Mas por que a música? Por que a música é considerada por muita gente como a forma de arte mais importante? Bem, vou tentar dar a explicação do Schopenhauer, que eu acho interessante.
Antes, porém, temos que lembrar que a definição de arte - e todas as suas subdivisões - é das coisas mais complicadas de se fazer. Então dizer o que seria arte e, dentro disso, o que seria a música, e o que caracterizaria de arte uma música é um trabalho praticamente infinito. Daí, vamos deixar isso como dado e passar à frente.
Voltando a Schopenhauer. A mais famosa e importante obra do alemão, como se sabe, se chama "O mundo como vontade e representação". Grossíssimo modo diríamos que ele seguiu a tradição metafísica de Kant, em que divide o mundo em dois aspectos, aquilo que podemos conhecer [no caso, a representação], e o que não temos como conhecer a totalidade [o que Kant chama de coisa-em-si e ele de vontade]. Há diferenças entre os dois aspectos, principalmente porque Schopenhauer tem pitadas de filosofias orientais e volta também a Platão, vez por outra. Mas com isso dá para seguirmos adiante.
Portanto, o mundo é dividido entre as coisas físicas, que são as representações, que, por sua vez, são as representações da vontade dessas coisas. E a vontade é a força interior, a essência, o impulso original de todas as coisas. Pois bem.
Para Schopenhauer, a música é a única entre as artes que não carrega a representação dada a priori. Se pensarmos que estamos falando de uma música orquestral, sem qualquer letra, não temos uma imagem mental com a sequência de acordes. Literatura, artes pictórias, teatro, dança, em tudo há um caráter de representação. Quando escrevemos "amor", pintamos uma rosa, subimos num palco caracterizados de palhaço, executamos uma pirueta, estamos passando uma informação que já tem uma série de informações associadas a ela.
A música, não. Apesar de durante anos ter se pensado que haveria acordes proibidos, ou acordes diabólicos, não há uma ligação entre um determinado trecho de música e um sentimento dado. Não sabemos - e eu não entendo nada de música para saber o tamanho da besteira do que vou falar a seguir - qual é a sensação que um dó seguindo de um si bemol vai causar no ouvinte. Assim, a música seria o mais próximo da vontade, já que ela não precisava ser representada. Era a vontade em seu estado mais próximo do puro.
Talvez hoje, após tantas e tantas avalanches musicais, já tenhamos desenvolvido uma certa memória musical e associemos determinadas músicas a sentimentos específicos. Principalmente depois que as letras se tornaram onipresentes e obrigatórias. Daí, algumas bandas são deprês, outras festinha. Outras são hippies, outras viajandonas. A lista de climas do AllMusic mostra o quão diversos esses sentimentos podem ser. Portanto, talvez, hoje, essa proposta de uma música sem influência não funcione mais.
Mas não é curioso que a música, ainda hoje, seja a parte da arte mais valorizada? Que outra arte tem festivais do tamanho de um Rock in Rio, só para ficar no exemplo mais à mão? Mesmo que as indústrias do cinema e dos jogos eletrônicos sejam maiores, não há qualquer comparação com a adoração que se tem com os astros da música. Uma idolatria que, se me permitem, é quase religiosa.
Além disso, a música não pede licença para contaminar o ouvinte - o que é diverso das outras artes que exigem uma dedicação, mesmo que mínima, do espectador. Quantas e quantas vezes nos pegamos cantarolando uma música que não gostamos oficialmente? E dançando aquela música constrangedora? Ou sendo tomados por uma apresentação que não dávamos nada?
Eu suspeito que a música nos conecta com um pedaço de nós que nem sabíamos que ainda existia. Nos tira de nosso controle mental, abre nossas mais ferrenhas defesas e nos mostra a nós mesmos. Além disso, todas as artes tentam [ou deveriam tentar] voltar ao estado da música. Um poema, uma peça, um quadro, tudo tem que ser ou tender ao musical. Porque, para mim, a música é o estado original de todas as artes.
Tá meio desanimado, Schop? |
Voltando a Schopenhauer. A mais famosa e importante obra do alemão, como se sabe, se chama "O mundo como vontade e representação". Grossíssimo modo diríamos que ele seguiu a tradição metafísica de Kant, em que divide o mundo em dois aspectos, aquilo que podemos conhecer [no caso, a representação], e o que não temos como conhecer a totalidade [o que Kant chama de coisa-em-si e ele de vontade]. Há diferenças entre os dois aspectos, principalmente porque Schopenhauer tem pitadas de filosofias orientais e volta também a Platão, vez por outra. Mas com isso dá para seguirmos adiante.
Portanto, o mundo é dividido entre as coisas físicas, que são as representações, que, por sua vez, são as representações da vontade dessas coisas. E a vontade é a força interior, a essência, o impulso original de todas as coisas. Pois bem.
Para Schopenhauer, a música é a única entre as artes que não carrega a representação dada a priori. Se pensarmos que estamos falando de uma música orquestral, sem qualquer letra, não temos uma imagem mental com a sequência de acordes. Literatura, artes pictórias, teatro, dança, em tudo há um caráter de representação. Quando escrevemos "amor", pintamos uma rosa, subimos num palco caracterizados de palhaço, executamos uma pirueta, estamos passando uma informação que já tem uma série de informações associadas a ela.
A música, não. Apesar de durante anos ter se pensado que haveria acordes proibidos, ou acordes diabólicos, não há uma ligação entre um determinado trecho de música e um sentimento dado. Não sabemos - e eu não entendo nada de música para saber o tamanho da besteira do que vou falar a seguir - qual é a sensação que um dó seguindo de um si bemol vai causar no ouvinte. Assim, a música seria o mais próximo da vontade, já que ela não precisava ser representada. Era a vontade em seu estado mais próximo do puro.
Talvez hoje, após tantas e tantas avalanches musicais, já tenhamos desenvolvido uma certa memória musical e associemos determinadas músicas a sentimentos específicos. Principalmente depois que as letras se tornaram onipresentes e obrigatórias. Daí, algumas bandas são deprês, outras festinha. Outras são hippies, outras viajandonas. A lista de climas do AllMusic mostra o quão diversos esses sentimentos podem ser. Portanto, talvez, hoje, essa proposta de uma música sem influência não funcione mais.
Mas não é curioso que a música, ainda hoje, seja a parte da arte mais valorizada? Que outra arte tem festivais do tamanho de um Rock in Rio, só para ficar no exemplo mais à mão? Mesmo que as indústrias do cinema e dos jogos eletrônicos sejam maiores, não há qualquer comparação com a adoração que se tem com os astros da música. Uma idolatria que, se me permitem, é quase religiosa.
Além disso, a música não pede licença para contaminar o ouvinte - o que é diverso das outras artes que exigem uma dedicação, mesmo que mínima, do espectador. Quantas e quantas vezes nos pegamos cantarolando uma música que não gostamos oficialmente? E dançando aquela música constrangedora? Ou sendo tomados por uma apresentação que não dávamos nada?
Eu suspeito que a música nos conecta com um pedaço de nós que nem sabíamos que ainda existia. Nos tira de nosso controle mental, abre nossas mais ferrenhas defesas e nos mostra a nós mesmos. Além disso, todas as artes tentam [ou deveriam tentar] voltar ao estado da música. Um poema, uma peça, um quadro, tudo tem que ser ou tender ao musical. Porque, para mim, a música é o estado original de todas as artes.
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