Ah, as memórias. São peças de uma engrenagem que é puxada todas as vezes que um gatilho é disparado – e esse gatilho pode ser disparado por qualquer razão, qualquer dos nossos sentidos, qualquer citação, ou mesmo outra memória. Ela pode – e deve ser adestrada – mas jamais é inteiramente domada. Ela sempre tem espaços escuros, buracos negros onde guardamos o lixo, aquilo que consideramos, por algum momento, que não precisaremos no futuro, ou aquilo que não queremos ver novamente, ou aquilo que, de tão confortável, não merece fundir uma alegórica placa, que é onde as suas informações são guardadas. É nesse buraco-negro que está a maior parte de nossas memórias. Esse buraco-negro é a regra da nossa memória, não a sua exceção. É esse buraco-negro que chupa o restante das nossas memórias, aquelas que foram momentaneamente iluminadas, para dentro, logo em seguida de serem utilizadas. E, essas partículas de lembrança, que ficam sempre em suspensão, que flutuam, como no espaço escuro lá fora, porque não há qualquer gravidade grave o suficiente para determinar um caminho óbvio, se perdem, ficam perdidas, como palavras dentro de um livro esquecido na prateleira mais alta da estante de uma empoeirada biblioteca trancada a chave, que sumiu. A memória armazena essas partículas e, quando o nosso processador precisa delas, joga luz para um determinado lado da memória, como se elas pudessem se agrupar automaticamente. Às vezes enxerga o que não quer. Às vezes, percebe associações surpreendentes. Às vezes, descobre bastante sobre si mesmo.
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