quinta-feira, 30 de junho de 2005

Jogadores para exportação

"A presença brasileira na Copa das Confederações não se limitou à Seleção. O país do futebol também foi representado em campo por Kuranyi, da Alemanha, Zinha, do México, Clayton e Santos, da Tunísia, e Alex, do Japão. Fora de campo, a comissão técnica japonesa, comandada por Zico, é quase toda brasileira. Em compensação, nosso Lúcio é mais alemão do que muitos alemães – como Beckenbauer, por exemplo, que, sabemos todos, era brasileiro dentro do campo. Brasileiríssimo." - Roberto Benevides, no Nomínimo.

Fico pensando se não devíamos encarar os jogadores como matéria-prima ou produtos industrializados, dependendo do grau de manufatura, e cobrar algum tipo de imposto para exportação. Lucraríamos muito.

:o)
Politicagem correta ou necessária?

- Minha mãe tinha uma aversão profunda ao desperdício. Como, aliás, uma grande parte das mães. Não gostava que deixássemos comida nos pratos. Apagava todas as luzes da casa, fechava as torneiras, pedia para que nos ensaboássemos com o chuveiro desligado.

- Quando veio o apagão e o racionamento obrigatório, ficamos, eu e minha mãe, sem saber o que cortar. Ela seria punida por ter sido econômica a vida inteira. Teríamos que diminuir um consumo que já era naturalmente baixo.

- Lembro-me de uma cena insólita. Tinha algo como 14, 15 anos. Brincava com uns garotos na natação e um deles arremessou talco, que usávamos em nossas toucas, no outro, derramando um bocado no chão. Gritei de onde estava que era um desperdício e emendei, talvez com uma lógica mais profunda que o momento exigia, que muita gente passava fome para que houvesse tamanho desapego aos bens materiais.

- Claro que os moleques me caçoaram afirmando que eu queria acabar com a fome mundial com talco. Nem consegui explicar todo o processo que tinha em minha cabeça. Hoje, rio apenas.

- É normalíssimo, contudo, conhecer pessoas que, simplesmente porque não vivem em escassez, praticam os maiores absurdos - na minha cabeça.

- Hoje presenciei uma discussão onde amigos meus diziam que, por exemplo, ao escovar os dentes deixam a torneira da pia aberta. E, argumentando, quase com sarcasmo, que quem se preocupava com isso era neurótico.

Eu sou neurótico, mas não é por isso.

- Realmente acho que, mesmo que tais recursos fossem infinitos, não seríamos nós a usar algo despropositadamente. Por que não usar apenas o necessário? Sou um grande partidário da reciclagem, porque não reaproveitar tudo o já utilizado em outros aspectos?

- Não sou defensor da causa verde, mas é inegável que nosso país não é um bom exemplo mundial. Seja porque aqui a opulência é confundida como riqueza, seja porque economia tem um ranço de mesquinhez.

- Agora, ter que convencer alguém em pleno funcionamento da razão da importância de fechar a torneira ao escovar os dentes é muito pior que explicar para os garotos da natação que dinheiro não cresce em árvores.

- Infelizmente ninguém é convencido com o óbvio. E o certo sempre é punido pelos erros da maioria. Isso é viver em sociedade.

quarta-feira, 29 de junho de 2005

Futebol-arte

- Em 1987, no auge da sabedoria que os seis anos me conferiam, dizia que não gostava do Bebeto porque ele "só" fazia gols. Meu argumento era sólido. Meter o pé na bola para ela entrar, qualquer um poderia fazer, o mais difícil era trabalhar a jogada e levá-la para ele.

- Tornei-me, com o decorrer dos anos, um sujeito mais ligado às belas jogadas que ao ganhar pelo ganhar. Odiei a seleção de 94. Achei a de 98 mais ou menos e a torci do início ao fim pela de 2002.

- LF Veríssimo, um de meus maiores ídolos, é favorável ao futebol de resultado. Disse, depois do Brasil x Argentina pelas eliminatórias, que o mundo poderia ser dividido entre os partidários do Riquelme e os do Robinho. E, a opção por uma desses lados revelaria muito de nosso caráter.

- No jogo contra os alemães, houve uma jogada, que não se concretizou em gol, que resume bem o porquê eu ainda gostar do futebol. Bola cruzada na área, dois zagueiros gigantes marcando o pequeno atacante do Brasil, ele faz uma cama-de-gato, deixa ambos batendo cabeça, mata a bola no peito, deixar quicar uma vez e bate para o gol. Lembrou-me na hora o gol do Pelé contra o País de Gales em 1958. Em seqüência, o comentarista faz a mesma observação.

- Hoje, Brasil x Argentina novamente. Robinho, outra vez, não faz gol. Mas, há uma jogada, aquela que o Ronaldinho depois, em impedimento, completou, que vai ficar para sempre. O molequinho humilhou metade do time argentino e bateu na bola que categoricamente explodiu no travessão. Suspiros...

- Em compensação... um camarada meu, nesse exato instante, no msn: "acho que perdemos a Copa hoje. Se cruzarmos com os argentinos lá..." Eu: "e eu ainda creio na história do Brasil só ganhar Copa se chegar desacreditado".

- Pelo menos a partida de hoje foi EXCELENTE.

terça-feira, 28 de junho de 2005

O acaso - notas soltas

- Esqueci-me de colocar esse adendo no post abaixo. Ou melhor, não foi exatamente, ou apenas, um esquecimento.

- Além do todo escrito, há ainda o que um tal de William Shakespeare chamava de "razões que a própria razão desconhece". Acaso, coincidência, esses detalhes que não existem.

- Quando tinha uns 16 anos, mais ou menos, fiquei amigo de um professor coroaço que contava um historinha muito curiosa. Segundo ele, a pessoa mais fácil de se hipnotizar é aquele que fala "nunca vão conseguir". Os piores, óbvio, são os que não acreditam, de maneira nenhuma, na hipnose.

- Quinta, enquanto escrevia a nota abaixo, encontrei com uma amiga de anos no msn. Perguntou como eu ia, falou da sua atual atividade (artes gráficas) e insistiu que eu lhe desse meus dados biográficos: ela queria fazer meu mapa astral.

- Argumentei que não, não era bom saber do meu futuro porque se o soubesse, preguiçoso como sou, ficaria parado até que a profecia se realizasse.

- Lembra (sem querer me comparar, mas já o fazendo) do Neo no primeiro e único "Matrix" que presta, quando ele vai ao Oráculo e ela não lhe diz nada relevante, apenas para que ele cumpra completamente a sua missão? Então...

- Minha amiga afirmou que falaria apenas sobre mim. Sobre as minhas possibilidades, sobre o que eu sou e quais princípios eu tenho para alcançar qualquer fim. Estava um pouco agitado, aceitei.

- Mesmo aí embaixo, disse veladamente que o ser humano é feito de crença. Você deve crer em algo para existir. Se o mundo é sua vontade e sua representação, e se vc não tem ambas as coisas, o seu mundo é o nada, o vazio, a ausência. Logo, o mundo é algo racional, relativo e muito baseado em crenças.

- Qualquer crença é infundada. O ato de crer é absurdo. Por outro lado, a própria razão perdeu toda a sua credibilidade, nos últimos anos, quando não deu todas as respostas. Por isso o crescimento do esoterismo. Mas esse papo é para outro dia.

- M. escreveu: "só para constar, a astrologia é milenar, se fosse assim tão esotericamente inútil, não resistiria todo este tempo......os antigos cientistas, as grandes civilizações a usavam"

- Após um diálogo que editado deu em três páginas, me senti tremendamente leve, seguro e confiante. Não quer dizer que eu me transformei no mais ardoroso esotérico, toc, toc, toc, bate na madeira. Não cri em tudo aquilo que me foi dito, mas tais palavras funcionaram como analgésicos (placebos, como todas as drogas) para a minha alma.

quinta-feira, 23 de junho de 2005

Orelhadas pseudonas num dia parado

Como todo mundo sabe, Freud dizia que somos a mistura daqueles três conscientes, que ele mesmo inventou: id, ego, superego. De acordo com ele, nós seríamos o impulso, o id, e sofreríamos a censura do ego - que seria uma adaptação do que é o certo, para se viver em sociedade; ou uma adaptação do superego, que é a própria visão do grupo.

Por outro lado, LF Veríssimo fala - em tom meio sério, meio verdadeiro - que se a sociedade existe ainda hoje foi porque evitamos o nosso id, com maior projeção para o nosso ego. Ou seja, se só respeitássemos os nossos impulsos, o nível de assassinatos, estupros, roubos e furtos seria quase insuportável.

Em um terceiro ponto-de-vista, tem-se Arthur Schopenhauer que (resumidamente, por favor) afirma que o mundo é a nossa representação e a nossa vontade. Ou seja, somos aquilo que queremos ser.

Novamente Freud. O austríaco também fez comentários sobre os "instintos", ou sobre o subconsciente. O que interessa é, de acordo com ele, há atitudes que fogem da razão. De acordo com o raciocínio dele mesmo, há momentos que somos mais impulsivos, ou que o id se sobressai ao ego e ao superego "sem querer".

Mas a pergunta que se faz é simples, quem está certo? Ou, better, há certeza? Há quem está certo e o outro errado? Há uma simplificação dicotômica assim? E, a melhor de todas, são realmente idéias conflitantes?

O próprio Schopenhauer fala sobre viver apenas o presente e que qualquer outro tipo de plano é dispensável, já que o futuro, assim como o passado, é inexistente. Ou seja, criamos o mundo conforme as nossas idéias, vontades e representações, mas é necessário tomar atitudes instantâneas. Quase como uma mistura das idéias de razão e emoção. Do ocidental e oriental. Borges dizia que o alemão havia explicado o mundo. Eu, humildemente, concordo.

quarta-feira, 22 de junho de 2005

Propaganda enganosa

Em listas dos melhores filmes de 2004, "Contra Todos" (dirigido por Roberto Moreira e, como anunciado para quem quiser, dos mesmos produtores de "Cidade de Deus", ou seja, a O2) aparecia sempre bem posicionado. Às vezes como único representante brasileiro. O longa foi também um dos mais premiados do ano passado. Aproveitando as férias, aluguei-o. E decepcionei-me.

Aceito a hipótese de ter supervalorizado o filme, mas é inegável como há INÚMEROS enganos no longa. Pareceu-me uma produção de publicitários, utilizando os cacoetes conhecidos (rodando em vídeo, câmera nervosa na mão etc), abusando dos lugares-comuns para retratar um ambiente estranho, atirando para todos os lados e sem atingir nenhum.

Conferi que o Roberto Moreira tem uma grande experiência acadêmica e prática e os prêmios são sempre dados por profissionais da área que entendem muito mais que eu de cinema, mas não consegui me envolver em nenhum momento com o filme. Cheguei a ficar constrangido.

O sotaque exagerado da menina (Silvia Lourenço), a cenografia clichê, as personagens neuróticas, inconstantes e volúveis, os furos no roteiro (Teodoro vai procurar a mulher, não a encontra e resolve pegar outro trabalhinho, tudo sem muita explicação), tudo isso e muito mais não me deixou enxergar as qualidades encontradas pelo júri no Festival do Rio, por exemplo.

Deve ser problema meu mesmo. A capa do DVD falava sobre um suspense no final. Até agora não o vi.

terça-feira, 21 de junho de 2005

Herói ou anti-herói?

Cabine de "Extremo sul" numa terça de manhã chuvosa. No cinema, eu, um camarada meu, duas pessoas do Canal Brasil e o Jaime Biaggio. Esperava um filme National Geographic, mas, não. Foi, digamos, surpreendente.

E a estragarei, caso realmente haja alguma supresa. Contarei rapidamente e em cronologia os acontecidos. Cinco escaladores super-homens, capazes de sobreviver com pouca comida, em baixas temperaturas, organizados, trabalhadores, etc. resolvem subir uma montanha na Tierra del Fuego, no lado chileno. O pico é tão inóspito que só houve, em toda a História, três expedições que alcançaram o seu cume. Mas eles aparentam determinação e nada os impedirá.

Até aqui, acho curioso o domínio que eles têm da câmera e como conseguem fazer certas tomadas muito bem fotografadas, mesmo quando os cinco estão em quadro. Depois de alguns contratempos, montam o acampamento final, último passo antes da escalada definitiva.

Então algo sai dos planos. Percebemos que tudo é fake. Há uma equipe enorme por trás deles que capta todos os movimentos, escaladores de apoio, e os próprios alpinistas "protagonistas" não são aqueles corajosos que haviam nos apresentados. Depois de algumas reuniões, eles simplesmente desistem de subir a montanha.

O filme, que era para mostrar como o homem domina a natureza, se transforma em uma longa entrevista na tentativa de convencer as personagens principais a terminarem o caminho. Mas eles estavam com medo. Pelo menos é isso a que assistimos. Homens antes imbatíveis, estancados ante o perigo iminente.

Se o longa fosse um pouco mais envolvente, poderíamos estar aqui divagando sobre o que é realmente importante para o ser humano. Voltar para casa sem ter concluído a missão, por puro medo - pelo menos é que o aparenta o filme - ou morrer tentando? Ou, como já parafraseou outros muito mais conhecidos: navegar é preciso, viver não é preciso?

Ao invés disso vemos a indignação da diretora Monica Schmiedt ao final do filme. Provavelmente ela deveria estar pensando na ótima oportunidade que ela perdeu e em quanto dinheiro brasileiro de renúncia fiscal ela gastou à toa.

segunda-feira, 20 de junho de 2005

Superstição e futebol

Sou supersticioso em diversos assuntos, mas no futebol é quase covardia. Nas copas do mundo, costumo criar rituais - sento no mesmo lugar, repito as minhas atitudes, procuro signos na tela etc - que se repetem por todos os jogos. E creio piamente que, se não cumprir qualquer um deles, isso influenciará a Seleção. Vai explicar.

Penso, por exemplo, que o Brasil só ganhará a próxima Copa se sair daqui debaixo de inúmeras críticas. Em 58, 62, 70, 94 e 2002 foi assim. Quando era a favorita, não levou nada, vide 50, 66, 82, 98.

Mas esse raciocínio pode ser explicado fora dos comportamentos irracionais. Normalmente o jogador brasileiro, quando muito confiante, acha que pode ganhar antes mesmo de jogar. E, quando deve provar que é realmente bom, se supera e consegue reverter situações incríveis.

O máximo dessa gangorra entre a alta auto-confiança e a baixa auto-estima pode ser avaliado agora. Quando o Brasil é elogiado, joga mal. Quando joga mal, é criticado e então joga bem. Novamente é elogiado e atua mal no seguinte. Quero saber só até quando esse círculo vicioso se manterá. E que quando a corda arrebentar, que arrebente para o lado dos mais fracos.
Le notti di Cabiria

É conhecida a admiração de Fellini pelos espetáculos visuais e imagens grandiloqüentes, mas pouco se fala sobre o Fellini amargo. Em muitos filmes, suas personagens são desiludidos, decepcionados com o mundo ou com os homens, ou simplesmente gente querendo achar o seu rumo.

A diferença, no caso felliniano, é que seus protagonistas podem sofrer durante todo o desenrolar da história, mas ao final, ao invés de se matar, dirão somente "é a vida" e prosseguirão.

A interpretação desta conclusão, como sempre acontece, é dúbia. Os otimistas defenderão a tese que vivemos num mundo escroto, mas devemos nos acostumar a ele. Por isso não se deve remoer as dores passadas. Já os pessimistas enxergarão as personagens como fracas de espírito que não conseguem resolver os seus problemas ou, simplesmente, como alienados. Preferem viver sob um manto de felicidade - que considerarão falso - à encarar a verdade.

Eu, como sempre, fico no meio termo. Acho que não se deve esquecer do passado, mas tê-lo como única referência só trará medo e covardia.

Mas não era exatamente isso que eu estava em mente quando comecei a escrever. A Cabíria do título é Giulietta Masina, mulher do diretor e atriz de grande parte de seus filmes. Usa esse nome só na noite já que a sua profissão não condiziria com o real, Maria. Sobrenome? Cicarelli. Achei que isso valeria um post.
Gravidez sintética

Há muito tempo saiu uma matéria sobre a possibilidade das mulheres em conseguir produzir embriões com dois óvulos e nenhum espermatozóide. Agora, a 'Times' publicou um estudo que afirma: os sexos podem - remotamente por enquanto - apresentar ambos os gametas. Ou seja, um homem pode ter tanto o óvulo quanto o espermatozóide. E vice-versa.

sexta-feira, 17 de junho de 2005

Emoções

Hoje a trocadora chorou. No ônibus em que vinha para o trabalho, sol a pino, calor lá fora, ela recebeu uma ligação, reclamou algo e não resistiu. Pegou a toalhinha onde normalmente enxuga o suor e secou as lágrimas. Tive impulsos de ir lá e dizer-lha que estava tudo bem, falar para se acalmar, afagar um pouco sua cabeça, mas fiquei com vergonha, não tive coragem. Sei que não é nada absurdo, mas chamaria muito as atenções para mim. Depois subiu no coletivo um ambulante, tentou fazer alguma piada, ofereceu-lha uma bala, mas ela não estava para conversas. Ele se constrangiu e desceu sem vender nada.

Pensei em como as pessoas normalmente não sabem lidar com a tristeza alheia. É comum que evitemos ficar infelizes. Principalmente agora. A depressão é a doença atual e as pessoas tentam de todas as formas esconder um abatimento qualquer. A droga do momento, por exemplo, é a da felicidade plena. Serotonina em cápsulas. Amor em comprimidos. Comunidades hedonistas crescem em qualquer ambiente. Micareteiros tentam prolongar o carnaval para o ano inteiro. Quem fica isolado, quieto, é visto como estranho, velho, ou aquele que não está aproveitando a vida. Como se houvesse uma única forma de viver, e quem não se enquadrasse dentro desse estereótipo seria descriminado. Mais um padrão, mais excluídos.

Gosto de chorar. Não porque valorizo a tristeza, mas porque me dá uma prova concreta que ainda sinto alguma coisa e não sou apenas um saco de ossos ambulantes. Dos oito aos 13 anos, não derramei uma única lágrima. Antes, chorava por qualquer coisa, depois, só voltei a chorar muito mais velho. Tornei-me frio, distante das humanidades. Com o tempo, pude perceber que esta não era a vida que queria para mim. Mas até hoje, quando choro, lembro-me dessa época.

Domingo passado, eu chorei. Era num evento social, com vários amigos. Não foi por tristeza. Durante toda a festa tinha ficado alegre, mas naquele momento, não foi exatamente por jubilo que chorei. Foi na penúltima música da festa. "Lonely Soul", do UNKLE - um projeto do DJ Shadow com a voz (nesta música) do Richard Ashcroft, do Verve. Aos primeiros acordes ainda pedi para o C. trocá-la. Sei que não posso escutá-la sempre, mas nunca tinha chegado às vias. R. estava comigo, em meu colo, a abracei forte e deixei a música continuar. No início, Ashcroft cantando, ainda conseguimos conversar. Porém, a voz se interrompeu e todos os instrumentos sumiram, até só ficar uma marcação quase marcial de um sampler de bateria, que lembra os tambores medievais anunciando a preparação para a guerra, em seguida as cordas calmas, mas em crescentes, e crescem, mais e mais, então, exatamente aqui, eu cai em prantos. Abracei-a mais forte e chorei de soluçar.

Na hora, me senti estranho. Nunca tinha chorado escutando uma música. Tentei achar algum motivo racional, e lembrei que esta é a música que mais me marcou durante a faculdade, sei de cor o exato dia que a escutei pela primeira vez - no rèveillon de 1999 para 2000, em Rio das Ostras - com os meus amigos que se tornariam a minha família. Também me lembrei de quando morei sozinho pela segunda vez, um dos piores momentos da minha vida, quando eu escutava essa música diversas vezes e pensava que ela se encaixava à perfeição para mim.

Mas não. Não foi por um motivo racional que eu chorei. Não foi porque tinha me recordado de alguma coisa. Enquanto a escutava, a música em si me envolveu de tão forma, eu entrei tão profundamente em sua melodia e acordes, e ela me emocionou tanto que não pude me conter. A razão já tinha sido ludibriada há muito. Quem estava ali em prantos era o meu eu mais íntimo, mais profundo. E então fiquei feliz por ter mais uma vez a certeza que ainda posso sentir alguma coisa pelas coisas belas e inanimadas.

quarta-feira, 15 de junho de 2005

De meios e fins

Não fui surpreendido em nenhuma oportunidade por "Vera Drake", o novo filme do Mike Leigh (de "Topsy Turvy", que acho acima do bom). Pelo contrário. Ao longo do filme, imaginei várias tramas paralelas que culminariam em mais conflito no final do filme. Mas não. Acontece sempre o óbvio. Quem viu o trailer sabe toda a trama. O que não quer dizer que o filme seja ruim. É alto-nível. A reconstrução de época é perfeita, os diálogos são precisos e variam entre o cotidiano e o prático, as caracterizações das personagens é exótica como preciso para a produção e os atores, de uma maneira geral, TODOS estão muito bem.

(Não sou muito bom em avaliar atores. Costumo julgá-los pela minha total incompetência, ou seja, se eles me chamam a atenção em suas interpretações, há algo errado. Não devem me lembrar que estão fingindo ou algo do gênero. E, a partir desse raciocínio, no filme todos podem ser qualificados de bons. A Imelda Staunton, por exemplo, me convenceu que era realmente uma mulher boa, altruísta, sem ganância. O ruim é que, depois de ser presa, ela cai no dramalhão. Chora copiosamente por horas e quase não pára mais, até o fim da projeção. Como se tivesse desistido e só o choro restasse.)

Enfim, o filme, como um todo, é OK. Nada além nem aquém. O que realmente vale é uma questão, talvez a central do filme: não ter a intenção dos atos serve como atenuante? Ou, em outras palavras, o meio tem alguma importância, quando o fim está feito?

No direito, tem sim. Na matemática, não. Se vc magoa alguém, mesmo que não intencionasse tal ação, a pessoa ferida leva em conta as suas boas vontades? O ditado diz que o inferno está lotado de bons pensamentos que resultaram em catástrofes. E, por outro lado, o sujeito que magoa, pode, ao menos, alegar ingenuidade - já que inocência é impossível - no caso de melindrar alguém sem o propósito disso?

EU creio que os meios são tão importantes quantos os fins. Nada justifica resultados desgraçados. E sim, vejo como algo menor, uma mágoa não intencional, ao comparada à crueldade do planejamento. O problema é que, para o ser atingido, o resultado, independentemente dos meios e inícios que o conjugaram, tem o mesmo fim. Além de ser impossível voltar atrás da calamidade já feita.

terça-feira, 14 de junho de 2005

Não vivemos num país democrático. Ainda bem

Sábado, 4 de junho (se eu não me engano), O Globo publicou na primeira página a foto de um PM dando um bico na cara de um ladrão de celular. Qual foi a minha surpresa quando, no dia seguinte, quase TODAS as cartas apoiavam a agressão do policial, no melhor estilo, bandido bom é bandido morto.

Paulo Roberto Pires, Nomínimo, na semana passada, criticou duramente essa enxurrada de apoio, dizendo, entre outras palavras sensatas, que "Ao pedir que a polícia bata, torture e mate se preciso for, os caros leitores do “Globo” estão abrindo o mais perigoso dos precedentes. (...) É um suicídio estimular a truculência da polícia, sob pena de esta lógica se realimentar perpetuamente". E também foi criticado duramente em emails.

Ou seja, a classe-média, aquela que tem dinheiro para assinar O Globo, que sabe da existência do Nomínimo, e a que sempre escolhe os nossos governantes - direta ou indiretamente - não é ouvida quando o assunto é repressão à violência. Ainda bem. Para eles, "chute na cara é pouco para essa cambada de vagabundos e marginais." Ou "A guerra civil instalada no Rio não nos permite desperdiçar tempo e energia para fazer valer os direitos de bandidos, sob pena de a sociedade continuar acreditando no mito do ‘bandido cidadão’."

Fico com medo de algum Bolsonaro da vida vire moda e vivamos num clima onde as violências policiais serão ainda mais aceitas (o que já é), até pelos poderes públicos (oficialmente não, mas...) e pelos órgãos da imprensa (o último bastião dos direitos humanos). Se continuarmos assim, a tortura será institucionalizada (ainda mais) e receitada pelas leis aos bandidos. O difícil, como perfeitamente dito pelo Paulo R. Pires, será distinguir os bons, os maus e os feios.
Bate-boca

O melhor momento das declarações de Roberto Jefferson no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, até agora, foi protagonizado por ele e pelo "nobre colega" Valdemar Costa Netto, presidente do PL. Jefferson, ironicamente, se dirigiu ao Costa Netto assim: "o excelentíssimo deputado tem um gosto apurado. Todos nós aqui apreciamos. É um mulherengo, gosta do jogo..." e os microfones foram cortados. Curioso, para dizer o mínimo.

quinta-feira, 9 de junho de 2005

Etimologia

Curioso o que aprendemos com o estudo das palavras. Olha o que Sérgio Rodrigues nos conta: "Delúbio, o nome do tesoureiro do PT, foi uma das formas que a palavra “dilúvio” (inundação bíblica de toda a superfície terrestre) teve em português". Muito válido.

quarta-feira, 8 de junho de 2005

Final do primeiro tempo: 3 a 0 para eles.

parece um jogo entre um time de várzea e um profissional.

o que o Parreira deve falar para os jogadores? "não tenho idéia nem de por onde começar".
tentar minimizar o problema ou já começa a pensar na menor goleada?

o camisa oito deles é SINISTRO. o Crespo também tá sobrando.

os argentinos vão em bando marcar, sempre roubam a bola e partem para o ataque. já os brasileiros não pegaram na bola.

mas o que fica na minha cabeça é: o que treinador deve falar numa situação dessas?
Medo, muito medo...

O google vai ou não vai dominar o mundo?

terça-feira, 7 de junho de 2005

Se melhorar piora; se piorar, melhora.

Ontem o dólar subiu e a bolsa caiu, frutos das declarações sobre o 'Mensalão'. O governo, antes disso, na época das denúncias sobre a corrupção nos Correios, tentou barrar a CPI a qualquer custo. Seus argumentos eram corretos: a investigação poderá ser usada como fins eleitoreiros e a estabilidade do país estaria ameaçada pela comissão parlamentar de investigação.

Se a primeira questão é, de certa forma, tão ridícula que não vejo motivos para discussões.

Já o segundo tema é mais espinhoso. Será que é mesmo uma escolha entre corrupção e inflação? Ou seja, ou investigamos e denunciamos as irregularidades e vemos a economia sofrer solavancos, ou o inverso: admitimos que há o jeitinho institucionalizado, mas podemos dormir como um dos países chamados "em desenvolvimento", com dólar em queda e fluxo de investimento externo em crescimento.

Não sei, não. Se tivesse que escolher, já que não há a hipótese de termos um país justo e forte na economia ao mesmo tempo, optaria por, ao menos, ser limpo. Pobre, mas limpinho.

segunda-feira, 6 de junho de 2005

Desigualdade social

Esse novo escândalo do governo só prova como vivemos numa sociedade com gritantes diferenças entre os com mais e os com quase nada. Senão, vejamos: Roberto Jefferson afirma que o governo pagava R$ 30 mil para os deputados do PL e do PP continuarem na base aliada. (Não vem ao caso, mas é muito caro para deputados de péssima qualidade.) E os deputados do próprio PT (já que, de acordo com o ex-gordo Jefferson, o PTB refugou e o PMDB não fazia parte do "Mensalão")? Nem um tostão. Uns com 30 mil, outros com nada, muito mal distribuído essa riqueza.

Aliás, pensei aqui: os deputados ganhavam essa verba extra por mês, ou seja, trinta dias, em média, quatro semanas, semanas essas com três dias - terça a quinta. Ou seja, 12 dias apenas. Coloquemos 15 dias, com os dias extraordinários, para resumir e facilitar. Isso dá uma média de 2 mil reais por dia de votação. Bem, se de dois em dois anos, o governo me desse 2 mil reais para votar com ele, eu o faria de bom grado. Ou vc acha que ganha mais que isso do governo em serviços prestados nas áreas cativas (saúde, educação, segurança, essas coisas)?

domingo, 5 de junho de 2005

White Stripes: o show in terraes cariocaes

Em poucas palavras? Foi bom, mas estava vazio. Sem querer cair no mérito de que música tocou, porque eu não anotei o playlist (e também porque faço parte do grupo de pessoas que sabe que a música existe, mas só conhece o nome das suas preferidas) e porque é suficiente para mim saber que estas tocaram: "Dead leaves in a dirty ground"; "I'm think I smell a rat"; "Stay in love with a girl"; por que não "Seven Nation Army"? E outras que a minha memória me impede de lembrar.

Jack estava com o diabo no corpo, para usar uma expressão na moda - deles. Depois de uma música - do primeiro disco, mas não me perguntem o nome - em que ele cantou por um tempo segurando o microfone e depois desabou no chão, numa espécie de epilepsia de fundo roqueiro, um camarada comentou que só faltou a pomba-gira. Meg estava lá sentada atrás do seu diminuto set de bateria - sem mais adjetivos ou palavras extras.

Foi "bonitinho" - no dizer da R., mas que eu concordo - ouvi-lo dizer: "god bless you", como últimas palavras, depois de um longo discurso que, se eu não pesquei tudo, entendi o sentido e era uma super-homenagem ao Rio e como ele gostaria de morar aqui . (Como essa expressão é diferente quando pronunciada pelo G. W. Bush). Fiquei pensando: e se eles se transformassem em espécies de Jimmy Cliff?. Não seria mal...

Interessante também descobrir qual era a música nova de trabalho, porque todo indie sabia cantar e a que os fez mais pular. Esse segmento do mercado / tribo da sociedade de consumo (dependendo de com quem você está conversando) é viciado em novidade e não se contenta com o primeiro cd, ou o anterior. Tem que ser o mais atualizado. E como estava rodeado por indies...

Resumindo, como disse: foi bom, mas estava vazio. Os 100 dinheiros pesaram na empolgação. Quando parecia que "agora ia", do ambiente ecoava um silêncio e dava uma paumolada no show. Se tivesse em um ambiente mais intimista, ou numa panela de pressão, acho que me sentiria no inferno. No bom sentido.

sábado, 4 de junho de 2005

Mr. Allen Konigsberg

Introdução: Lembro que Arthur Dapieve escreveu, há diversas semanas/meses, falando sobre a representatividade White Stripes em comparação com os Strokes. Afirma que estes serão lembrados para sempre como os, talvez, melhores representantes da que um dia será chamada geração 00. Contudo, ele preferia os primeiros. Sem muitos argumentos racionais, apenas porque eles são menos perfeitos. Volto ao tema White Stripes daqui a pouco. Fim da introdução.

Vi "Melinda e Melinda", mas não me peçam um julgamento justo. Apesar de reconhecer outros diretores de maior expressividade, Woody Allen é o sujeito que escreve/dirige os filmes que mais me identifico. Acho que isso acontece com todos os neuróticos. Sei que Alfred Hitchcock é, provavelmente, o maior diretor de todos os tempos, sei que Allen nem sempre acerta em cheio, mas o caso aqui não é julgamento. É identificação.

Por isso, resolvi propor uma brincadeira para mim mesmo: escolher qual é o melhor Woody Allen das telas. Atores que tenham interpretado os protagonistas dos filmes do novaiorquino abusando dos cacoetes do diretor/roteirista. O próprio não valerá, por motivos óbvios, entrando na categoria hors-concours. Utilizarei para tanto dois instrumentos: IMDb (superconfiável) e minha memória (totalmente falha). Erros, dúvidas e curiosidades, comentários abaixo.

"Alice" - Mia Farrow não respira um minuto de tão frenética na história dessa dona-de-casa entediada;

"Bullets over Broadway" - John Cusack é um escritor para lá de inseguro que houve os conselhos de um gângster na comédia sobre teatro;

"Celebrity" - Keneth Branagh quer ser escritor e gagueja do início ao fim na crítica ao famosos como sujeitos;

"Sweet and Lowdown" - Sean Penn é um apreciador do Jazz, além de tocar alguns acordes maravilhosamente bem;

"Anything Else" - Allen faz um sujeito capaz até de cometer vingança de forma violenta. O papel do sujeito que não sabe lidar com mulheres fica para Jason Biggs;

"Melinda and Melinda" - Will Ferrel se atrapalha com a mulher, se apaixona por outra e faz piada contra republicanos;


Tive uma outra idéia: a eleição da melhor homenagem feita pelos filmes do Woody Allen:

"Love and Death" - Literatura (especificamente a russa). Há diálogos inteiros com piadas sobre as situações mais conhecidas dos principais autores russos.

"A Midsummer Night´s Sex Comedy" - A peça de teatro de William Shakespeare "Sonho de uma noite de verão" é parodiada do início ao fim.

"The Purple Rose of Cairo" - Cinema, claro. Ou vc não se lembra que as personagens da tela conversam com a platéia? Ou que Mia Farrow toma um pé na bunda e entra numa sala de projeção no fim do filme?

"Radio Days" - A era do rádio, óbvio - aliás, há duas referências ao Brasil nas músicas - mas não me lembro quais.

"Crimes and Misdemeanors" - "Crime e Castigo", de Dostoievski - essa é uma teoria minha antiga e precisa ser explicada. Um dia, quem sabe...

"Shadows and Fog" - filmes noir em geral (já li que era o mais bergmaniano dos filmes de Allen. Não concordo)

"Bullets Over Broadway" - Broadway está até no título

"Mighty Aphrodite" - Há um coro do teatro grego que comenta o desenrolar da história

"Everyone Says I Love You" - filmes musicais bem leves, despretensiosos.

"Interiors" / "September" / "Another Woman" - Acho que ele, durante um tempo, queria ser Ingman Bergman

"Play again, Sam" - Woody Allen conversa com Humphrey Bogart durante a fita

"Deconstructing Harry" - especificamente "Morangos Silvestres", do Ingman Bergman. A trama é a mesma, reparem.

"Celebrity" - há alguma coisa de "La dolce Vitta" de Fellini aqui...
É ou não é, piada de salão?

"Brasília vai sediar o 4º Fórum Global de Combate à Corrupção"

quinta-feira, 2 de junho de 2005

Venda de publicidade

Comecei a ler a nota pensando que se tratava apenas de um questão comercial. Não pagou, não leva. Já era chocante, para mim, porque o governo municipal de uma cidade do interiro do Centro-Oeste estaria institucionalizando a política do pão e circo. Mas não. É pior. Daniel Castro, na Folha, mostra como cidades pequenas devem pagar pelo sinal de TVs que são concessões públicas. No caso específico, a Globo. A empresa, claro, nega tudo. Vale apurar - não com o meu computador.

quarta-feira, 1 de junho de 2005

Praticidade masculina

"Casal bate recorde e comemora 80 anos de casamento
Percy, de 105 anos, e Florence Arrowsmith, de 100 anos, se casaram no dia primeiro de junho de 1925. Segundo Florence, uma dos fórumlas para a longevidade da união é nunca ter medo de pedir desculpas. Já o marido diz que seu segredo é dizer duas palavras bem simples: 'sim, querida'."
Onde é que vamos parar? (com dupla interpretação, por favor)

Rosinha (!), Garotinho (!!) e Pudim (!!!) estão elegíveis novamente.
Mente sana in corpore sano

Hoje de manhã, resolvi acabar com um dos quatro quilos que ganhei nos últimos dois anos. A minha estratégia era simples: exercício aeróbicos. Como a bicicleta está servindo de secador de roupas e como não sou sócio de nenhum clube com piscina nem louco o suficiente para cair na água das minhas redondezas, resolvi optar pelo terceiro esporte do triathlon.

No início, à beira da praia de Botafogo, estava tinindo. Passava os retardatários e só faltava dar um tchauzinho para eles. Mas a minha petulância durou pouco, muito pouco. O fôlego acabou antes de chegar no Aterro do Flamengo, em 13 min. Então, comecei a acompanhar até mesmo velhinhas em seus andadores passando por mim como se fossem Ferraris. Resultado: pernas doendo.

Duas cenas, contudo, valeram o esforço. Encontrei um SOFÁ de couro preto, praticamente intocado, nas areias botafoguenses. Quase fui lá descansar uns minutos.

Avistei também, de longe com os meus dois graus de miopia, um cachorro rastejando, enquanto um butamontes amarrava uma corda e o chamava. Como o pitbull (era essa a sua raça) não atendia ao dono, este o agarrou pela pelanca do pescoço e o trouxe com extrema VIOLÊNCIA e GROSSERIA para prendê-lo junto à trave. O pitboy queria dar uma volta sozinho.

Depois perguntam por que esses cães são tão violentos.