Sabe o "Antes do amanhecer" e o "Depois do pôr-do-sol"? Tire 60% dos diálogos. Acrescente números musicais, mas nada gratuito, sempre dentro de um contexto e nunca com danças no meio da rua. As canções têm corpo do irlandês Damien Rice, membros de Coldplay, mas sem frescuras, e cabeça do Radiohead da primeira fase, a roqueira seminal, com cabelos ruivos e segunda voz feminina. Pronto, está tecnicamente pronta a fórmula de "Once", longa-metragem escrito e dirigido por John Carney, que agrada até os mais descrentes da fórmula dos musicais.
Claro que "Once" não é aparentado com "Chicago" ou "Moulin Rouge", para citar dois a mão. Ele é primo distante, pelo lado das canções pops mostradas em formato videoclipe, de "Nine songs"; sobrinho neto de "Hedwig", pela parte da independência (ganhou o World Cinema Audience Award em Sundance); e irmão mais novo de "The Commitments": é irlandês, retrata Dublin, também criou uma banda após o fim do filme que excursionou - me diz Carla Meneghini, a responsável por me viciar no filme e conseqüentemente na trilha sonora.
(Mas a maior coincidência é o protagonista, Glen Hansard, que trabalhou no filme do Alan Parker. Era o guitarrista. Ou John Carney, que é amigo de Damien Rice e já foi baixista da The Frames, banda de Hansard, que já excursionou com Rice, como apoio. Se alguém disser que a Irlanda tem sete pessoas - porque o U2 é irlandês - eu acredito. Aliás2, Hansard e Markéta Irglová, a protagonista, que, segundo o wikipédia tem uma diferença de quase 20 anos, estão juntos, dizem as boas línguas.)
Voltando ao assunto principal deste texto: "Once" e sua trilha sonora. O filme seria divertido, leve e até mesmo surpreendente se fosse mudo. Mas com as músicas se torna tentador. É aconselhável ver o filme e "comprar", logo em seguida, as músicas. De preferência, "tenha em casa" o longa também. Porque ver apenas uma vez é praticamente impossível.