'Brasileiro: Profissão Esperança'. E diz que 'faz muito bem em, de vez em quando, relembrar Antônio Maria'. O que logo é salientado no texto do gaúcho, porém, é a quantidade de frases memoráveis do plantel do filho caçula de Inocêncio Ferreira de Morais e Diva Araújo de Morais. Algumas:
'Eu, como sempre brilhante naquilo que irei dizer e em tudo o que poderia ser dito, na hora de falar não disse coisas nenhuma'.
'Quando alguém fala 'todavia' é porque a frase é decorada'
'Esta noite... esta chuva... estas reticências... sei lá'.
Demorei para me fazer o favor de adquirir algo de sua própria autoria. Depois descobri que esse meu entrave era motivado pelo fato de que sua obra só veio a ser reeditada ano passado, com pedidos de pelamordedeus do Joaquim Ferreira dos Santos. Antes disso, só com reza forte e em sebos. Aliás e inclusive, esse meu primeiro exemplar, se perdeu no buraco negro da casa do Zé. Comprei uma versão, agora há pouco, de 'Com vocês, Antônio Maria'. Leio como minutos de sabedoria: abro ao léu e traço a crônica que aparecer. Raramente me arrependo:
Na resposta à carta de uma leitora:
Sinto uma certa saudade daquilo que nunca vivi. Nostalgia, já ecoa em meus tímpanos. Pode ser. Apenas sei ao certo que, ao ler os seus textos, (parece) que vivo todo esse clima onírico - novamente. Coisas inexplicáveis. Como a morte aos 43 anos, como tantas outras coisas. Se valeu para alguma coisa, o dia de ontem, foi para rememorar Antônio Maria. E é sempre bom, de vez em quando, lembrar dele.
Ontem ele fez o pior dos aniversários. Aquele que ninguém comemora, principalmente o aniversariante. Há 40 anos atrás, o pernambucano de 120 quilos portador de uma gargalhada estrondosa descontava um cheque num boteco e teve um segundo ataque cardíaco, na calçada perto do prédio de quarto e sala em que ele alugava uma unidade.
Costumava dizer que apenas ele e seu amigo Di (Cavalcanti) ainda não possuíam o sonho da casa própria. Autor de um dos clássicos brasileiros mais gravados no mundo inteiro ('Manhã de carnaval', em parceria com Luiz Bonfá. Descobri esse detalhe ontem, já que, de sua música, só leio as crônicas), e morre na sarjeta. A História, eu sei, é clichê. Mas como é curiosa.
Maria (para os menos íntimos), também soube na matéria dO Globo, é visto como um sujeito triste. Isso, como irretocavelmente afirma João Máximo, porque sabia fazer samba-canção de suas 'fossas monumentais como eram as daquele tempo'. O curioso, neste caso, é que eu tinha/tenho uma imagem completamente antagônica do sujeito.
Havemos de convir que ele nunca foi, quiçá será, tão famoso ou conhecido como o (Rubem) Braga, para desmitificar qualquer mal entendido. E, essa minha reação particular contrário ao senso comum deve ter como origem, o início de tudo. Só tive contato com o seu texto através de um escritor bem-conhecido pelo seu bom-humor: Verissimo. Numa crônica de três de junho de 1974 (depois reunido em seu 'Comédias da vida pública'), LFV comenta a reestréia de uma peça com texto de Maria: 'Brasileiro: Profissão Esperança'. E diz que 'faz muito bem em, de vez em quando, relembrar Antônio Maria'. O que logo é salientado no texto do gaúcho, porém, é a quantidade de frases memoráveis do plantel do filho caçula de Inocêncio Ferreira de Morais e Diva Araújo de Morais. Algumas:
'Eu, como sempre brilhante naquilo que irei dizer e em tudo o que poderia ser dito, na hora de falar não disse coisas nenhuma'.
'Quando alguém fala 'todavia' é porque a frase é decorada'
'Esta noite... esta chuva... estas reticências... sei lá'.
Demorei para me fazer o favor de adquirir algo de sua própria autoria. Depois descobri que esse meu entrave era motivado pelo fato de que sua obra só veio a ser reeditada ano passado, com pedidos de pelamordedeus do Joaquim Ferreira dos Santos. Antes disso, só com reza forte e em sebos. Aliás e inclusive, esse meu primeiro exemplar, se perdeu no buraco negro da casa do Zé. Comprei uma versão, agora há pouco, de 'Com vocês, Antônio Maria'. Leio como minutos de sabedoria: abro ao léu e traço a crônica que aparecer. Raramente me arrependo:
'Nesse trecho do Leme*, a vida é sempre igual. Os carros batem na mesma esquina, muitas vezes os mesmos carros. Junta gente. As mesmas pessoas pessoas que saem dizendo, escandalizadas:* Nota minha: o autor se referia à esquina da Viveiros de Castro com a Prado Júnior.
- Nunca vi uma batida tão grande.
São iguais as comidas dos pequenos restaurantes de uma porta só. Iguais as mulheres de trottoir. A polícia é a mesma desde a fundação da cidade'.
Na resposta à carta de uma leitora:
'Meu filho, Eleutério veste-se mal, porque quem escolhe as roupas é o pai.'Sempre percebi um humor, um riso, mesmo que triste, até nos seus momentos mais amargos. Sorriso embutido este que combina com a sua gargalhada. Um riso não de otimismo retumbante e cego, mas de diversão. Daqueles que saíam todas as noites com Vinícius de Moraes numa Copacabana romântica, onde os pequenos inferninhos eram as filiais domiciliares.
E o nome, foi a senhora que escolheu?'
Sinto uma certa saudade daquilo que nunca vivi. Nostalgia, já ecoa em meus tímpanos. Pode ser. Apenas sei ao certo que, ao ler os seus textos, (parece) que vivo todo esse clima onírico - novamente. Coisas inexplicáveis. Como a morte aos 43 anos, como tantas outras coisas. Se valeu para alguma coisa, o dia de ontem, foi para rememorar Antônio Maria. E é sempre bom, de vez em quando, lembrar dele.