Tive uma epifania nessa semana. Consegui responder a uma pergunta que me fazia há muito: como nascem os nossos gostos? Ou melhor, por que somos tão influenciados, principalmente na tradição psicanalítica, pela ideia de que os nossos primeiros anos moldam bastante nossas personalidade? Isso, claro, já partindo da premissa - ou seja, já respondendo a questionamentos anteriores, afirmando claramente um caminho - de que somos feitos de uma matéria bastante moldável ao nascermos. Considerando isso, por que somos mais influenciados nesse primeiro momento de vida que em todos os demais?
Antes de continuar, a contextualização. Uma das grandes vantagens da arte urbana, essa que não fica restrita ao interior de museus, e que pode ser vista ao andarmos pelas ruas, é exatamente a possibilidade de revisita. Em alguns casos, passamos todos os dias pelos mesmos monumentos. Eu tenho o privilégio, por exemplo, de ver uma obra que desde a primeira vez que a descobri, gostei.
É a peça singelamente batizada de "Escultura para o Rio de Janeiro", de Waltercio de Caldas, criada em 1997. Acho incrível esses pilares puxando a calçada para o alto, para o céu, como se fossem algo orgânico, como se tivessem vida, como se a cidade, a parte mais física da cidade, mais pedra, mais terra, mais solo, se movesse por vontade própria.
Nem sempre, claro, foi assim, desse jeito, de passar por uma obra que eu gostasse à primeira vista. O que não é bom nem ruim em princípio. Talvez se não tivesse passado por outra experiência, diferente dessa, nunca teria chegado à conclusão de como nascem os nossos gostos. Em um dos meus outros trabalhos anteriores, tinha que passar diariamente em frente ao muro do jóquei em frente ao Hospital da Lagoa.
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Aqui dá para ter uma ideia do que eu via diariamente.
É uma tela urbana - digamos assim - bem dinâmica. Que muda todos os dias, praticamente. Que tem sempre elementos novos, mesmo que sem a ação do homem. Pode chover, aparecer uma infiltração. Pode alguém novo aparecer e pintar por cima dos antigos. Pode a prefeitura "limpar" a tela. As variáveis são muitas. Mas, como passava diariamente por ela, eu acompanhava essas transformações lentas, como todas as da natureza. No início, um pouco sem um diálogo. Apenas via aquelas imagens e elas não faziam sentido para mim. Depois, com o tempo, relaxando, sem querer entender o sentido delas, eu comecei a me encantar pelo todo. E novamente tive essa sensação de que o muro era vivo, mutante, influenciado por diversos organismos que o faziam diferente a cada olhada. Sem perceber, na hora que baixei a guarda da minha razão que tentava explicar os seus detalhes em separado, comecei a gostar do muro também.
Foi assim que, agora, eu, que hoje em dia vejo um grafite pouco realista na escada do Botafogo, sem prestar muita atenção para ela, comecei a sentir uma simpatia gratuita por aqueles traços que reproduzem esportistas das mais variadas atividades, tive esse insight.
As crianças são influenciadas pelos pais nos seus primeiros anos exatamente porque elas não têm esse raciocínio, essa elaboração, para refletir sobre as informações que lhes são dadas. Elas recebem toda a carga do mundo emotivamente, sem qualquer trava, sem qualquer defesa, vão absorvendo tudo, aprendendo, e apreendendo sem qualquer filtro, direto, na veia, dentro de um desses espaços que recentemente descobrimos e apelidamos em nosso cérebro.
Depois, com o passar do tempo, criamos algumas barreiras, formas de nos defender dessa inundação, dessa enchente de dados novos, para podermos, inclusive, ter noções de tempo, espaço, aprender recursos cognitivos, criar mecanismos racionais etc. É um processo lento e que provavelmente demora muito para se acabar - se acabar.
Não sei se a minha resposta é factível, nem se é a verdade. Mas é uma resposta que me convence. Isso é mais que suficiente.
Antes de continuar, a contextualização. Uma das grandes vantagens da arte urbana, essa que não fica restrita ao interior de museus, e que pode ser vista ao andarmos pelas ruas, é exatamente a possibilidade de revisita. Em alguns casos, passamos todos os dias pelos mesmos monumentos. Eu tenho o privilégio, por exemplo, de ver uma obra que desde a primeira vez que a descobri, gostei.
Foto de Laura Marques, d'"O Globo". |
Nem sempre, claro, foi assim, desse jeito, de passar por uma obra que eu gostasse à primeira vista. O que não é bom nem ruim em princípio. Talvez se não tivesse passado por outra experiência, diferente dessa, nunca teria chegado à conclusão de como nascem os nossos gostos. Em um dos meus outros trabalhos anteriores, tinha que passar diariamente em frente ao muro do jóquei em frente ao Hospital da Lagoa.
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Aqui dá para ter uma ideia do que eu via diariamente.
É uma tela urbana - digamos assim - bem dinâmica. Que muda todos os dias, praticamente. Que tem sempre elementos novos, mesmo que sem a ação do homem. Pode chover, aparecer uma infiltração. Pode alguém novo aparecer e pintar por cima dos antigos. Pode a prefeitura "limpar" a tela. As variáveis são muitas. Mas, como passava diariamente por ela, eu acompanhava essas transformações lentas, como todas as da natureza. No início, um pouco sem um diálogo. Apenas via aquelas imagens e elas não faziam sentido para mim. Depois, com o tempo, relaxando, sem querer entender o sentido delas, eu comecei a me encantar pelo todo. E novamente tive essa sensação de que o muro era vivo, mutante, influenciado por diversos organismos que o faziam diferente a cada olhada. Sem perceber, na hora que baixei a guarda da minha razão que tentava explicar os seus detalhes em separado, comecei a gostar do muro também.
Foi assim que, agora, eu, que hoje em dia vejo um grafite pouco realista na escada do Botafogo, sem prestar muita atenção para ela, comecei a sentir uma simpatia gratuita por aqueles traços que reproduzem esportistas das mais variadas atividades, tive esse insight.
As crianças são influenciadas pelos pais nos seus primeiros anos exatamente porque elas não têm esse raciocínio, essa elaboração, para refletir sobre as informações que lhes são dadas. Elas recebem toda a carga do mundo emotivamente, sem qualquer trava, sem qualquer defesa, vão absorvendo tudo, aprendendo, e apreendendo sem qualquer filtro, direto, na veia, dentro de um desses espaços que recentemente descobrimos e apelidamos em nosso cérebro.
Depois, com o passar do tempo, criamos algumas barreiras, formas de nos defender dessa inundação, dessa enchente de dados novos, para podermos, inclusive, ter noções de tempo, espaço, aprender recursos cognitivos, criar mecanismos racionais etc. É um processo lento e que provavelmente demora muito para se acabar - se acabar.
Não sei se a minha resposta é factível, nem se é a verdade. Mas é uma resposta que me convence. Isso é mais que suficiente.
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