Brincadeira de criança
Sábado passado fui a Niterói a fim de ver a exposição "Mirabolante Miró" no MAC (Museu de Arte Contemporânea). Ao contrário do que se pode imaginar, o meu conhecimento do artista catalão é o mesmo que tenho sobre física quântica. Ou seja, próximo do nada. Sabia que Juan Miró gosta das cores primárias e secundárias, linhas grossas e pretas e das abstrações. Em resumo: tudo o que qualquer leigo poderia saber se já tivesse observado qualquer de seus trabalhos. Fui, então, ao "Museu do Niemeyer" – como uma amiga minha o chama – armado apenas com meu pré-conceito e da curiosidade de conhecê-lo mais.
Na porta, dezenas de pessoas lotavam os corredores para os salões de exposição. Estávamos em um grupo de sete pessoas que poderia ser dividido em: aqueles que não entendiam nada de Miró e aquelas que achavam suas telas "alegres". Nem é preciso dizer a que grupo eu pertencia. Na primeira parede, uma coleção de gravuras originais da mesma fôrma, apenas pintadas de maneiras diferentes. Digo isso assim, rápido, mas para descobrir que todas faziam parte de uma mesma série demorou bastante e contou com a ajuda de uma voluntária da exposição. Fiquei algo em torno de 15, 20 minutos nas duas primeiras obras, tentando enxergar algum nexo entre ambas, um significado escondido, algo que não se encontraria à primeira-vista. Em vão. Amigos meus passavam por mim e diziam: "olhe ali um coração"; "está vendo aquela cabeça de menino?". E eu pensando que não se deveria perder tempo tentando achar forma onde nunca houve intenção de criar forma.
Minha paciência resistiu até a segunda parede. Olhava para aquelas telas e imaginava que meu sobrinho de sete anos poderia fazer o mesmo. Não via significado, razão, quiçá necessidade de estarmos ali, parados em frente a telas que nada tinham de extraordinárias, além de terem sido consagradas pela crítica especializada. Imaginei que eu era um completo imbecil (não acho que errei muito) por não entendê-lo e fui sentar num banco.
Foi então que, com a energia que lhe é peculiar, R. veio me dizer que eu é que estava tentando achar linearidade onde não havia. Eu é que procurava uma explicação fácil, um rosto escondido, uma cena camuflada, um sentido para toda aquela miscelânea quando na verdade eu necessitava apenas era encará-las sem idéias pré-concebidas. Olhar para uma tela de Miró não é assistir a um filme, ler um livro, olhar para uma tela de (vá lá) Picasso. O catalão propõe que a arte seja compartilhada por aquele que a vê também. É necessário entrar no jogo para poder enxergar. Entender cada uma das gravuras como poemas isolados. Ao invés de pensar que era um trabalho de criança, usar os olhos de uma criança, livre de preconceitos.
Aceitei o jogo. Admito que não foi fácil. Ao me levantar, as telas ainda pareciam reuniões aleatórias de traços grossos com tinta preta e pontos de azul, amarelo, verde e vermelho. Saímos do primeiro andar, subimos as escadas e então aconteceu algo estranho. Sem querer exagerar, uma espécie de epifania. De longe, observava os traços de Miró e eles formavam imagens para mim. Um era uma vaca, outro um marciano, outro um cangaceiro. Comecei a brincar com cada um dos quadros como se tivessem um sentido apenas para mim. Senti uma alegria crescer dentro de mim, não porque eu entendia, mas porque eu via. Era como se tivesse me conectado com a arte, tivéssemos feito contato.
O tempo, em seguida, voou. Logo o museu fecharia e tivemos que sair. Mas havia um sentimento novo dentro de mim: felicidade. Talvez as meninas é que estavam corretas. Miró é alegre
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