domingo, 28 de novembro de 2010

Cobertura de guerra

Um dos aspectos mais... curiosos desses confrontos na Vila Cruzeiro e no Alemão é o clima beligerante. Tudo bem que o Rio, como metonímia do Brasil, não é para principiantes. Um trafica mora numa casa de R$ 5 mil e tem um AK-47 do mesmo preço no mercado negro [se a internet não estiver enganada]. Os trafica' se acham defendendo um território, criam pequenos feudos em que mandam, desenvolvem pequenos exércitos, mas com uma organização mais flácida que pudim de leite. No outro lado do ringue, 21 mil homens, blindados anfíbios, as três forças armadas, mais polícias de todos as esferas e cada um no quadrado do outro. No meio, os jornalistas, enxergando uma oportunidade única da vida: ser correspondente de guerra dentro do próprio município. Do lado de fora, a população, com sede de sangue, contra os desmandos gerais dos últimos 30, 50, CEM, por que não?, 500 anos. E quem sofre? Os de sempre: pobres, pretos, favelados...

TODO MUNDO escreveu que as imagens de quinta-feira pareciam um "Tropa de elite 3" ao vivo - eu incluído. Catarse coletiva, ao vivo, transmitida para todo mundo que tinha uma TV ou mesmo internet. Era, novamente, um nós contra eles. Bandidos x mocinhos. Tudo muito fácil de entender. Simples demais. Demais.

Continuo com mais dúvidas que com conclusões. Pensei, quando vi a tropa dos trafica' fugindo da Vila Cruzeiro: o que vamos fazer com esse povo todo? Temos espaço nas cadeias para esse povo todo? Vamos matar todo mundo? Duzentas, 300, 400 mortes? Bem, esse ano não tivemos nenhum avião caindo. Seria o correspondente. Quantos inocentes?

Fico, para terminar, com a passagem de um jornal que li recentemente:

“[A Favela] É o lugar onde reside a maior parte dos valentes da nossa terra, e que, exatamente por isso – por ser o esconderijo da gente disposta a matar, por qualquer motivo, ou, até mesmo, sem motivo algum –, não tem o menor respeito ao Código Penal nem à Polícia, que também, honra lhe seja feita, não vai lá, senão nos grandes dias do endemoninhado vilarejo.”


Em outro trecho:


"a Favela (...) é a aldeia do mal [...] aldeia da morte [...] Enfim, e por isso, por lhe parecer que essa gente não tem deveres nem direitos em face da lei, a polícia não cogita de [usar da] vigilância sobre ela”. 


O jornal é  “Correio da Manhã”, em 5 de julho de 1909.

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