Dois
termos principais aparecem na metafísica nietzschiana: Wille zur
Macht [vontade de potência] e
o ewige Wiederkunft des Gleichen [eterno
retorno do mesmo]. Segundo Heidegger, esses termos não mudam
muito a ideia do que se vem falando na metafísica desde os tempos
mais antigos. Porque Heidegger coloca [se eu entendi bem] o Wille
zur Macht como a "essência", aquilo que somos
"idealmente", ou que somos em si, dentro de nós, sem a
influência do externo; e o "eterno retorno do mesmo" como
nossa "existência", no sentido de - ainda se eu entendi
direito - ao retornar a si mesmo, criamos uma identidade, uma
identificação pessoal, única. O que acabamos sendo no cotidiano,
com todas as concessões que devemos fazer.
Ele
justifica essa posição polêmica afirmando que não há muita
diferença entre o que fez a tradição metafísica, com a separação
em, no caso de Platão por exemplo, mundo sensível [real] e mundo
ideal [idealizado], e o que Nietzsche faz. Para Heidegger, há uma
escala de valores, firme, fixa e que permanece, entre o Wille zur
Macht e o eterno retorno.
Nietzsche
se manteria na tradição da metafísica, apesar de todas as suas
propostas de mudanças e revalorizações, por conta do fato da sua
"Wille zur Mach" estar ligada ao *Ser*, ou o que é ser, ou
verdade [mesmo que esses últimos conceitos tenham mudado muito ao
longo dos tempos]. Porque, para Heidegger, "verdade é uma
condição apresentada na essência da vontade de potência, a saber,
a condição da preservação do poder"1.
Mas a
verdade não é mais algo fixo, imutável, exterior, independente da
opinião do próprio ser que a vive – esse ser que é mais comumente chamado de "sujeito". Explicando de
outra maneira: o Wille zur Macht, com a sua posição de
"preservação", via processo de sempre querer mais poder,
como vimos, é algo que, no linguajar heideggeriano,
"aguarda-para-ser-verdade". Como se dissesse que há uma
potência latente nessa vontade, que ainda não existe na vida real, ou ainda não
há, ou melhor, ainda não é. E que, ao ser liberada, se tornaria verdade.
É o que
Heidegger diz se chamar "certeza", [as palavras em alemão
usadas relacionadas a esse conceito são Gewiss,
Gewisse e Gewissheit,
respectivamente algo como “certamente”, “certo”, “certeza”],
que seria o princípio, a base da metafísica moderna, como foi antes
a “verdade”, travestida em seus mais diferentes nomes, teóricos,
como o ícone, o alvo, a direção, ou práticos, como democracia,
deus, tradição. “Certeza” - no sentido de "segurança do
ser" - é a forma moderna da "verdade".
Ou seja: a
vontade de potência torna o ser seguro de si, ou potente, para agir
de acordo com a sua vontade, com o seu querer, com a sua impulsão
[no sentido de "passível de impulsionar"]. Em vez de ter uma
“verdade”, que remete à ideia de algo fixo, imutável, digno de
um ser exterior, que influenciaria de maneira fria e impessoal as
vontades dos seres, a “certeza”, que é pessoal, intransferível
por completo, interna, e que empurra para frente, que impulsiona. É como se engolíssemos deus.
1Heidegger,
1977 / 84, em tradução livre
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