De posse da ideia de que vivemos em um mundo cada vez mais ególatra, o escritor decidiu botar no papel um conto que não passasse por ele, que não fosse, em nenhum momento, uma descrição de sua subjetividade. Escolheu, para começar, escrever na terceira pessoa do singular. Usar o divino e impessoal “ele”. Ou seria melhor “ela”, já que ele é homem – assim como seria o personagem? Sentiu a primeira dificuldade, porque não se sentia à vontade para escrever sobre uma mulher, exatamente porque não era uma mulher e porque, então, não sabia muito bem como as mulheres se comportam. Mas imaginou que a proposta era, por isso mesmo, escolher algo que não fosse ele. O caminho a trilhar seria obviamente desconfortável. Seria, pois, mesmo já se contrariando, e inseguro, uma mulher.
Uma mulher. Nova? Velha? Não poderia ser da sua idade, essa idade mediana, medíocre, que todo mundo hoje em dia tem, os 30 e poucos anos. Mais nova, então? Mais nova e mostrar os novos desafios enfrentados pela geração anterior a ele, que não são exatamente àqueles que ele enfrentou. Mas seriam assim tão diferentes? Será que as pessoas – meninos e meninas de 20 e poucos – são mais seguros do que ele foi? Será que eles têm mais certezas, vislumbram objetivos mais claramente? Ou será que ele – e toda a sua geração – já demonstrava claramente o abismo que a geração seguinte iria se meter. Ou ainda: não seriam essas as dúvidas de todo mundo quando passa por essa fase da vida?
Por que não, então, uma garota de 15 anos? – mas e qual seria o dilema dessa menina? Há a necessidade de se saber algo para poder se escrever uma história. Ou a proposta aqui é exatamente isso, não saber nada? Ele pensou também em uma senhora de 70 anos, mas então ele já imaginou toda uma vida para ela, culminando numa reflexão do passado. Menina de 15 anos, então. E um calafrio já passa por sua espinha, dessa personagem que ele não tem ideia de quem seja, mas que vai se construindo de uma maneira completamente diferente do que ele é. Mas isso vai ficar artificial? – se pergunta, e não sabe responder. Lembra-se que não tem qualquer controle sobre as reações.
Chegou a pensar em profissões. Qual seria a profissão dessa personagem. Luana, aparece em sua cabeça um nome. Por que Luana? Porque ela seria muito sonhadora. [E então passa por sua cabeça todas as luanas que ele conheceu, e o que elas vão pensar caso leiam isso, e se elas vão imaginar que foram inspiradas nela, ou foi uma espécie de homenagem, ou, ainda, gente que conhece uma luana e que conhece o autor dessas linhas, e tentar traçar paralelos, quando na verdade foi só e apenas um nome que surgiu sozinho, explodindo no meio da cabeça dele, mais nada.] Mas sendo sonhadora, ela pensaria mais em si do que num conjunto, não? Ou não: isso não teria qualquer relação, o ato de pensar e o ato de ser egoísta ou altruísta – altruísta não é uma boa palavra. Não é exatamente altruísmo. O ato de fazer, agir apenas em prol dos outros, dizem, nem existe verdadeiramente, já que todo ato altruísta seria no fundo egoísta, porque o prazer proporcionado aos outros daria o prazer para quem praticou tal ato. Mas não é isso. É uma necessidade de não guiar a vida nem essa narrativa por um sentimento isolado, único, que divide o mundo entre eles e “eu”. Uma proposta que houvesse um sentimento em comum – não comunismo, no seu sentido mais comum, mas algo que ultrapasse o indivíduo. Transcendesse a simples pessoa, a física.
Luana – o que Luana quer ser quando crescer? Qual é o seu sonho? Ela já tem angústias de futuro? Ela se deprime em relação aos problemas do mundo? É possível viver sem ignorar, em alguma parcela, todas as tragédias do universo? É possível viver apenas para o mundo?
Nesse momento o escritor pensa que essa sua proposta de fazer algo completamente antissubjetivo [o que não é exatamente um sinônimo de “objetivo”, ele faz questão de frisar, assim como egoísmo e altruísmo não são antônimos] seria só uma forma de aprofundar sua neurose obsessiva. Sua vontade de controlar todos os movimentos, de criar um mundo próprio em que ele, ao fim, seria uma espécie de Deus, que ditasse as regras. Ser igual a ele, ou o completo inverso, ambos os lados demonstrariam não a “Verdade” das questões que ele quer levantar, mas apenas suas neurose, que tem a mania de controlar todos os seus passos, como um anti-herói [no sentido de ser o oposto do herói] psíquico, que dita as regras tal um ditador.
Contadora, Luana gostaria de ser uma contadora. Qual é a profissão mais sem glamour que existe? A profissão que só existe em função dos outros e que você nunca terá o papel principal? Já se falou muito sobre vendedores de seguros, engenheiros e toda uma gama de profissões exatas que não são valorizadas num momento em que todo mundo é artista, do designer ao mestre cuca, passando por traficantes de drogas. Um contador jamais será artista. Um contador é o apagar de sua vontade em função de um bem maior. É fazer só o trabalho chato. É pensar no todo, jamais em si, apenas. Mas aí ele lembrou que seu pai fora contador. Seria uma forma de falar de si disfarçadamente? Ele lembra que jamais escreveu sobre o pai. Não tem muita memória sobre ele. Continua ou não continua a pensar – e escrever, ato contínuo, automático – no pai? Não pode. Regras são regras. São obsessivamente regras. Há limites, mesmo auto-impostos, e que não devem ser quebradas. Por quê?, se pergunta e não sabe responder.
Já titubeia. Tem a certeza de que não há a possibilidade de se escapar do subjetivismo. Mesmo quando se opta por falar de assuntos que são aparentemente diversos da sua vida, eles são, também, sua vida. De alguma maneira bem estranha.
Luana vai ser sensitiva. Viajar no tempo. Quer ser astronauta. Não, astronauta, não, porque ela se tornaria famosa, “artista”. Ela viaja no tempo mas não pode falar com ninguém sobre isso. Ela é mutante? Estou escrevendo uma história dos X-men?, se pergunta o escritor. E logo em seguida se lembra de como já tinha ouvido essa indicação de como ele deveria parar de escrever sobre o próprio umbigo.
Aliás: deve-se publicar? Melhor que publicar: deve-se publicizar? Não estamos falando sobre uma editor, um livro ou uma revista, mas colocar em seu blog. Mas isso não é uma forma de promover o ego, tentar ser alimentado por uma curtida virtual, saber que ele não está sozinho de alguma maneira? Mas se isolar num mundo, perdido, quieto, também não é se prender numa jaula desnecessariamente?
Seria a resposta uma tentativa de se impor, com todos os mecanismos que se encontra, que se tem à mão, então? Ou seja, colocar sua subjetividade sobre a dos outros? Não, ele duvida. Há um limite, há uma barreira que é a da convivência. Vivemos em uma sociedade e, enquanto tal, temos que respeitar certas regras. Para o bem de todos.
Lembra-se de quando fez uma viagem para uma terra exótica – e evita colocar o nome da terra exótica porque não quer se expor e então se pergunta se esse seria o limite da subjetividade, quando não se sabe mais onde fica a divisão entre o que você quer mostrar e o que você não quer – e se pergunta, confuso, ainda tentando salvar o experimento, se Luana gostaria de viajar – e não consegue responder porque Luana é uma menina que ele não conhece, mas que ele pode conhecer, ele se responde e percebe que já há um diálogo dentro de sua cabeça entre dois personagens diferentes que não concordam em quase nada, e que, de uma maneira binária controlam sua vida. Luana gosta de viajar. Mas isso é o inverso do que ele poderia esperar de uma menina que quer ser contadora. Ela quer ser contadora ou apenas é uma solução que ela acha que é mais fácil? Luana quer sobreviver e acredita que é mais fácil estudar contabilidade, ou sonha – sonha! – em ser contadora? Ninguém sonha em ser contadora. Ou sonha? O ato de sonhar, nesse caso, não seria um correlato para almejar e, aí, seria uma forma de egoísmo, fantasiado de altruísmo, como pensamos?
Ele lembrou novamente da terra exótica. Leu o início do parágrafo anterior e teve vontade de falar sobre a terra exótica novamente, mostrar que o “amor”, ou como quer que se chame os sentimentos com conexões mais fortes, as sensações mais eternas, as ligações feitas com adamantium [só para ficar no campo semântico mutante], são aquelas em que há a necessidade de se abrir mão de si, em algum grau, não em todo, em prol do outro – e esse outro não precisa ser outra pessoa. Pode ser essa terra exótica, um trabalho, um esforço.
Claro que isso não é uma regra. Não é apenas abrir mão de si, e sempre. Deve haver algum tipo de recompensa. Esse objeto pelo qual vamos abrir mão deve nos dar algo que queremos muito. Mas devemos ter que lutar, ultrapassar algum obstáculo que parecia intransponível em outros níveis. E não pode ser eterno, também, esse abrir-mão, muito menos essa atitude deve ser profundamente irremediável. O “eu”, a subjetividade, vai arranjar um jeito de gritar. Se pisarmos muito em nós mesmos, mesmo que o “outro” nos dê – continue a nos dar – aquilo que queremos, mesmo assim, se não dermos espaço para nós mesmos respirarmos, algo escapole. Salta num escuro e fica ali. Mesmo que não se locomova, mesmo que não saiba como agir, como se movimentar nesse mundo novo, ficamos ali, parados. Perdidos. Mas o “eu” se mostra. Isso não há como negar.
O “eu” não tem todas as respostas. Nem “o outro”. Nem a soma das duas coisas. Não há no mundo respostas o suficiente para tantas perguntas que se faz. As perguntas se amontoam, enquanto as respostas vão aos poucos, como num modelo de chave e fechadura, se encaixando. O processo é lento e deve-se ter paciência.
Luana é católica, devota de são Francisco de Assis. Ela tem um gato e dois cachorros. Pensou em ser veterinária, mas nunca suportou ver sangue. Como o escritor. A oração que ela mais gosta, ela pensa que é de são Francisco de Assis, naquela passagem em que ele fala “Ó Mestre / fazei que eu procure mais / consolar, que ser consolado / compreender, que ser compreendido / amar, que ser amado / Pois é dando, que se recebe / Perdoando, que se é perdoado “. O escritor não entende muito bem isso. Exatamente por isso escolheu essa passagem. Ele – que é ateu – prefere uma outra oração, de quem ele não sabe bem a autoria, nem as próprias palavras. A oração pede sabedoria, para três atitudes: consertar o que pode ser consertado; aguentar o que não pode ser consertado; saber a diferença entre ambos. Sabedoria. É o que nós aprendemos da vida.
Uma mulher. Nova? Velha? Não poderia ser da sua idade, essa idade mediana, medíocre, que todo mundo hoje em dia tem, os 30 e poucos anos. Mais nova, então? Mais nova e mostrar os novos desafios enfrentados pela geração anterior a ele, que não são exatamente àqueles que ele enfrentou. Mas seriam assim tão diferentes? Será que as pessoas – meninos e meninas de 20 e poucos – são mais seguros do que ele foi? Será que eles têm mais certezas, vislumbram objetivos mais claramente? Ou será que ele – e toda a sua geração – já demonstrava claramente o abismo que a geração seguinte iria se meter. Ou ainda: não seriam essas as dúvidas de todo mundo quando passa por essa fase da vida?
Por que não, então, uma garota de 15 anos? – mas e qual seria o dilema dessa menina? Há a necessidade de se saber algo para poder se escrever uma história. Ou a proposta aqui é exatamente isso, não saber nada? Ele pensou também em uma senhora de 70 anos, mas então ele já imaginou toda uma vida para ela, culminando numa reflexão do passado. Menina de 15 anos, então. E um calafrio já passa por sua espinha, dessa personagem que ele não tem ideia de quem seja, mas que vai se construindo de uma maneira completamente diferente do que ele é. Mas isso vai ficar artificial? – se pergunta, e não sabe responder. Lembra-se que não tem qualquer controle sobre as reações.
Chegou a pensar em profissões. Qual seria a profissão dessa personagem. Luana, aparece em sua cabeça um nome. Por que Luana? Porque ela seria muito sonhadora. [E então passa por sua cabeça todas as luanas que ele conheceu, e o que elas vão pensar caso leiam isso, e se elas vão imaginar que foram inspiradas nela, ou foi uma espécie de homenagem, ou, ainda, gente que conhece uma luana e que conhece o autor dessas linhas, e tentar traçar paralelos, quando na verdade foi só e apenas um nome que surgiu sozinho, explodindo no meio da cabeça dele, mais nada.] Mas sendo sonhadora, ela pensaria mais em si do que num conjunto, não? Ou não: isso não teria qualquer relação, o ato de pensar e o ato de ser egoísta ou altruísta – altruísta não é uma boa palavra. Não é exatamente altruísmo. O ato de fazer, agir apenas em prol dos outros, dizem, nem existe verdadeiramente, já que todo ato altruísta seria no fundo egoísta, porque o prazer proporcionado aos outros daria o prazer para quem praticou tal ato. Mas não é isso. É uma necessidade de não guiar a vida nem essa narrativa por um sentimento isolado, único, que divide o mundo entre eles e “eu”. Uma proposta que houvesse um sentimento em comum – não comunismo, no seu sentido mais comum, mas algo que ultrapasse o indivíduo. Transcendesse a simples pessoa, a física.
Luana – o que Luana quer ser quando crescer? Qual é o seu sonho? Ela já tem angústias de futuro? Ela se deprime em relação aos problemas do mundo? É possível viver sem ignorar, em alguma parcela, todas as tragédias do universo? É possível viver apenas para o mundo?
Nesse momento o escritor pensa que essa sua proposta de fazer algo completamente antissubjetivo [o que não é exatamente um sinônimo de “objetivo”, ele faz questão de frisar, assim como egoísmo e altruísmo não são antônimos] seria só uma forma de aprofundar sua neurose obsessiva. Sua vontade de controlar todos os movimentos, de criar um mundo próprio em que ele, ao fim, seria uma espécie de Deus, que ditasse as regras. Ser igual a ele, ou o completo inverso, ambos os lados demonstrariam não a “Verdade” das questões que ele quer levantar, mas apenas suas neurose, que tem a mania de controlar todos os seus passos, como um anti-herói [no sentido de ser o oposto do herói] psíquico, que dita as regras tal um ditador.
Contadora, Luana gostaria de ser uma contadora. Qual é a profissão mais sem glamour que existe? A profissão que só existe em função dos outros e que você nunca terá o papel principal? Já se falou muito sobre vendedores de seguros, engenheiros e toda uma gama de profissões exatas que não são valorizadas num momento em que todo mundo é artista, do designer ao mestre cuca, passando por traficantes de drogas. Um contador jamais será artista. Um contador é o apagar de sua vontade em função de um bem maior. É fazer só o trabalho chato. É pensar no todo, jamais em si, apenas. Mas aí ele lembrou que seu pai fora contador. Seria uma forma de falar de si disfarçadamente? Ele lembra que jamais escreveu sobre o pai. Não tem muita memória sobre ele. Continua ou não continua a pensar – e escrever, ato contínuo, automático – no pai? Não pode. Regras são regras. São obsessivamente regras. Há limites, mesmo auto-impostos, e que não devem ser quebradas. Por quê?, se pergunta e não sabe responder.
Já titubeia. Tem a certeza de que não há a possibilidade de se escapar do subjetivismo. Mesmo quando se opta por falar de assuntos que são aparentemente diversos da sua vida, eles são, também, sua vida. De alguma maneira bem estranha.
Luana vai ser sensitiva. Viajar no tempo. Quer ser astronauta. Não, astronauta, não, porque ela se tornaria famosa, “artista”. Ela viaja no tempo mas não pode falar com ninguém sobre isso. Ela é mutante? Estou escrevendo uma história dos X-men?, se pergunta o escritor. E logo em seguida se lembra de como já tinha ouvido essa indicação de como ele deveria parar de escrever sobre o próprio umbigo.
Aliás: deve-se publicar? Melhor que publicar: deve-se publicizar? Não estamos falando sobre uma editor, um livro ou uma revista, mas colocar em seu blog. Mas isso não é uma forma de promover o ego, tentar ser alimentado por uma curtida virtual, saber que ele não está sozinho de alguma maneira? Mas se isolar num mundo, perdido, quieto, também não é se prender numa jaula desnecessariamente?
Seria a resposta uma tentativa de se impor, com todos os mecanismos que se encontra, que se tem à mão, então? Ou seja, colocar sua subjetividade sobre a dos outros? Não, ele duvida. Há um limite, há uma barreira que é a da convivência. Vivemos em uma sociedade e, enquanto tal, temos que respeitar certas regras. Para o bem de todos.
Lembra-se de quando fez uma viagem para uma terra exótica – e evita colocar o nome da terra exótica porque não quer se expor e então se pergunta se esse seria o limite da subjetividade, quando não se sabe mais onde fica a divisão entre o que você quer mostrar e o que você não quer – e se pergunta, confuso, ainda tentando salvar o experimento, se Luana gostaria de viajar – e não consegue responder porque Luana é uma menina que ele não conhece, mas que ele pode conhecer, ele se responde e percebe que já há um diálogo dentro de sua cabeça entre dois personagens diferentes que não concordam em quase nada, e que, de uma maneira binária controlam sua vida. Luana gosta de viajar. Mas isso é o inverso do que ele poderia esperar de uma menina que quer ser contadora. Ela quer ser contadora ou apenas é uma solução que ela acha que é mais fácil? Luana quer sobreviver e acredita que é mais fácil estudar contabilidade, ou sonha – sonha! – em ser contadora? Ninguém sonha em ser contadora. Ou sonha? O ato de sonhar, nesse caso, não seria um correlato para almejar e, aí, seria uma forma de egoísmo, fantasiado de altruísmo, como pensamos?
Ele lembrou novamente da terra exótica. Leu o início do parágrafo anterior e teve vontade de falar sobre a terra exótica novamente, mostrar que o “amor”, ou como quer que se chame os sentimentos com conexões mais fortes, as sensações mais eternas, as ligações feitas com adamantium [só para ficar no campo semântico mutante], são aquelas em que há a necessidade de se abrir mão de si, em algum grau, não em todo, em prol do outro – e esse outro não precisa ser outra pessoa. Pode ser essa terra exótica, um trabalho, um esforço.
Claro que isso não é uma regra. Não é apenas abrir mão de si, e sempre. Deve haver algum tipo de recompensa. Esse objeto pelo qual vamos abrir mão deve nos dar algo que queremos muito. Mas devemos ter que lutar, ultrapassar algum obstáculo que parecia intransponível em outros níveis. E não pode ser eterno, também, esse abrir-mão, muito menos essa atitude deve ser profundamente irremediável. O “eu”, a subjetividade, vai arranjar um jeito de gritar. Se pisarmos muito em nós mesmos, mesmo que o “outro” nos dê – continue a nos dar – aquilo que queremos, mesmo assim, se não dermos espaço para nós mesmos respirarmos, algo escapole. Salta num escuro e fica ali. Mesmo que não se locomova, mesmo que não saiba como agir, como se movimentar nesse mundo novo, ficamos ali, parados. Perdidos. Mas o “eu” se mostra. Isso não há como negar.
O “eu” não tem todas as respostas. Nem “o outro”. Nem a soma das duas coisas. Não há no mundo respostas o suficiente para tantas perguntas que se faz. As perguntas se amontoam, enquanto as respostas vão aos poucos, como num modelo de chave e fechadura, se encaixando. O processo é lento e deve-se ter paciência.
Luana é católica, devota de são Francisco de Assis. Ela tem um gato e dois cachorros. Pensou em ser veterinária, mas nunca suportou ver sangue. Como o escritor. A oração que ela mais gosta, ela pensa que é de são Francisco de Assis, naquela passagem em que ele fala “Ó Mestre / fazei que eu procure mais / consolar, que ser consolado / compreender, que ser compreendido / amar, que ser amado / Pois é dando, que se recebe / Perdoando, que se é perdoado “. O escritor não entende muito bem isso. Exatamente por isso escolheu essa passagem. Ele – que é ateu – prefere uma outra oração, de quem ele não sabe bem a autoria, nem as próprias palavras. A oração pede sabedoria, para três atitudes: consertar o que pode ser consertado; aguentar o que não pode ser consertado; saber a diferença entre ambos. Sabedoria. É o que nós aprendemos da vida.
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