Gostaria de fazer duas especulações sobre as manifestações. Sugerir ideias que ainda não estão maduras e pedir ajuda dos amigos que as lerem para tentar prosseguir. Mas são duas questões que me chamam a atenção desde o início dos protestos dessa "revolta do vinagre", ou como querem chamá-la. A primeira questão derruba o argumento de que o Brasil é um país pacífico.
Como sabemos [veja esse link], isso é uma falácia histórica. Mas não precisava voltar tanto tempo para perceber isso. Há até uma pequena coincidência de anos. A minha sugestão, o meu chute, esse meu pensamento ainda "verde", é que esse tipo de ideia mal concebida, de que somos um povo sem ganas, é problema geracional.
Para começar a desmitificação, basta lembrar que sempre há protestos nas grandes cidades, apenas raras vezes tomam essa proporção. Também há sempre movimentos específicos que lutam direcionados aos seus interesses mais diretos. Agora, de dez em dez anos, mais ou menos, sempre temos - nós, povo brasileiro -, por conta de um esgotamento do projeto político anterior, uma vontade de mudar grande [seja lá o que isso queira dizer]. Reparem:
Estamos em 2013 e um aumento de 20 centavos catalisou esses protestos que, pelo que eu vi, estão sendo apropriados à esquerda e à direita. A pauta de reivindicações, que começou com o transporte público, ainda é confusa. As pessoas querem, no fundo, uma mudança na forma como são representadas. Por um lado tenho medo de sair desses protestos um minicaçador de marajás, mas por outro acho que os anseios são tão pulverizados que, ao menos, desse mal não corremos.
Voltemos pouco mais de dez anos, 2001. Esse desejo de mudanças profundas que perpassa nosso país a cada década culminou na primeira do século XXI com a eleição de Lula. Lembrem-se que FHC saiu do governo com baixíssimos índices de aprovação e Lula foi praticamente aclamado no segundo turno, sendo que os 60% de votos não refletiram o mundaréu que foi às ruas comemorar sua eleição. A mobilização
popular foi imensa. Parecia Copa do Mundo. Lembre-se: foi uma eleição em que "a esperança venceu o medo".
Novamente pouco menos de dez anos antes, 1992, impeachment do Collor. Um grupo de jovens universitários foi lembrada pela minissérie "Anos rebeldes" que podia protestar e querer mudanças no país. Os protestos dessa época ainda eram muito parecidos com os de todo o século XX, com um líder claro [Lindbergh Farias, não coincidentemente catapultado para a política e um dos principais nomes do PT para ser um futuro presidente da República] e um objetivo que não deixava dúvidas: "fora Collor". "Vencemos".
Na década de 1980, eu era muito novo para falar com mais propriedade, mas o movimento das "Diretas já" ocorreu em 1983-1984. Não acredito em coincidência. Novamente, uma multidão exigia votar para presidente no próximo pleito - o que acabou não acontecendo e mostrando como a ditadura negocia com o seu povo. "Perdemos".
Por motivos óbvios e ditatoriais, a década de 1970 não teve um marco tão forte [me corrijam se eu estiver errado, por favor]. O Brasil, me parece, estava cansado de tanto apanhar e ficou acuado por mais de dez anos, com medo de desaparecer. Mas Élio Gaspari acaba de lembrar que "em dezembro de 1974, a oposição havia derrotado a ditadura nas urnas, elegendo 16 dos 21 senadores, e o ex-presidente Juscelino Kubitschek estava num almoço quando lhe perguntaram o que acontecia no Brasil". Seria a nossa forma de manifestação num período contra manifestações?
Dez anos antes, houve o golpe de 1964, e é bom lembrar que nem sempre temos uma pauta voltada para o que ficou conhecido no século XX como esquerda. Lembre-se: era um período de completa polarização, com pouco diálogo entre os extremos, e de sentimento antidemocrático, contra as instituições. O que me lembra bastante o agora, talvez, quero crer, no outro lado do espectro político. [E ainda tivemos a passeata dos 100 mil, em 1968.]
Em 1954, Getúlio dá um tiro no peito depois de não aguentar tanta pressão, e numa última jogada desse que foi, provavelmente, o nosso maior nome da política do século XX. Dizem, inclusive, que com esse gesto drástico, ele adiou o golpe em dez anos. O resultado de sua morte foi uma enxurrada de pessoas às ruas, novamente. Em 1945, foi o fim do Estado Novo. Em 1930, o início da ditadura de Getúlio. Comprovando que o nome dele aparece em vários pontos da trajetória.
Isso tudo para dizer que, sim, nós vamos às ruas sempre, mas são raras as vezes em que há uma pauta que realmente empolgue a todos nós. Por isso, mais uma vez, sugiro que as propostas desta série de protestos se atenham, basicamente, às questões de transporte público. Podemos exigir tudo, mas para ganhar algo, se não estamos esperando uma "revolução", temos que nos ater a poucos e específicos pontos. É um assunto que incomoda a todas as classes sociais, sem qualquer distinção, e é um dos símbolos mais fortes de como nossa política tradicional, a dos nossos representantes políticos nos cargos legislativos e executivos, é exercida de uma maneira muito parecida com a máfia. Ou seja, é pelo 20 centavos, sim.
Fim da parte 1.
Como sabemos [veja esse link], isso é uma falácia histórica. Mas não precisava voltar tanto tempo para perceber isso. Há até uma pequena coincidência de anos. A minha sugestão, o meu chute, esse meu pensamento ainda "verde", é que esse tipo de ideia mal concebida, de que somos um povo sem ganas, é problema geracional.
Anos rebeldes que sempre vivemos |
Quando até a "Veja" falou bem de Lula |
Voltemos pouco mais de dez anos, 2001. Esse desejo de mudanças profundas que perpassa nosso país a cada década culminou na primeira do século XXI com a eleição de Lula. Lembrem-se que FHC saiu do governo com baixíssimos índices de aprovação e Lula foi praticamente aclamado no segundo turno, sendo que os 60% de votos não refletiram o mundaréu que foi às ruas comemorar sua eleição. A mobilização
popular foi imensa. Parecia Copa do Mundo. Lembre-se: foi uma eleição em que "a esperança venceu o medo".
Novamente pouco menos de dez anos antes, 1992, impeachment do Collor. Um grupo de jovens universitários foi lembrada pela minissérie "Anos rebeldes" que podia protestar e querer mudanças no país. Os protestos dessa época ainda eram muito parecidos com os de todo o século XX, com um líder claro [Lindbergh Farias, não coincidentemente catapultado para a política e um dos principais nomes do PT para ser um futuro presidente da República] e um objetivo que não deixava dúvidas: "fora Collor". "Vencemos".
Na década de 1980, eu era muito novo para falar com mais propriedade, mas o movimento das "Diretas já" ocorreu em 1983-1984. Não acredito em coincidência. Novamente, uma multidão exigia votar para presidente no próximo pleito - o que acabou não acontecendo e mostrando como a ditadura negocia com o seu povo. "Perdemos".
Se essa foto não é histórica, eu não sei o que é: Lula, Ulysses, [não sei], Orestes, Brizola, [não reconheci], Tancredo. |
Dez anos antes, houve o golpe de 1964, e é bom lembrar que nem sempre temos uma pauta voltada para o que ficou conhecido no século XX como esquerda. Lembre-se: era um período de completa polarização, com pouco diálogo entre os extremos, e de sentimento antidemocrático, contra as instituições. O que me lembra bastante o agora, talvez, quero crer, no outro lado do espectro político. [E ainda tivemos a passeata dos 100 mil, em 1968.]
Edição extra do "Última hora" |
Isso tudo para dizer que, sim, nós vamos às ruas sempre, mas são raras as vezes em que há uma pauta que realmente empolgue a todos nós. Por isso, mais uma vez, sugiro que as propostas desta série de protestos se atenham, basicamente, às questões de transporte público. Podemos exigir tudo, mas para ganhar algo, se não estamos esperando uma "revolução", temos que nos ater a poucos e específicos pontos. É um assunto que incomoda a todas as classes sociais, sem qualquer distinção, e é um dos símbolos mais fortes de como nossa política tradicional, a dos nossos representantes políticos nos cargos legislativos e executivos, é exercida de uma maneira muito parecida com a máfia. Ou seja, é pelo 20 centavos, sim.
Fim da parte 1.
Nenhum comentário:
Postar um comentário