sexta-feira, 25 de junho de 2010

Primeira fase da Copa 2010: Zebras? Nem tanto

Com a eliminação da sempre temida (para os brasileiros) França e da tetracampeã Itália, com a derrota da outrora assombrosa Espanha para Suíça, e a decepção da empolgante Alemanha após um início arrebatador além da Inglaterra sendo apenas a Inglaterra de sempre, pode parecer para o incauto que essa Copa está cheia de zebras. Por mais que seja tentador, eu tenho que discordar um pouco.

Mesmo sendo um torcedor quatrienal, já que o meu Fluminense não empolga tanto assim no ínterim, me considero um conhecedor modesto da tradição do velho-esporte-bretão na sua vertente Copa do Mundo. Sei todos os vencedores até hoje, onde foram disputados os mundiais, a partir de 1950 (antes era a pré-história), lembro de jogos memoráveis, e outros nem tanto, esqueço propositalmente de decepções e, principalmente, experimento a sensação de torcer descontroladamente por um time de futebol, mesmo que não seja o Brasil. Após apresentar as minhas credenciais, posso dizer que acredito ser possível enxergar algumas situações constantes, que se repetem sempre nos campeonatos mundiais, principalmente nos mais recentes.

Não é coincidência, portanto, que os europeus estejam indo mal, a grosso modo. Via de regra, os grandes - aqueles que já chegaram em finais - tremem quando precisam atravessar o Atlântico, o Mediterrâneo, ou simplesmente ir para o fim do mundo (para eles). Um dos argumentos mais fortes quanto a isso é: o Brasil foi o único país que venceu fora do seu continente (em 1958 e 2002). Mas se você ainda não se deu por satisfeito, basta lembrar da Copa da Coreia-Japão do fiasco dos Bleus e da Azurra para ter exemplos à mão.

Se ainda não se convenceu, recordai de 1994. Os semifinalistas foram: Bulgária, de Hristo Stoichkov, companheiro à época de Romário no Barcelona, a Suécia (ok, já chegou a uma final, em 1958, mas não é exatamente um grande, concorda?), a Itália (sempre há uma exceção) e o Brasil. O fim é lembrado por todos, naquele abraço mais-que-fraternal entre Pelé e Galvão ao som das clássicas palavras: "é tetra, é tetra, é tetra".

Em 2002, não foi diferente: o quarto lugar foi para Coreia do Sul (!), o terceiro para a Turquia (alguém se lembra deles?), o vice ficou para Alemanha, naquele frango do Kahn, e o Brasil, o campeão.

Reparem que não é uma superstição - apesar de parecer uma. Superstição seria: todas as vezes que o Brasil joga a semifinal com um time que havia enfrentado na primeira fase (Suécia e Turquia, por exemplo), ganha a Copa. No caso, mesmo pegando poucos exemplos, é a demonstração de como as grandes seleções europeias simplesmente não jogam fora de casa.

OK, voltemos um pouco mais, à 1986: Bélgica, França, Alemanha e Argentina foram os primeiros colocados. Mas a França, apesar do Platini, não poderia, à essa época, ser considerada uma grande seleção. Nunca tinha conseguido nenhum resultado expressivo (jamais chegara à final na História das Copas), por exemplo. Nem falemos, portanto, na Bélgica. E está bom de exemplos.

Outro fator bastante comum, e que foi visto como uma novidade nessa copa, são os resultados completamente adversos. Se for na primeira rodada, então, quando os times ainda estão nervosos com a estreia, é pule de dez. Nunca vou esquecer o nome do camaronês autor do gol contra a Argentina na partida inicial da Copa de 1990: François Omam Biyik (digitei sem conferir a grafia e, quando a fiz, só tinha errado o jeito de escrever o seu "Omam"). Biyik pode ter ficado esquecido numa copa em que Roger Milla deslanchou, mas o meu canário amarelo foi batizado naquele dia com seu nome.

(Como era difícil pronunciar o seu sobrenome, Biyik, - três fonemas iguais em sequência - e nem havia necessidade de "chamar" o pássaro, eu parcamente usava sua alcunha. Mas o bicho pode dizer que não morreu, anos depois, incógnito.)

A vitória da Alemanha em 1994 por magros 1x0 para a Bolívia, fora da altitude de La Paz que tinha feito o Brasil de vítima nas eliminatórias, foi quase uma derrota. E o que falar da França (novamente) que perdeu vergonhosamente para o Senegal em 2002?

Isso para mostrar que também é comum que a atual campeã jogue mal o campeonato seguinte. Com a exceção da Itália (ainda na pré-História, em 1934 e 1938) e do Brasil (em 1958 e 1962), nunca houve um bicampeonato. Argentina (em 1986 e 1990) e Brasil (1994 e 1998) foram campeões e chegaram às finais no campeonato seguinte. E Alemanha (1986 e 1990) e Brasil, novamente (1998 e 2002) foram vice e, quatro anos depois, campeães. Há ainda o caso da Holanda, que em 1974 e 1978 foi duas vezes - e injustamente - vice.

(Mas quem disse que o futebol é justo? Se começarmos a lembrar dos casos conhecidos, temos que falar do Brasil de 1950, da Hungria de 1954 e novamente do Brasil de 1982, para ficar nos mais conhecidos.)

Ir mal na primeira fase também não quer dizer nada. Argentina começou horrivelmente a Copa de 1990, se classificando em terceiro no seu grupo (na época, por serem "apenas" 24 seleções, os melhores terceiros passavam à frente) e enfrentando o Brasil nas oitavas. Todo mundo se lembra do resultado e do nome de Claudio Canniggia. (Tive pesadelo por dias...)

E claro, do clássico caso italiano, de 1982, e o também inesquecível (para nós) Paolo Rossi. (Outra superstição daria conta de que o time que começa mal e vence o Brasil acaba ganhando a Copa. Mas isso talvez não seja superstição, também, apenas a demonstração da importância do país quando o assunto é bola no pé. Mas, de qualquer forma, é melhor não ter pego, agora, a Espanha. Just in case.) A Itália, aliás, é conhecida por engrenar - se é que engrena aos poucos.

Por último: em copas sempre há uma zebra. Sempre. Um time que ninguém dava nada e que vai longe, ou que empolga, sem ninguém lembrar deles quatro anos depois. Já citei aí em cima a Coreia do Sul em 2002. E também Camarões em 1990. E a Bulgária, de 1994. Em 1998, foi a vez da Nigéria (lembro até hoje da comemoração do fulano, agarrado às redes do gol, com uma felicidade "amadora". Foi bonito. Mas foi mesmo em 1998?). E em 2006, bem, 2006 foi a copa mais sem graça desde... 1990. A zebra, talvez, tenha sido a França, mas quem tem Zidane, nunca deixa de ser favorito.

Isso quer dizer que, mesmo com os resultados aparentemente estranhos, são todos, no fundo, previsíveis.

terça-feira, 22 de junho de 2010

O início, não planejado, de Vik Muniz

"Eu estava em um evento social em São Paulo e, ao sair do evento, uma garota entrou na frente do meu carro e pediu desesperadamente para que eu apartasse uma briga em que um cara, munido de um soco inglês, agredia violentamente o seu namorado. Saí do carro, apartei a briga, o agressor saiu correndo, e o agredido, desconcertado e ferido, sacou uma arma do interior de seu carro, e descarregou-a em mim por engano. Um tiro somente atingiu minha perna, graças à falta de mira do atirador. Quando acordei no hospital, a primeira coisa que vi foi a cara enfaixada do meu agressor, que decentemente me pediu desculpas e se propôs a pagar as despesas hospitalares, além de me indenizar pelo acidente.  Foi com parte desse dinheiro que eu consegui comprar uma passagem para os Estados Unidos."

Vik Muniz, explicando como fez a viagem que mudou a sua vida.
A entrevista com Luciano Trigo, aliás, está bem boa.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Morte do Saramago - a falta da unanimidade

Saramago era a piada temida por jornalistas que lidam com literatura, assim como o Michael Jackson, para a música, e Roberto Carlos, Pelé, e Niemeyer para todo mundo em redações.

Por isso, imaginava que ele teria entrado na categoria das unanimidades - mesmo quem não o conhece, nutria uma certa admiração. Não é o caso. Vi muita gente falando mal. E gente que se absteve de aparecer e comentar a morte do velhinho, argumentando que nunca tinha lido nada dele. Dignidade é isso aí.

Das pessoas que comentaram, o escritor Sérgio Rodrigues levantou uma questão interessante: há um flaxflu na literatura portuguesa, que deixa o Saramago em segundo plano, porque ele seria "fácil", em comparação ao Lobo Antunes - esse sim, o grande escritor português. "Coincidentemente", o mais underground - como se só a marginália daria legado à literatura. Em seguida, inclusive, Rodrigues, com clareza e inteligência, acaba com esse engano: "só os pedantes igualam acessibilidade a inferioridade estética".

Outros, como o João Paulo Cuenca, lembraram como Saramago, apesar de ser encarado por muitos como um vanguardista - simplesmente por abolir símbolos de pontuação, o que é uma simplificação do termo - era um sujeito tradicional. E seu encantamento pela esquerda mais conservadora é um exemplo claro, mas parcial sobre isso.

Sua prosa era oral. Sempre o li pensando que ele contava uma história para mim. Colocava sua voz - a voz dele mesmo, do velhinho, com sotaque português e tom firme - em cada uma das longas frases de seus livros. Assim o que no início era difícil ou estranho, foi se transformando em algo natural, como uma conversa, ou uma aula.

Dos que livros que li (não foram tantos assim), gostei do óbvio: "Ensaio sobre a cegueira". É uma obra que, sozinha, merecia ganhar a eternidade.

"A caverna" me trouxe o mito platônico numa época em que mal sabia o que era filosofia - e serviu apenas para isso. "Evangelho..." tem uma proposta simples, até intuitiva, mas é bastante rancoroso, mostrando alguém que quer incomodar necessariamente o outro lado,no caso a Igreja. "Memorial..." tem a personagem Blimunda, que me marcou para a vida, e uma narrativa que muda de posição no meio do caminho.

Não li livros que, dizem, ser os melhores dele: "O ano da morte de Ricardo Reis", "Jangada de pedra", "Cerco de Lisboa". Talvez um dia o faça. Ele merece.

Certamente, o melhor texto de homenagem ao homem José Saramago ficou por conta de seu editor e amigo Luiz Schwarcz.

Escreve ele:
"Agora só quero me despedir mais uma vez de José. Com as melhores lembranças, o amor, e minha saudade. Maldita palavra, tão portuguesa, que agora ficará associada ao meu amigo. Mas saudade não tem remédio, não é, José?"

O restante do texto, aqui.

domingo, 13 de junho de 2010

Cala a boca, Galvão

porque me ufano ainda da internet.

o tópico mais citado no twitter no mundo é "cala a boca galvão". até aí, nada demais.

há um site (http://whatthetrend.com/) que explica para quem quer saber a razão dos tópicos. a explicação, porém, é ótima:

GALVAO, a brazilian rare type of bird is dying due to climate changes and human exploration, help save it by tweeting CALA BOCA GALVAO to donate 10 cents to Galvao Institution and save the Earth. Don't let it become extinct.

mas, não satisfeitos, fizeram um vídeo sobre a campanha:
http://ow.ly/1XRYa

não satisfeitos, criaram uma música, dando o crédito para a lady gaga:
http://www.youtube.com/watch?v=t96hPNK3_3Q&feature=related

não satisfeitos, criaram um game:
http://www.guijogos.com/jogar/jogos_de_Humor/752/Cala_a_boca_Galvao/

enfim. é infinito. e olha que eu gosto do galvão.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Grande Prêmio do Cinema Brasileiro

Uma premiação feita aos moldes do Oscar, por membros de uma "academia" premiando os filmes do ano. O resultado, portanto, foi surpreendente.




(o vídeo acima é parte do programa para acabar com a minha vergonha congênita)

domingo, 6 de junho de 2010

A obsolência do jornal(ismo)

“Eu leio de vez em quando mas não faço questão, porque jornal é uma coisa inquietante. O jornal não é o jornal do dia, é o jornal da véspera. Há anos não leio um jornal que não seja rigorosamente o jornal da véspera. Só sai o jornal da véspera e nunca o jornal do próprio dia. São fatos da véspera , figuras da véspera. O fato do dia não existe e ou só existe para rádio e as TVs. No passado, a notícia e o fato eram simultâneos. O atropelado acabava de estrebuchar na página do jornal. E assim o marido que matava a mulher e a mulher que matava o marido. Tudo tinha a tensão, a magia, o dramatismo da própria vida. Mas, como hoje só há jornal da véspera, cria-se uma distância entre nós e a notícia, entre nós e o fato, entre nós e a calamidade pública ou privada. Servem-nos a informação envelhecida. Nós, jornalistas, é que estamos mais obsoletos, mais fora de moda do que charleston, do que o tango”.

Nelson Rodrigues. Daqui.

sábado, 5 de junho de 2010

Estúdio Vera Cruz está de volta: lendas e causos

Que a Vera Cruz foi importante, ninguém duvida. Mas ela estava sumida. Agora vai voltar.

O mais legal foi o final:

“Quando Lima Barreto viajou ao Nordeste, ele manteve contato com [o historiador, folclorista e antropólogo] Luis da Câmara Cascudo, que colaborou com o filme”, explica Galileu que também trabalhou em “O cangaceiro” como assistente de direção. “Perguntamos a ele sobre música e ele falou: ‘tem que pôr ‘Mulher rendeira'."
O diretor explica que o músico Zé do Norte veio participar do filme e acabou registrando “Mulher rendeira” como dele. Segundo Galileu, Zé do Norte correu o mundo e ganhou dinheiro com uma composição que, apesar do senso comum dizer que não tem autoria, tem um autor até muito famoso: Virgulino Ferreira da Silva, também conhecido como Lampião.
“A música é da avó de Lampião, Dona Jacosa, e a letra é do Lampião, que na verdade é seu sobrinho-neto. Antes de entrar no cangaço, ele fazia poesia e lia”, conta.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

O mundo como fantasia

Um dos primeiros livros de filosofia - que se propunha ser de filosofia - que li foi "O mundo como vontade e representação", do Schopenhauer. Hoje em dia, após Nietzsche, e sua destruição da metafísica platônica, e Heidegger e sua busca pelo ser das coisas, esse pensamento calcado no ser transcendental de Kant fica um pouco datada.

Não que o mundo não seja uma representação, mas porque pensar o mundo dessa maneira é meio século xix, quando o livro foi escrito. Isso quer dizer que eu não deveria ficar surpreso quando escutasse uma frase do tipo: "o mundo é a sua fantasia". Mas quem garante como vamos nos surpreender?

"Fantasia" é um bom substituto para "representação". Mas, como não existe sinônimo perfeito, ele vai além. Envolve a questão da ficcionalização do mundo, que me interessa teoricamente, e envolve, o que me deixou boquiaberto, a criação fantasiosa de uma realidade, do próprio mundo. Mesmo que "representação" também tenha um entendimento de representar algo, que remete facilmente ao teatro e portanto, também, à ficção, a fantasia lembra a indumentária infantil, a imaginação sexual, um mundo onírico demais para ser real. É como se a fantasia fosse mais irreal que a representação.

Esse raciocínio leva o conceito de Schopenhauer a um passo adiante, que por mais que seja datado ainda é muito verdadeiro para o sujeito contemporâneo, que realmente cria / ficcionaliza / produz mundos, com o ciberespaço. A fantasia é a nova metafísica. (mas aí já entramos novamente em Nietzsche e esse é um outro papo.)

quinta-feira, 3 de junho de 2010

'O poderoso chefão' à francesa

Taí um filme que me surpreendeu e me deixou tenso do início ao fim - com direito a dor no corpo pós-cinema. "O profeta". Uma espécie de "O poderoso chefão" à francesa. Tem duas ou três cenas antológicas.