terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Muita modernidade

Uma das maiores curiosidades ao ler sobre cerveja é descobrir que, apesar de milênios de produção, a forma como nós a consumimos agora, hoje, tem no máximo dois séculos. Antes, eram experimentos muito aleatórios, cujos mestres não sabiam ainda bem o que estavam fazendo, ou quais seriam os resultados.

O mesmo acontece com o consumo de outros produtos [reparem que eu escolhi a palavra "produtos"]. Livros, para ficar em um assunto que eu já li algo sobre. Foi também há mais ou menos dois séculos que houve uma mudança nas tiragens e um aumento do público-leitor - isso, claro, nos países ricos.  Enfim. Esses exemplos servem para reforçar que realmente houve uma mudança forte no comportamento por volta da virada do século XVIII para o XIX, que até hoje nos influencia. É a tal da modernidade.

O que fica na cabeça de quem estudou comunicação na virada do século e do milênio, porém, é que a modernidade teria se findado. Ou melhor, se transformado em algo que, por falta de nome melhor, é chamado de pós-modernidade. Alguns, com vergonha do nome, chamam apenas contemporaneidade [como se o que é contemporâneo agora fosse mais contemporâneo que em outros momentos].

Imagino que qualquer busca na internet vai dar um tabela com as diferenças esquematizadas entre a modernidade e a pós-modernidade, portanto o que eu disser aqui será mera bobagem - já que não terá a profundeza e a preocupação de um ensaio maior moderno, nem a ligeireza e a síntese de um gráfico pós-moderno.

No esquema do segundo, é possível passar rapidamente por uma ideia em um imagem criada por um design que transforma as principais informações em lindos desenhos estilizados de fácil decodificação - e, por que não? -, fruição estética, e que não precisam de grande esforços. É tudo fácil, bonito, prático, indolor, rápido. Já a modernidade requer um trabalho grande de contextualização histórica, demonstrando as sua origens, prováveis explicações, numa reta em direção a um progresso dado como inequívoco. Os modernos são quase positivistas. Ou pior, filhos de Hegel.

A verdade é que essas definições são criações humanas. E como tais, falíveis. Imagino que essa minha afirmação já é encarada por um conservador-moderno [abundam!] como pós-moderna, já que eu admito a incapacidade de chegar a uma conclusão. Porém, quero levantar a sobrancelha do eventual leitor [principalmente se for conservador] para a ideia de que, talvez, só talvez, a pós-modernidade seria apenas uma conclusão, uma linha, ou melhor, a linha de chegada da modernidade. Como dizem dois amigos, e eu sempre os cito, sempre tendemos a achar que vivemos no momento mais importante da História. Eu acrescento: ou que esse momento nos escapou por um triz [no caso dos saudosistas daquilo que não se viveu]. Tendemos, segundo esse ponto, a valorizar inconscientemente o nosso presente em detrimento a outros tempos.

Como fui acusado recentemente de ser flexível demais, de tentar sempre mostrar o outro lado, em detrimento de apresentar o que eu verdadeiramente acredito - eu que na verdade não sei nada bem o que eu verdadeiramente sei - vou voltar no argumento. É inegável, porém, que esse momento mais "cibernético" seja diferente dos anteriores. Não há nada parecido com essa transformação do homem em um ciborgue, em um ser completamente veiculado com máquinas. Estamos, na minha humilíssima opinião, testemunhando a criação, como diria Heidegger, de um novo Dasein.

Taí. Eu acredito que estamos vivendo o início, sim, de uma nova era, de um novo tempo. Bato este martelo. E, como as anteriores, estamos em um processo de transformação, em que outros tempos ainda convivem concomitantemente - e esses caminhos temporais paralelos devem se manter por muitos e muitos anos e décadas, talvez até séculos. Também acho que não descartaremos o que houve no passado, pelo contrário, apenas estamos nos adaptando a esse novo presente, usando, inclusive as ferramentas que aprendemos no passado. Também acredito que não vivemos nem próximo da totalidade do que será essa nova era, e provavelmente essa totalidade nunca existirá, além do campo da teoria.



Antigamente, há 40, 50 anos, pensavam o século XXI, o ano 2000, como um mundo habitado pelos Jetsons. Quando, na virada do milênio, nada de espantoso aconteceu, houve uma espécie de decepção. Esqueceram-se de que as grandes transformações são contínuas e, na maioria das vezes, silenciosas.

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