Muito já foi dito sobre "Freedom", a obra-prima de Jonathan Franzen, e talvez eu não acrescente nada. Mas, ao terminar de lê-lo, há pouco, fiquei com um sabor diferente na boca. Não pelas qualidades do livro - é um livraço, gostei de um jeito que eu não esperava, mexeu comigo profundamente - mas por quase uma trama colateral. Ou melhor dizendo: a escolha de assuntos que beiram o cotidiano. Como ele tenta achar a poesia, a tragédia, o lirismo, o drama, a dor, a alegria, em temas que, para olhos menos acostumados, seriam simplesmente banais.
Não sei se é uma coincidência ou uma relação que se pode estabelecer entre os países de língua inglesa, mas foi a mesma sensação que eu tive quando, em 2012, eu assisti à abertura das Olimpíadas de Londres, no momento da homenagem aos sistema de saúde pública da ilha. Como é possível fazer brilhar um assunto tão sem brilho? Não tiro a importância do National Health Service - ele realmente é incrível, um modelo para o mundo - mas não é algo a que estamos acostumados a festejar. Homenageamos os grandes heróis, as grandes conquistas mais factuais, as grandes vitórias. O NHS é uma grande vitória, sem dúvida, mas sua luta é no âmbito do dia-a-dia. Faz muito mais parte da dura realidade das pessoas que, sei lá, as bandas de rock inglesas, ou a revolução industrial, que também foram parte da mesma festa de abertura. É algo de hoje, que mexe com a vida das pessoas agora, não em seus sonhos.
O principal tema de "Freedom" - e do seu anterior, "As correções" - é a estrutura familiar. E esse argumento, por si só, já seria o máximo do cotidiano do mundo. Em que lugar não se formaram estruturas nucleares, entre dois ou mais indivíduos que, por algum tempo, mesmo que escasso, compartilharam o mesmo teto? Por outro lado, há já uma tradição na ficção de se tentar explorar as entranhas dessa organização entre os indivíduos que passa por uma acelerada transformação, para acompanhar o ritmo do mundo. Principalmente na ficção americana. Veja o que foi a produção cinematográfica alternativa deles nos últimos 20, 30 anos. Mas não é só isso que Franzen faz.
Assim como a abertura de Londres, ele usou como assuntos de fundo, as matérias mais "apoéticas" que encontrou, que não carregariam nenhuma ou pouca carga de elementos que são considerados essencialmente objetos do fazer poético, e escreve sobre eles. Neste "Freedom", ele coloca um protagonista - Walter Berglund - como um amante da natureza que gosta de observar pássaros [passatempo do próprio Franzen, aliás]. Não pode haver assunto mais aparentemente entendiante que esse. Além disso, ele fala sobre a construção de fábricas de armas, sobre remoções de famílias por grandes corporações, a tentativa de se preservar uma ave específica, a crise [ou catástrofe] ecológica, o aumento da população mundial, etc. etc. etc.
Não só de pequenas tramas vive "Freedom", claro. Há um astro do rock, uma família envolvida em política, pessoas tentando expressar seus sentimentos pela criação de algo com intuito artístico, uma ligação direta com figuras importantes da administração do país, críticas ao envolvimento com a guerra do Iraque e Afeganistão e, novamente, um segundo e longo etc. Mas mesmo nesses assuntos que seriam grandes, que brilhariam só de os expor, ele tenta mostrar o lado mais comezinho das suas relações. O que interessa Franzen é o detalhe. Ele torna maior o pormenor.
O moço que foi chamado pela "Time" como "O grande escritor americano" - ou seja, quem melhor conseguiu captar o Zeitgeist -, por conta exatamente desta obra, encara assuntos muito atuais, matérias que não assentaram ainda no fundo do fluxo do tempo, não foram comprovadamente aceitas pela História como relevantes. Ele enxerga esses tópicos como aqueles que devemos, necessariamente, tratar. Tenta construir uma poética própria a partir deles, uma nova forma de falar sobre objetos que não são comumente abordados - mesmo que de uma maneira igual ao que já foi feito. Contribui assim para colocar seus temas em pauta e fazer com que as pessoas pensem sobre esses assuntos, mesmo que colateralmente, sem fazer propaganda ou campanha deles. Manda uma mensagem subliminar para a cabeça dos seus leitores, sem que eles percebam. Participa ativamente do mundo.
Não sei se é uma coincidência ou uma relação que se pode estabelecer entre os países de língua inglesa, mas foi a mesma sensação que eu tive quando, em 2012, eu assisti à abertura das Olimpíadas de Londres, no momento da homenagem aos sistema de saúde pública da ilha. Como é possível fazer brilhar um assunto tão sem brilho? Não tiro a importância do National Health Service - ele realmente é incrível, um modelo para o mundo - mas não é algo a que estamos acostumados a festejar. Homenageamos os grandes heróis, as grandes conquistas mais factuais, as grandes vitórias. O NHS é uma grande vitória, sem dúvida, mas sua luta é no âmbito do dia-a-dia. Faz muito mais parte da dura realidade das pessoas que, sei lá, as bandas de rock inglesas, ou a revolução industrial, que também foram parte da mesma festa de abertura. É algo de hoje, que mexe com a vida das pessoas agora, não em seus sonhos.
O principal tema de "Freedom" - e do seu anterior, "As correções" - é a estrutura familiar. E esse argumento, por si só, já seria o máximo do cotidiano do mundo. Em que lugar não se formaram estruturas nucleares, entre dois ou mais indivíduos que, por algum tempo, mesmo que escasso, compartilharam o mesmo teto? Por outro lado, há já uma tradição na ficção de se tentar explorar as entranhas dessa organização entre os indivíduos que passa por uma acelerada transformação, para acompanhar o ritmo do mundo. Principalmente na ficção americana. Veja o que foi a produção cinematográfica alternativa deles nos últimos 20, 30 anos. Mas não é só isso que Franzen faz.
Assim como a abertura de Londres, ele usou como assuntos de fundo, as matérias mais "apoéticas" que encontrou, que não carregariam nenhuma ou pouca carga de elementos que são considerados essencialmente objetos do fazer poético, e escreve sobre eles. Neste "Freedom", ele coloca um protagonista - Walter Berglund - como um amante da natureza que gosta de observar pássaros [passatempo do próprio Franzen, aliás]. Não pode haver assunto mais aparentemente entendiante que esse. Além disso, ele fala sobre a construção de fábricas de armas, sobre remoções de famílias por grandes corporações, a tentativa de se preservar uma ave específica, a crise [ou catástrofe] ecológica, o aumento da população mundial, etc. etc. etc.
Não só de pequenas tramas vive "Freedom", claro. Há um astro do rock, uma família envolvida em política, pessoas tentando expressar seus sentimentos pela criação de algo com intuito artístico, uma ligação direta com figuras importantes da administração do país, críticas ao envolvimento com a guerra do Iraque e Afeganistão e, novamente, um segundo e longo etc. Mas mesmo nesses assuntos que seriam grandes, que brilhariam só de os expor, ele tenta mostrar o lado mais comezinho das suas relações. O que interessa Franzen é o detalhe. Ele torna maior o pormenor.
O moço que foi chamado pela "Time" como "O grande escritor americano" - ou seja, quem melhor conseguiu captar o Zeitgeist -, por conta exatamente desta obra, encara assuntos muito atuais, matérias que não assentaram ainda no fundo do fluxo do tempo, não foram comprovadamente aceitas pela História como relevantes. Ele enxerga esses tópicos como aqueles que devemos, necessariamente, tratar. Tenta construir uma poética própria a partir deles, uma nova forma de falar sobre objetos que não são comumente abordados - mesmo que de uma maneira igual ao que já foi feito. Contribui assim para colocar seus temas em pauta e fazer com que as pessoas pensem sobre esses assuntos, mesmo que colateralmente, sem fazer propaganda ou campanha deles. Manda uma mensagem subliminar para a cabeça dos seus leitores, sem que eles percebam. Participa ativamente do mundo.
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