Você chega a uma idade que pode começar a admitir certas manias publicamente, sem pensar que será julgado como louco ou alguém que precisa de tratamento. Mostra as manias mais indolores, menos condenáveis e até ganha um ar saudável de exótico, de diferente das demais pessoas, de único. Mostra as compulsões mais inocentes até mesmo para lutar contra as que verdadeiramente são um problema, social e pessoalmente danosas.
Já falei dessa minha "perversão", mas gosto de reiterar todas as vezes que eu a cometo, porque sei que não deve ser tão comum: gosto de escrever sobre os livros que ainda estou lendo, não sobre os que eu terminei de ler. Porque enquanto leio, estou envolvido nele suficientemente. Quando acabo, ele vira passado. O ápice de um livro, o momento em que ele libera mais energia não é, necessariamente, o seu fim. Portanto, a empolgação máxima, ou a empolgação necessária para que eu queira escrever sobre ele vem antes do ponto final do autor.
Todo esse preâmbulo [tenho amigos que dizem que sou o homem das introduções; talvez seja, talvez goste de contextualizar tudo o que falo; talvez goste de dar as condições necessárias para que as pessoas captem todos os significados - ou possam captar todas as possibilidades de significado - de uma comunicação] é para dizer que estou me divertindo muito com "Portnoy's complaint". Nessa frase, o leitor mais atento vai perceber duas outras confissões: primeiro que eu não tinha lido esse já clássico livro do Philip Roth. Segundo, que eu disse que estava me "divertindo", ou seja, estou achando extremamente engraçado o livro - o que, talvez, diga bastante sobre mim.
Fico mais tranquilo quando descubro que o livro também foi considerado bem-humorado por outras pessoas - já estava achando que o problema era comigo. Numa obra que mostra as frustrações de um grande funcionário da prefeitura de Nova York, em relação à sua família, sua sexualidade, sua religião, achar engraçado a série de reclamações seria ou demonstrar um lado sádico em mim - até então desconhecido - ou demonstrar uma espécie de identificação com o personagem principal. Nesse caso, há, em parte.
Ter tido uma mãe superprotetora não é um privilégio meu ou do personagem principal. E as consequências de uma criação claustrofóbicas podem ser variadas, mas tendem a cair sempre numa mesma tecla: falta de autoconfiança generalizada. Por isso, em vários momentos, há mesmo um sentimento de "ufa, não foi só comigo...", mas Roth, por meio de seu protagonista-narrador, Alexander Portnoy, diz mesmo que se sente como o "judeu da piada", mas que, para ele, Portnoy, não teria graça alguma.
No livro, Roth eleva a literatura confessional a outro patamar. Em vez de transformar o seu monólogo numa narrativa chata, cheia de reclamações de como a vida é injusta, ele coloca o seu personagem literalmente no divã e o faz relatar todos os seus problemas para o psicólogo, que o está analisando. A obra remete à literatura de Freud - podemos ver isso desde o seu título, passando pela epígrafe, até o fato de termos um analista como antagonista. Mas, se a troca de narrativa fosse a única mudança introduzida por Roth, o livro não passaria de um grande Muro das Lamentações. A diferença fica no humor.
Ele dá argumentos para quem afirma que os judeus são os melhores em fazer piadas depreciativas sobre si. É extremamente autoirônico, abusa do exagero nas descrições, e assume um caráter piadístico, mesmo, ao descrever certos momentos do seu passado. Isso, além de fazer uma crítica feroz a todos os grandes pilares da sua vida, e do seu entorno, como o preconceito dos próprios judeus contra os goys, e é implacável sobre si mesmo, quando se autoavalia. Mas sem jamais perder de vista o humor. E isso não tira o peso das suas duras críticas. Pelo contrário. Não dizem que a piada, o ridículo é a forma mais forte de crítica? É como aquele seu amigo que é ranzinzamente engraçado. Que consegue fazer rir até quando conta como foi horrível o seu dia.
"Portnoy's complaint" não precisa da minha avaliação para ser visto como uma obra que marcou um período, e que ainda reflete hoje em dia. Mas eu aconselharia a qualquer um que quisesse dar boas risadas e sentir que não está sozinho no mundo.
Já falei dessa minha "perversão", mas gosto de reiterar todas as vezes que eu a cometo, porque sei que não deve ser tão comum: gosto de escrever sobre os livros que ainda estou lendo, não sobre os que eu terminei de ler. Porque enquanto leio, estou envolvido nele suficientemente. Quando acabo, ele vira passado. O ápice de um livro, o momento em que ele libera mais energia não é, necessariamente, o seu fim. Portanto, a empolgação máxima, ou a empolgação necessária para que eu queira escrever sobre ele vem antes do ponto final do autor.
Todo esse preâmbulo [tenho amigos que dizem que sou o homem das introduções; talvez seja, talvez goste de contextualizar tudo o que falo; talvez goste de dar as condições necessárias para que as pessoas captem todos os significados - ou possam captar todas as possibilidades de significado - de uma comunicação] é para dizer que estou me divertindo muito com "Portnoy's complaint". Nessa frase, o leitor mais atento vai perceber duas outras confissões: primeiro que eu não tinha lido esse já clássico livro do Philip Roth. Segundo, que eu disse que estava me "divertindo", ou seja, estou achando extremamente engraçado o livro - o que, talvez, diga bastante sobre mim.
Fico mais tranquilo quando descubro que o livro também foi considerado bem-humorado por outras pessoas - já estava achando que o problema era comigo. Numa obra que mostra as frustrações de um grande funcionário da prefeitura de Nova York, em relação à sua família, sua sexualidade, sua religião, achar engraçado a série de reclamações seria ou demonstrar um lado sádico em mim - até então desconhecido - ou demonstrar uma espécie de identificação com o personagem principal. Nesse caso, há, em parte.
Ter tido uma mãe superprotetora não é um privilégio meu ou do personagem principal. E as consequências de uma criação claustrofóbicas podem ser variadas, mas tendem a cair sempre numa mesma tecla: falta de autoconfiança generalizada. Por isso, em vários momentos, há mesmo um sentimento de "ufa, não foi só comigo...", mas Roth, por meio de seu protagonista-narrador, Alexander Portnoy, diz mesmo que se sente como o "judeu da piada", mas que, para ele, Portnoy, não teria graça alguma.
No livro, Roth eleva a literatura confessional a outro patamar. Em vez de transformar o seu monólogo numa narrativa chata, cheia de reclamações de como a vida é injusta, ele coloca o seu personagem literalmente no divã e o faz relatar todos os seus problemas para o psicólogo, que o está analisando. A obra remete à literatura de Freud - podemos ver isso desde o seu título, passando pela epígrafe, até o fato de termos um analista como antagonista. Mas, se a troca de narrativa fosse a única mudança introduzida por Roth, o livro não passaria de um grande Muro das Lamentações. A diferença fica no humor.
Ele dá argumentos para quem afirma que os judeus são os melhores em fazer piadas depreciativas sobre si. É extremamente autoirônico, abusa do exagero nas descrições, e assume um caráter piadístico, mesmo, ao descrever certos momentos do seu passado. Isso, além de fazer uma crítica feroz a todos os grandes pilares da sua vida, e do seu entorno, como o preconceito dos próprios judeus contra os goys, e é implacável sobre si mesmo, quando se autoavalia. Mas sem jamais perder de vista o humor. E isso não tira o peso das suas duras críticas. Pelo contrário. Não dizem que a piada, o ridículo é a forma mais forte de crítica? É como aquele seu amigo que é ranzinzamente engraçado. Que consegue fazer rir até quando conta como foi horrível o seu dia.
"Portnoy's complaint" não precisa da minha avaliação para ser visto como uma obra que marcou um período, e que ainda reflete hoje em dia. Mas eu aconselharia a qualquer um que quisesse dar boas risadas e sentir que não está sozinho no mundo.
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