sábado, 12 de abril de 2008

Realismo real

Entre as várias qualidades de "À sangue frio", de Truman Capote, está a ambivalência de seus personagens. Uum sujeito é e ao mesmo tempo, ou em outra oportunidade, não é determinada coisa. Ele pode simplesmente se contrariar, agir opostamente como se previa, se dizia que ia agir, ou como teria agido havia cinco minutos. As opções são praticamente infinitas.

Por ser uma história real - ou pelo menos baseada em, segundo os seus detratores - Capote teve a liberdade de narrar uma situação - na falta de expressão melhor - real. Em que a ambigüidade é a regra. Os seres humanos somos múltiplos, ora.

A curiosidade fica, curiosamente, nas obras de ficção ditas realísticas (mas não somente desta categoria). Os autores, com medo de suas personagens serem encaradas como incongruentes, via de regra seguem uma determinada cartilha em que a contrariedade, ambigüidade e a ambivalência não são possíveis. O mais engraçado: fazem uso desse determinado índex exatamente para ser encarado como factíveis. Isso quer dizer: para serem vistos como realistas, devem escrever menos realisticamente.

Capote tinha a vantagem de descrever situações reais, portanto, não poderia inventar nada. Ou nós que acreditamos no retrato fidedigno das situações. Mas, se o resultado é uma obra-prima, que diferença faz ser a realidade ou a invenção?

Nenhum comentário: