quarta-feira, 30 de maio de 2007

Os filmes oníricos de Gondry

O novo filme do Michel Gondry, "The Science of the sleep", repete algumas idéias da segunda incursão do francês no longa-metragem - "Eternal sunshine of the spotless mind" - como o ambiente onírico, um protagonista que dorme, imagens bem fantasiosas e personagens secundários cools. Quem não se importa muito com o diretor dos filmes vai perceber as semelhanças entre um e outro, sem dúvida. (O primeiro filme dele - "Human Nature" - parte de uma premissa bem diferente.)

As diferenças, entretanto, me chamaram mais a atenção. Se "Eternal sunshine" é uma produção cara e americana, com direito a Jim Carey no papel principal e roteiro do Kaufman, "The Science..." é francês - até conta com dinheiro do braço independente da Warner - até o último biquinho. Mesmo que se fale inglês, na maioria do tempo e espanhol (um pouquinho), Gondry quis filmar uma cidade francesa, hábitos dos franceses, os franceses.

Se ele opta por Gael García Bernal na dianteira do elenco é porque ele é o melhor rosto fora de hollywood na sua faixa etária - se o personagem fosse um pouco mais velho, aposto que o posto seria do Javier Bardem.

Mas a maior diferença fica, realmente, nos cuidados com a produção e o (mal)cuidado com o roteiro. Em "Science...", há efeitos especiais com rolos de papel higiênico (!). Tudo bem que há um contexto, mas para as massinhas, não. As mãos enormes passam, as orelhas de gato também, mas a TV educativa... hum... Não. Nem o pônei. Depois dos efeitos de "Eternal sunshine..." fica parecendo algo caseiro, quase amador.

Já o roteiro, bem, podem falar o que quiserem dele, mas Charlie Kaufman, inegavelmente, é o mais conhecido roteista de hoje em dia. E olha que ele não fez nenhum blockbuster, pelo contrário. Seus filmes têm sempre uma ligação, você os reconhece como de um mesmo sujeito, mesmo quando os diretores variam de um Spike Jonze até um George Clooney. O cara tem um cuidado com o texto, com a informação completa que falta no filme.

Curiosamente é o mesmo sentimento que se tem ao ver alguns Truffauts, por exemplo. O longa inteiro é lindo, maravilhoso, mas, ao fim, você quase fala: acabou? Talvez Gondry quisesse fazer a sua versão do homem onírico, raciocinando que a anterior era muito, digamos, norte-americana-kaufmaniana. "Science..." vale muito ser visto, mas eu gostei mais da "versão" anterior porque junta o melhor de dois mundos. A direção inventiva do francês com a meticulosidade - e o dinheiro - do americano.

sexta-feira, 18 de maio de 2007

Fim da inocência

Não é possível viver sem ter contato com informações. Claro que "resumo" aos meios urbanos, onde a quantidade de publicidade, jornais, TVs, sites, rádios, cartas, e-mails e um infinito etc. é algo extremamente banalizado. As próprias piadas são referenciais. Os apelidos lembram algo da - outrora chamada - indústria cultural. E claro que isso é uma obviedade.

Nunca foi possível escrever algo impunemente. Sempre houve algo anterior, que remetia a essa mesma idéia. Não existe, portanto, a novidade. Mas, sem ter necessariamente contato com a idéia anterior, o artista criava impunemente, inocentemente.

Hoje, não há mais inocência. Não tem como produzir algo sem passar pela prova do "já vi/li". Somos produtos de uma era em que, mais que tudo já tenha sido contado, todos já sabem que tudo foi contado. Nada é novidade para ninguém. Nos repetimos, como sempre fizemos, mas, então, ninguém pode dizer que não conhece.

Daí nasce a metalinguagem, como algo intrínseco ao nosso tempo. Descontrução do estabelecido para montar em termos completamente diferentes. Um chute: normalmente acontece em eras saturadas - lembrai do Quixote e da sua paródia de romances de cavalaria. Estamos NA era da saturação. Tudo perde a validade muito rapidamente.

Deve-se ficar preso nessa teia ou lutar por algo novo, como por uma utopia? Como enfrentar o desestímulo?

quarta-feira, 16 de maio de 2007

Interrogações

Escrever para quê? Qual é a intenção? Por que manter um local onde se coloca opiniões, que não foram pedidas, sobre assuntos os mais diversos? Quem elege os realmente aptos a opinar sobre qualquer coisa?

Em outro aspecto: por que escrever? Para usar o espaço como um divã virtual? Para exercer a capacidade de expressão? Porque é legal? Porque se ambiciona algo melhor? Porque inveja outros que conseguem? Porque precisa dialogar com as próprias palavras, escritas, e perceber, friamente, o que elas realmente querem dizer? Porque almeja um resultado estético, algo intocável, volúvel, relativo como a "arte"?

E quando não há vontade alguma: deve-se insistir até conseguir umas linhas rascunhadas? Deve-se esperar um pouco, ter paciência, até que a vontade volte? E se não voltar? E se nunca existiu? E se existiu e agora, sem escrever há muito, se acomodar e desistir dos sonhos para viver algo mais cotidiano? (Aliás, viver algo mais cotidiano é uma vergonha para alguém?)

Será que se deve, ainda, alimentar um sonho juvenil, uma crença, algo inanimado, irracional, baseado em nada concreto, mesmo quando a realidade diária mostra que não é exatamente como pensado? Opta-se por uma adaptação, insistência ou desistência?

Ah, as interrogações do meu presente.

terça-feira, 15 de maio de 2007

Monocórdico

Ultimamente não consigo conversar muito tempo com meus amigos que não acompanham, como eu. Eles falam, falam, falam, e eu não tenho pouco interesse. Para mim, todos os assuntos são desimportantes, com a exceção de um: "Lost". E, claro que quem não estiver no último episódio da série, que passa toda a quarta-feira nos EUA, fica ultrapassado. Culpa das constantes mutações que acontecem de semana para semana na série que nem é a mais vista hoje nos EUA - quem entende os norte-americanos?

Por esses dias, em tudo o que eu leio, procuro uma ligaçã0, ou uma forma de explicar os mistérios da ilha. Se baixo filmes, deixo a quarta-feira livre para começar o download do novo capítulo. Se chega sexta à noite e pinta um convite para sair e beber com uns camaradas, penso que nada vai ser melhor que chegar em casa e assistir a mais 40 minutos das histórias de Jack, Sawyer, Locke, Sayid e os Outros.

Imagino que esse frenesi não seja novo para outras pessoas. Mas, para mim, que nunca tive TV a cabo, jamais acompanhei uma novela (salvo "Que rei sou eu?" e "Vale Tudo"), que acha os produtos americanos enlatados insípidos, é uma surpresa. Lembro vagamente que à época de "Twins Peaks" havia uma exaltação parecida. Gente viciada na série que passava por verdadeiras síndromes de abstinência durante a semana e quebrava a cabeça tentando descobrir o que aconteceu, por qe aconteceu e o que diabo era aquele anãozinho que dançava no cabaré. Coisas de Mr. David Lynch. Como eu não me lembro direito desse período - não estou tão velho assim, vai... - para mim, é tudo novidade.

Curioso que eu tentei experimentar outras drogas americanas. Assisti à primeira temporada inteira de "24 horas" e a uns poucos episódios da segunda; vi todos os episódios do primeiro ano de "Seinfield"; conferi cinco capítulos iniciais da nova febre, "Heroes" e nada. Nada bateu, nenhum funcionou. A única série que dá um pouco de onda foge dos padrões americanófilos - apesar de ser falado em inglês, da Inglaterra: "Roma". Principalmente pelo apanhado histórico, pela uma moral toda própria e pelos personagens mais sacanas / espertos / políticos que já vi na TV.

Com esse meu vício, atitudes em outros tempos impensáveis estão se tornando normais. Comprei uma TV nova, não vou ao cinema há muito tempo, e um dos meus sites preferidos na atualidade é o blog do Carlão, meu camarada.