Heidegger fala sobre a dualidade da relação "intensificação-preservação" para definir "valor" e argumenta, além da importância de estarem conectados, que a intensificação é condição necessária para a preservação da vida, e que qualquer vida que não tentar se intensificar, se restringe a meramente se preservar está fadado ao declínio. É um argumento que lembra bastante os momentos mais "bélicos" de Nietzsche, quando ele sugere aos mais fortes (em suas diversas denominações empregadas) não se sujeitarem aos mais fracos. Mas, um pouco mais à frente no texto, Heidegger, citando Nietzsche, afirma que a vontade “tem vontade” de si mesma. Ela quer se tornar "mais forte", que seria ter “mais poder”, ou, melhor, mais potência, e sempre querer mais e mais potência - nunca deixar de querer mais. O que é importante frisar nesse caso é que, de acordo com Heidegger, o poder não almeja "mudar de nível", o que poderia ser interpretado como interferir em outra esfera de ação, no caso outros sujeitos: simplesmente almeja mais poder. É uma questão que, levando em conta essa intepretação, não tem consequências nem objetivos fora da própria ação, não é um caminho para uma outra conclusão. É uma condição em sua essência.1
O autor de “Ser e tempo” mostra que as relações entre estabilidade [preservação] e instabilidade [intensificação] criam um curioso movimento na forma de encarar o que é chamado no texto de "complexas formas de vida". A vontade de potência ["Wille zur Macht"] é a característica fundamental da "vida": "Vontade de potência", "tornar-se", "vida" e "Ser", no seu sentido mais amplo, - querem dizer, na linguagem de Nietzsche o MESMO. E esse MESMO quer dizer, para Heidegger, resumidamente, algo como pertencer ao mesmo tempo. O ato de estar vivo se baseia em centros da Vontade de Potência, particulares de cada tempo. Esses centros são configurações, são ícones, são métricas, objetivos, formas de se regular cada tempo, ou seja, uma espécie de fonte de criação de moral, para usar uma terminologia mais batida. Assim Nietzsche entende, por exemplo, a arte, o Estado, a religião, a ciência, a sociedade, o Ser. Para Nietzsche, valor é o ato de se dar mais ou menos importância ao ponto-de-vista, à forma como se encara, a esses centros dominantes.
E há uma conexão clara entre vontade de potência e valores, para Heidegger. Valores mudam à medida que poder aumenta. É como se pensássemos que no momento em que o poder segue o seu processo natural de preservação, que é querer mais poder, os valores devem se adaptar a essa nova realidade. Mas há uma conexão no sentido inverso também: valores são as condições para a vontade de potência. Quando a Vontade de potência se torna "real", se "materializa", se torna "verdade", arriscando, se torna poder em si, em vez de sua vontade, conseguimos saber quais são seus valores. Porque o poder para querer mais poder deve se basear em algum parâmetro – no caso, nos valores - para saber o que é mais poder. É uma relação de mão dupla em que o poder alarga os limites dos valores e os valores criam esses próprios limites para serem ultrapassados. Daí também a necessidade de aumentar o poder para a sua própria preservação. Ao ficar encapsulado, parado, os valores se cristalizariam e se tornariam sólidos, tornando o seu alargamento cada vez mais complicado, exigindo, digamos assim, uma vontade de potência mais potente.
E vontade de potência, segundo interpretação de Heidegger, é a vontade de tomar o poder, de ser o ser superior – Heidegger vai usar expressão parecida para designar “deus” (e é aqui que está o objetivo do texto, mas vamos chegar lá). Mas, antes, o ente deve primeiramente comandar a si mesmo. E a vontade sempre tem vontade de algo - pelo simples fato de ter vontade, não necessariamente para atingir o objetivo. A vontade é o objetivo em si. Mesmo quando tem vontade de "nada", ela ainda prefere ter essa vontade do que não ter. Como se almejasse alcançar algo maior, seguir uma trilha em direção a um objetivo, empurrar à frente, seguir adiante. Vontade de potência é a "mais interna essência do Ser", segundo Nietzsche, sendo Ser, aqui, o "todo", não dividido, já unido.
Daí a interpretação do niilismo como a possibilidade não de desvalorizar todos os valores, mas de revalorizá-los, ou seja, dar outros valores, criar novas marcas, novos limites. O niilismo seria então um processo, uma transformação, uma relação entre a vontade de potência, que se materializa em poder em si, e os valores que a permeiam, a limitam e dão sentido para ela. Ou seja, o niilismo como uma possibilidade de não aceitar os valores como eles são, mas de, a partir de uma interpretação pessoal, única, mediada pela Vontade de potência, dar aos valores o tamanho que achamos que eles devem ter. Para Heidegger, há uma conexão direta entre o niilismo e o pronunciamento de que "Deus está morto".
1Heidegger, 1977 / 77 e 78, em tradução livre
O autor de “Ser e tempo” mostra que as relações entre estabilidade [preservação] e instabilidade [intensificação] criam um curioso movimento na forma de encarar o que é chamado no texto de "complexas formas de vida". A vontade de potência ["Wille zur Macht"] é a característica fundamental da "vida": "Vontade de potência", "tornar-se", "vida" e "Ser", no seu sentido mais amplo, - querem dizer, na linguagem de Nietzsche o MESMO. E esse MESMO quer dizer, para Heidegger, resumidamente, algo como pertencer ao mesmo tempo. O ato de estar vivo se baseia em centros da Vontade de Potência, particulares de cada tempo. Esses centros são configurações, são ícones, são métricas, objetivos, formas de se regular cada tempo, ou seja, uma espécie de fonte de criação de moral, para usar uma terminologia mais batida. Assim Nietzsche entende, por exemplo, a arte, o Estado, a religião, a ciência, a sociedade, o Ser. Para Nietzsche, valor é o ato de se dar mais ou menos importância ao ponto-de-vista, à forma como se encara, a esses centros dominantes.
E há uma conexão clara entre vontade de potência e valores, para Heidegger. Valores mudam à medida que poder aumenta. É como se pensássemos que no momento em que o poder segue o seu processo natural de preservação, que é querer mais poder, os valores devem se adaptar a essa nova realidade. Mas há uma conexão no sentido inverso também: valores são as condições para a vontade de potência. Quando a Vontade de potência se torna "real", se "materializa", se torna "verdade", arriscando, se torna poder em si, em vez de sua vontade, conseguimos saber quais são seus valores. Porque o poder para querer mais poder deve se basear em algum parâmetro – no caso, nos valores - para saber o que é mais poder. É uma relação de mão dupla em que o poder alarga os limites dos valores e os valores criam esses próprios limites para serem ultrapassados. Daí também a necessidade de aumentar o poder para a sua própria preservação. Ao ficar encapsulado, parado, os valores se cristalizariam e se tornariam sólidos, tornando o seu alargamento cada vez mais complicado, exigindo, digamos assim, uma vontade de potência mais potente.
E vontade de potência, segundo interpretação de Heidegger, é a vontade de tomar o poder, de ser o ser superior – Heidegger vai usar expressão parecida para designar “deus” (e é aqui que está o objetivo do texto, mas vamos chegar lá). Mas, antes, o ente deve primeiramente comandar a si mesmo. E a vontade sempre tem vontade de algo - pelo simples fato de ter vontade, não necessariamente para atingir o objetivo. A vontade é o objetivo em si. Mesmo quando tem vontade de "nada", ela ainda prefere ter essa vontade do que não ter. Como se almejasse alcançar algo maior, seguir uma trilha em direção a um objetivo, empurrar à frente, seguir adiante. Vontade de potência é a "mais interna essência do Ser", segundo Nietzsche, sendo Ser, aqui, o "todo", não dividido, já unido.
Daí a interpretação do niilismo como a possibilidade não de desvalorizar todos os valores, mas de revalorizá-los, ou seja, dar outros valores, criar novas marcas, novos limites. O niilismo seria então um processo, uma transformação, uma relação entre a vontade de potência, que se materializa em poder em si, e os valores que a permeiam, a limitam e dão sentido para ela. Ou seja, o niilismo como uma possibilidade de não aceitar os valores como eles são, mas de, a partir de uma interpretação pessoal, única, mediada pela Vontade de potência, dar aos valores o tamanho que achamos que eles devem ter. Para Heidegger, há uma conexão direta entre o niilismo e o pronunciamento de que "Deus está morto".
1Heidegger, 1977 / 77 e 78, em tradução livre
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