domingo, 14 de julho de 2013

Corporativismo e falta de realidade jornalística

Está me chocando - não a palavra não é "chocando", a palavra é "entristecendo": está me entristecendo acompanhar colegas e amigos meus jornalistas de grandes empresas da mídia brasileira tentando demonstrar a importância dos grandes jornais e das TVs daqui. Entristecendo.

Tenho certeza de que é importante grandes empresas de comunicação ter espaço dentro de uma sociedade de direito. São as grandes empresas, provavelmente, que vão ter força o suficiente para poder investigar mais e mais profundamente as outras grandes empresas, as megacorporações e os principais políticos do país. Jornalismo é caro. Além disso, um escândalo veiculado para o Brasil inteiro choca mais que o mostrado para poucas pessoas. Mas o caso não é esse.

Insistir que os grandes grupos são importantes porque-são me parece usar de um argumento bem parecido como o utilizado para dar uma resposta às crianças pequenas que insistem em diversas questões. E, para jornalistas que são os reis dos "por quês?", fica, no mínimo, contraditório.

Some a isso o fato de as grandes empresas jornalísticas terem perdido - se é que um dia tiveram - a conexão com a realidade-mais-real das ruas. Elas falam para a elite, e se você não se acha parte da elite porque mora de aluguel, ou porque não tem nem carro, ou porque tem que trabalhar de segunda a sexta, às vezes com plantão, para ganhar uma mixaria, sugiro uma ida para o complexo do Alemão. Dê uma volta no mais que polêmico teleférico, passe por suas cinco estações que se estendem por todas as comunidades, e, lá de cima, perceba o quão diferente são aquelas vidas da sua.

Se tiver mais coragem, opte por, em vez de tratar os moradores da favela como bichos em um zoológico, e, assim também voltar de teleférico, fazer o percurso de retorno a pé. Desça, se não for possível todo o caminho, ao menos o Morro do Adeus, a última estação. Desça e perceba que as roupas das pessoas são completamente diferente das suas, que foram compradas nas melhores lojas do ramo, em Paris ou Miami, dependendo de que tipo de elite você é.

Confira que os meninos ainda soltam pipa, hábito perdido numa infância já remota. E jogam bola com qualquer pedaço de plástico rasgado que encontram.

Mas cuidado para não se perder pelas vielas de terra úmida e escorregadia e faminta que sustenta barracos construídos com pedaços de madeira, cacos de vidro e todos os lixos do lixo. Cuidado para não se perder e nunca mais voltar.

A cidade continua muito partida e a grande mídia [esse termo deveras genérico e gasto por anos e anos de críticas de marxistas e pseudomarxistas] não enxerga isso. Um levantamento feito pelo Observatório de Favelas e publicado ano passado mostra que em torno 50% das reportagens mostram a favela como um lugar de violência, criminalidade e drogas. Isso sem contar com as reportagens sobre UPP.

No mesmo relatório, há um apanhado sobre as pequenas mídias que apareceram dentro das favelas. Sites como o Rocinha.org, que nasceu exatamente para tentar mostrar um outro lado das favelas, como diz a sua página institucional, e hoje tem quase um milhão de acessos mensais.

Os jornalistas, ao defenderem os grandes veículos, soam apenas como corporativistas, que querem a reserva de mercado. Mais ou menos como aconteceu com a discussão da obrigatoriedade do diploma.

Esses profissionais, ótimo profissionais na maioria dos casos, se esquecem que, assim como outros "poderes constituídos", há a necessidade de legitimação para se continuar como um poder. E o que é legitimação? É soar como verdadeiro, como representante daquilo que se quer ouvir e ver.

O poder não pertence aos seus representantes, mas a quem lhes dá o poder. Isto é: o político só é eleito se tiver votação. O mesmo acontece com os meios: ele só é um grande veículo à medida que tem uma audiência condizente com isso - seja na quantidade, seja na influência indireta. No momento em que essa legitimidade acaba, não adianta reclamar pelo que, na sua opinião particular, deveria ser/existir para todo o sempre. Aí, em vez de jornalista, você, que se acha muito liberal por votar no PSol, acabou de se transformar em um conservador.

Dito isso tudo, só falta acrescentar que é também muito feio, pega muito mal, defender veículos que, vez por outra, fazem campanhas políticas ao mesmo tempo escancaradas e disfarçadas. Quase um paradoxo, mas que sabemos bem como funciona.

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