Já reparou que, por aqui, usamos diferentemente os termos “sociedade” e “povo”? Isso não é uma curiosidade irrelevante, creio. Usamos “sociedade” para nos referirmos a quem tem voz; é praticamente como se estivéssemos dizendo “alta sociedade”, mas incluindo todo mundo que consegue comprar um carro zero. Por sua vez, “povo” designa algo muito abstrato, o velho “hoi polloi” dos gregos, isto é, o grande número, sem rosto, sem nomes, a multidão amorfa e perigosa, desprovida de direitos e de responsabilidade para com o coletivo, cujas únicas manifestações midiaticamente visíveis são as descargas de ódio ou de alegria, na violência ou nas festividades. A comunicação entre a sociedade e o povo se dá sempre assim: ou com condescendência, como quando o pessoal de Ipanema vai comer feijoada em Oswaldo Cruz, como quando um magnânimo patrão ajuda a mãe da empregada a conseguir um leito no hospital; ou, por outro lado, com rispidez e crueldade, quando alguém do “povo” sai da linha que lhe foi designada por alguém da “sociedade”. Já quando alguém da “sociedade” sai da linha, é porque “o Brasil não tem jeito, mesmo”.
[...]
A sociedade brasileira se tornou mais complexa nos últimos anos e dentro de um mundo mais complexo também. Hoje, é difícil espancar o “povo” sem acertar um pouco de “sociedade” também. Eu diria mesmo que os movimentos sociais só vão ser vitoriosos quando a distinção desses termos desaparecer. Até lá, vai ser difícil impedir que um movimento por pautas concretas seja seqüestrado por banais manifestações conservadoras do “contra tudo que está aí”.
Textão, nos dois sentido, de
Diego Viana, sobre tudo o que está acontecendo por aí. Vale muito perder um tempinho para ler.
Nenhum comentário:
Postar um comentário