É preciso de um deus
para nos salvar, como afirmou Heidegger na famosa entrevista, para Der Spiegel porque o mundo sem deus – e
tudo o que ele representa – não dão conta do Ser. Deus, nesse caso, é a
representação gráfica e icônica da ideia da parte sinuosa do pensamento, que
não pode ser apreendido, descrito ou reproduzido. O ser humano seria fundado
não apenas dessa parte sinuosa, mas do conjunto do pensamento, e, como já
explicado, ainda teria um lado, claramente, reto.
Com a ausência de um
dos lados, ou seja, com a ausência de deus, nós acabaríamos transformando o ser
humano em um objeto de si mesmo. Ele só existe desde que produza algo para esse
conjunto da sociedade. Caso aja contrário a esse fluxo, a sociedade irá retirar
os parâmetros, a segurança que lhe fornecia.
O homem deve se
comportar apenas como uma peça numa engrenagem cujo maquinista é novamente um
Deus, mas do antigo modo, que escravizava e exige uma obediência, que afoga a
vontade e destrói a potência dos homens. O Deus antigo é o castrador da vida.
Esse processo, como
visto, não aconteceu repentinamente, mas foi se agravando com o passar dos
tempos e culminou na virada do século XIX para o XX, sendo o último século o
grande apogeu desse caminho, provavelmente.
O novo deus, ou o deus
em um novo formato, é libertador: ele é exatamente o combustível para a
potência que capacita a vontade dos homens. É ele que apresenta os objetivos,
que mostra quais são as possibilidades para onde o homem pode caminhar e, a
partir de então, tendo essa informação, o homem poderá decidir, após passar
essa informação pelo processo do pensamento, se toma esse caminho ou não. O
novo deus é a faísca, que nos levanta, que nos tira do declínio, que nos dá a
razão de ser.
O novo deus é único
para cada homem, mas não necessariamente individual. Em uma sociedade que se
diz plural, é ele também que pode dar parâmetros para organizar a cacofonia de
vozes das diferentes vontades de cada homem. É como um maestro que vai saber
equalizá-las para que todas sejam escutadas conforme suas necessidades, sem que
uma vontade afogue as outras, ou não afogue sem que as vontades sejam ouvidas.
Não é um deus limitador, mas um deus que mostra que a potência não pode
simplesmente fazer qualquer coisa sempre e toda hora. É o deus que vai mostrar
esse limite. Não, e de maneira alguma, designar este limite.
E, em especial, o novo
deus não é impositivo. Como já dito, ele nasce dentro da vontade de potência.
Cada indivíduo é o responsável pelo seu próprio deus e poderá moldá-lo,
descartá-lo, adaptá-lo, respeitando principalmente a potência [novamente no
sentido de possibilidade] da sua vontade. Portanto, o novo deus é um deus
interno, um deus que não repete dogmas ou slogans. Um deus, sobretudo, que vive
numa relação de alimentação cíclica, ou dupla e mútua vigilância, com a vontade
de potência. Ao mesmo tempo que, ou exatamente porque, nasce a partir, ou
dentro, da vontade de potência, será ele, esse novo deus, que vai saber os
limites desse poder. Porque a vontade é infinita, mas o poder, não.
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