domingo, 28 de dezembro de 2014

Paul Celan sobre Heidegger

TOTDNAUBERG
Arnica, eufrásia, o
gole da fonte com o
dado de estrelas acima,
na
cabana
aquela, no livro
– de quem os nomes tomou
antes do meu? –,
aquela, no livro,
escrita linha de
uma esperança, hoje
de um Pensante ente
a palavra
no coração.
capim de floresta, não aplainado
satirião e satirião, solitário,
cru, mais tarde, na estrada,
claro,
o que nos conduziu, o homem,
o que ia na escuta,
as meio per-
corridas trilhas
de madeira, nas veredas,
úmido,
muito.

TODTNAUBERG
Arnika, Augentrost, der
Trunk aus dem Brunnen mit dem
Sternwürfel drauf,
in der
Hütte,
die in das Buch
—wessen Namen nahms auf
vor dem meinen?-,
die in dies Buch
geschriebenen Zeile von einer Hoffnung, heute
auf eines Denkenden
kommendes
Wort
im Herzen,
Waldwasen, uneingeebnet,
Orchis und Orchis, einzeln,
Krudes, später, im Fahren,
deutlich,
der uns fährt, der Mensch
der’s mit anhört,
die halbbeschrittenen
Knüppel-
pfadeim Hochmoor,
Feuchtes,
viel.

Tradução e comentários [abaixo] do professor Adalberto Müller. Outros poemas de Celan aqui.

[...] “Todtnauberg”, que Celan publicou depois do encontro com Heidegger, em sua cabana rústica, na Floresta Negra. “Todtnauberg” é o nome do local, mas seu nome evoca as palavras “Tod” (morte) e “Berg” (monte). “Eufrásia”, planta medicinal usada em infecções nos olhos, em alemão se diz “Augentrost”, que literalmente significa “consolo para os olhos”. Parte do poema é o que Celan deixou escrito no livro de visitas da cabana do filósofo. O estirião é um gênero de orquídeas (orchis mascula). Vários comentadores do poema acreditam que Celan esperava que Heidegger falasse do seu erro ao acreditar em Hitler em 1933, mas, ao que tudo indica, a conversa não teria ido nessa direção. Alguns comentadores inclusive dizem que Celan – admirador profundo da filosofia Heideggeriana – teria se suicidado no Rio Sena devido a esse encontro malogrado. Vale lembrar que Celan perdera os pais brutalmente, por serem judeus, durante a invasão dos nazistas à Romênia. Hadrian France-Lanord, no excelente Paul Celan et Martin Heidegger, desmente essas especulações e superinterpretações. Enfim, o que restará é o poema, com toda a “pressão de luz”que tenta retirá-lo de seu esconderijo – lá onde ele luta, no escuro, resistindo, em tempos de penúria e destruição.

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