Algo do Brasil atual, com seus emergentes e suas zonas de exclusão, com sua indecisão entre o arranque e a regressão, dá sinais de uma aproximação galopante e não consciente à verdade de sua história escravista através de confrontos não politicamente formalizados nem simbolicamente elaborados, que se expressam no conflito entre os poderes de Estado, na loucura religiosa, nos tribunais do Facebook, nas facções discursivas, no alarde das opiniões, nos fla-flus sem beleza, sem perspectiva e sem regras. São a marca viciosa daquilo que na nossa sociedade vai mudando sem mudar, que se transforma sem transformar, e que resiste a encarar tanto o real de suas violências constitutivas e de suas desigualdades profundas quanto o real de sua potência inovadora.José Miguel Wisnik, em texto sobre a proposta de diminuição de maioridade penal, aborda a questão das polarizações cada vez mais radicais das discussões. Parece que ninguém mais abre mão do seu querer, da sua opinião em prol de um discurso de consenso, de uma sociedade menos dividida, rasgada por dogmas - racionais ou irracionais. Será que estamos entrando, até aqui, numa sociedade binária? Quando é que vamos nos abraçar durante os debates por saber que, no fim, a intenção é que seja o melhor não para uma ou outra pessoa, mas para todos?
[Esse texto fez uma ponte com outro, de Ethan Nadelmann, cientista político e diretor-executivo da ONG norte-americana Drug Policy Alliance, publicado hoje também, no "Prosa". Entre outros argumentos, diz ele: "A proibição das drogas é a maior fonte de renda para o crime organizado, gerando violência e corrupção. Leis criminais mais duras apenas alimentam uma guerra que não pode ser vencida."]
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