(artigo
publicado na revista Estopim.)
A minha primeira reação ao chegar em Londres não foi se impressionar com o Big Ben – e com tudo o que ele representa –, nem mesmo aproveitar a quantidade enorme de eventos culturais da cidade. Foi ficar incrivelmente surpreso com o mapa do metrô daqui, o Underground.
Ele não é o mais extenso do mundo [posto do de Xangai, ficando em segundo lugar], também não é o que tem mais estações [Nova York], quiçá o mais cheio da Europa [Moscou, depois Paris]. Provavelmente, porém, é o mais organizado, com linhas que são facilmente entedidas pelo recém chegado, que vão do norte ao sul, e do leste para oeste, além da Circle line, que como o nome indica, é circular e, portanto, conecta todas. E, sem qualquer dúvida, o mais antigo.
Criado em 1863, o tube vem desde então surpreendendo moradores e visitantes da cidade de Londres. Uma
imagem do traçado da linha datada de 1908 deixa qualquer brasileiro ligeiramente revoltado, ou com bastante inveja. Hoje em dia, o mapa do metrô é uma obra de design reconhecida, que virou sozinho um ícone pop, reproduzido em camisetas e canecas.
Escrevi em setembro do ano passado, assim que cheguei: “toda a geografia que eu aprendi de Londres tem a ver com o formato do metrô.” Não mudou muito até hoje.
Isso porque os trens não privilegiam uma área em detrimento da outra. Eles atendem ao traçado já estabelecido há anos, que foi elaborado levando em conta o crescimento urbano. Li em algum lugar que a Jubilee, a linha que mais uso, apesar dos seus 36,2 quilômetros de traçado [o metrô inteiro do Rio tem 40,9 quilômetros, o de São Paulo, 74,3 quilômetros], ainda não está completa. Há planos de expandir. Ao total, são cerca de 405 quilômetros dividos em diversas linhas.
O Underground não é o único meio de transporte público de Londres, entretanto. Há outros sistemas integrados, como o Overground, que como o nome sugere, que tem trens correndo sobre a terra, e o DLR, que liga uma área no sudeste, perto de onde vai ocorrer a maioria das competições dos Jogos Olímpicos de 2012, e os trens comuns, que são muito usados por moradores das cidades vizinhas [lembre-se que em uma hora de trem, se está em Oxford ou Cambridge, por exemplo]. Além dos trilhos, há o famoso ônibus vermelho de, na maioria dos casos, dois andares – um mesmo veículo leva quase o dobro de passageiros de um comum; barcos que circulam pelo Tâmisa, e, mais recentemente, as bicicletas para aluguel, cujo esquema o Rio copiou, inclusive no fato de ter um banco patrocinando a sistema.
O conjunto desses fatores, aliado a uma consciência urbana mais madura, que por sua vez tem a ajuda de uma taxa de congestionamento, que cobra um pedágio de motoristas que entram com seus carros nos centro de Londres, mostra um fenômeno recente curioso: houve uma
queda de 50% no número de viagens feitas em automóveis particulares e consequentemente aumento na mesma taxa no uso do transporte público, entre 1993 e 2008.
Isso comprova o que se pode ver na prática. Os meios de transporte aqui são realmente públicos: não há uma divisão, aparente, de classes. Todos o usam. Ninguém se acha menor, menos importante ou mais pobre porque usou o Tube e não pegou um táxi. Ouvi recentemente que Sebastian Coe, presidente do Locog, o comitê local que organiza as Olimpíadas, vai de metrô para os eventos testes que antecipam as competições oficiais dos jogos. Espero, com toda a sinceridade, que o mesmo aconteça no Brasil em 2016.
Claro que há críticas contra o Underground. Uma amiga, inclusive, costuma dizer que eu ainda não passei tempo suficiente para reclamar dele, mas ela, que mora aqui há anos, já tem a licença para isso. O principal problema tem a ver com o preço das tarifas, principalmente após quatro anos de governo do conservador Boris Johnson, recém reeleito, que pensa que a TFL, a empresa pública da prefeitura que controla os transportes de Londres, deve ser autossustentável. O tema é polêmico. O candidato trabalhista das últimas eleições e ex-prefeito de Londres, Ken Livingstone, que tinha o apoio do fortíssimo sindicato dos trabalhadores do tube, achava que as passagens deveriam ser subsidiadas. O resultado da política de Johnson é a tarifa mais cara da Europa.
De qualquer forma, há tarifas semanais, mensais e até anuais para que o trabalhador possa programar os seus custos, e assim ganhar descontos. Quem mora próximo do Centro, e precisa pegar o Tube entre as zonas 1 e 2, paga se optar pela anualidade £ 1.168. Divididos pelos 365 dias do ano, dá uma média diária de £ 3,20, para fazer quantas viagens precisar por dia nesses trechos. É caro, principalmente se convertermos para o Real. Comparativamente, porém, se pegarmos o valor da passagem de ônibus numa cidade como o Rio, que é de R$ 2,75, e ignorarmos a taxa de conversão e o poder de compra, percebemos que quem é que está realmente pagando caro.
Ps.
Salário mínimo inglês para maiores de 21 anos é £ 6,08 por hora, ou, mais ou menos, £ 1.070,08 por mês, para quem trabalha oito horas, cinco vezes na semana.