quarta-feira, 14 de agosto de 2002

Qual será o futuro do cinema?

Dando prosseguimento ao raciocínio, podemos suspeitar o óbvio: grande parte das futuras produções será feita em vídeo digital de alta definição. Sim, e daí? E a forma de narrar? Mudará alguma coisa? Podemos supor algo...

No início era a gravura. Depois vieram as pinturas, fotografias, cinema, televisão, internet e (salvo os meus óbvios esquecimentos óbvios) essa foi a evolução (apresentada de maneira tosca e rasteira) da forma de representar a realidade através de imagens. O (famoso) simulacro do real.

O que eu quis e quero dizer com isso? Que o cinema – da maneira mais tradicionalista que essa palavra pode ser interpretada, ou seja, como queima de película – foi a primeira representação de imagens em movimento que já houve na história. Porém, a partir do cinema, as representações de imagens sempre evoluíram em movimento.

(Rápido parêntese: é certo que as outras técnicas de reprodução de imagens ainda co-existem e evoluíram todas as suas maneiras. Vide caso claro da fotografia, por exemplo. O que defendo como parâmetro é a evolução apenas cronológica da tecnologia de retratar as imagens. Apenas isso).

Ou seja, o cinema teve por um longo tempo a companhia de outras tecnologias para retratar as imagens em movimento. E, como aconteceu com a pintura, por exemplo, com o advento e popularização da fotografia, o cinema foi influenciado e influenciou as outras tecnologias.

E aqui está a tese que defendo: o cinema está sendo muito influenciado pelo o que eu chamo de estética MTV. O que seria isso? Uma combinação no formato de narrativa com um único intuito, o aumento na velocidade. Alguns diretores utilizaram as técnicas aprendidas na produção de videoclipes, ou em séries de TV, ou em novelas, ou em publicidade ou em qualquer outro tipo de mídia que é necessário passar uma informação em pouquíssimo tempo, senão você perde o espectador.

Exemplo: as câmeras trêmulas. Antes um recurso escasso, que representa agilidade e/ou nervosismo, agora é quase unanimidade nas produções. Outro exemplo: várias histórias sendo contadas ao mesmo tempo. Talvez essa maneira tenha sido inaugurada pelo R. Altman e depois (bem) utilizada pelo Q. Tarantino em “Pulp Fiction”. Agora, ficou quase banalizada também. Outro: a iluminação de filmes cada vez mais naturalista. É muito difícil encontrarmos, nos filmes atuais, iluminações que dialoguem com o filme. Cada vez mais o fotógrafo passa completamente despercebido. E, com certeza, o principal elemento que configura essa estética MTV: o corte rápido e frenético. Exemplos não faltam, basta que lembre de algum filme que foi reverenciado ultimamente (do próprio “Pulp Fiction” até o recente “Réquiem para um sonho”, do D. Aronofsky) que encontraremos esse frenesi nos cortes.

Essa forma de narrar, antes que eu receba dúzias de pedradas, não é boa nem ruim em essência, na minha humilde opinião. Não podemos juntar gatos tão diferentes no mesmo saco. Não será uma escola de cinema que fará um filme bom ou ruim. Aliás, não há nada que explique, ou antecipe, se o dito cujo ficará bom ou ruim. Não há manual de como filmar, ou um receita que explique que ao fazer uma sucessão de cortes em seqüência, colocar quinze histórias diferentes no mesmo longa, e tudo filmado na mão com luz a ponto de estourar, a produção ficará boa. Isso parece uma obviedade, mas não considero. Por mais que o cara que está por trás da câmera, que tem o poder de dizer e desdizer, tenha estudado bastante o assunto, seja o maior cinéfilo do mundo, conheça todos os meandros da (dita) arte, apenas a prática – ou a sorte – farão dele um cineasta, com todas as letras. Como tudo na vida, aliás.

Mas voltemos. Com essa idéia de Cinema-videoclipe na cabeça, nasceu, e nascerá, toda uma nova onda (?) de produções relâmpagos. Não me interessa destrinchar os motivos que levaram, ou levarão, os cineastas a optarem por narrativas cada vez mais velozes, cada vez mais parecidas com clipes gigantes. Apenas devo cruzar os dedos para que os filmes não sejam descartados como a maioria dos (próprios) clipes ou peças publicitárias ou (até) videogames (que muitas vezes são as “obras” inspiradoras).

Para encontrarmos filmes com grandes planos seqüências, por exemplo, ou deveremos percorrer os sebos, ou visitarmos os antigos diretores – ou diretores à antiga que sempre existirão – que opta(ra)m pelo tal recurso. Os (pós-) modernos, ou contemporâneos para melhor exemplificar, considerarão a forma de narrar antiga, obsoleta, ou “out”, para usar uma linguagem que me faça ser entendido.

Como tudo dentro de uma sociedade orgânica e mutante, como a nossa, o cinema nunca conseguiria (nem nunca conseguiu) ficar imune a todas as influências que o circundam. Haverá – como já há – filmes bons e ótimos dessa nova tendência. E outros nem tanto. O grande problema, e é uma preocupação de alto grau de egoísmo, é que, mais no futuro, o editor – pelo poder que ele recebe com esse novo formato de decidir sobre a vida e a morte de um filme – fique mais importante que o diretor dos filmes. Nessa hora, acho que estaremos em apuros...

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