segunda-feira, 2 de agosto de 2004

Borgeanas

O velho argentino tinha um problema com o "seu tempo". Poderia ser algo até hereditário: há uma lenda (verdadeira) que seu pai, também Jorge, não informado sobre o que acontecia no mundo, levou a família para a Europa no meio da primeira guerra mundial. Por sorte, escolheram a Suiça para viver, e tiveram poucos problemas com o conflito mundial.

Também de origem familiar, é a sua doença degenerativa que o fez perder a visão. Dessa forma, as únicas imagens que obtinha eram, obviamente, as que ele lembrava. Logo, ficou de certa forma aprisionado ao passado.

Pode ser fruto de um arrependimento: Borges renega seus três primeiros livros de poesia porque (um de seus argumentos, ao menos) eram excessivamente preocupados em parecerem modernos.

"Por volta de 1905, Hermann Bahr decidiu: “O único dever, ser moderno”. Vinte e tantos anos depois, eu também me impus essa obrigação totalmente supérflua. Ser moderno é ser contemporâneo, ser atual; todos fatalmente o somos". (Prólogo da edição de 1969 de Lua Defronte original de 1925).

E em inúmeras oportunidades, afirma que não devemos ler nada que tenha menos de cinqüenta anos, repetindo um adágio de seu filósofo preferido, Schopenhauer. O seu argumento é simplista, porém certeiro: as obras mais antigas sobreviveram ao maior dos censores, o tempo. As recentes podem ser frutos apenas de uma moda, de algo passageiro e chato. Citando o pai, argumentava: "e não se deve ler livros chatos".

Fato é que ele não lia jornais e material que fosse perecível. Fica a pergunta: até quanto o escritor estava apenas sendo irônico, ou realmente não se importava com o cotidiano?

(Por outro lado sempre argumentou que o passado só existe em nossa memória, que a torna presente e que o transforma por isso)

E nós, devemos nos apoiar nesse pensamento, e ignorar o que acontece a nossa realidade?

Sei lá, não sei.


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