O segundo momento do "Fim", Fim de Semana do Livro no Porto, que ecoou na minha cabeça [oca] [se quiser ler o primeiro, basta clicar aqui], não foi a representante da Kobo, a simpaticíssima Camila Cabete, falando sobre como somos imigrantes digitais, por isso, sempre nos sentindo em constante adaptação, deslocados do nosso ambiente original. Nem a sua lembrança de que eles, da Kobo, terão por volta de 3 milhões de e-livros no Brasil, por terem se associado à Livraria Cultura.
Nem a lembrança, já em outra mesa, de que talvez estejamos nos esquecendo de que esses e-livros não se utilizam de todos os recursos disponíveis em um leitor de obras eletrônicas, e, principalmente, de um tablete digital. E que caso comecemos a produzir esse objeto ainda sem nome que vai comungar texto, som e imagens [não necessariamente nessa ordem], e que foi apelidado por uma palestrante de "pós-livro", as editoras, atualmente, não estão preparadas para disputar mercado com outras indústrias, como a do cinema e de games.
Foi algo menos prático, menos informação para ganhar dinheiro e mais para, hum, pensar. Foi algo mais [com o perdão da palavra] filosófico. Mesmo que a palestrante fosse uma antropóloga. Mirian Goldenberg foi a escolhida para fechar o ciclo de palestras do Fim - em outras palavras, para ser o fim do Fim. E ela decidiu falar sobre um temas que lhe são mais caros: Leila Diniz.
Uma das questões mais interessantes levantadas pela professora foi o caso de Leila, apesar de ter se transformado em um mito, não ter sido uma personagem política, nos sentidos mais estritos do termo, em sua época. Não era feminista - e, como Mirian lembrou, era até meio mal vista pelo grupo por "gostar demais de homens" -, não militava em grupos de esquerda - apesar de se relacionar bastante com o grupo - nem era uma panfletária, que queria impor suas ideias sobre os outros. Por que, então, ela se transformou nesse ícone, nesse exemplo, nesse fim para onde todos gostariam de convergir? Porque era alguém que queria apenas ser ela mesma, e nada além. E foi isso, essa informação aparentemente simples, que me chamou bastante a atenção.
Há personagens que, apenas por serem elas mesmas, conseguirem descobrir quem são e terem a coragem de seguir em frente, apesar de todas as demais críticas e censuras - e imaginem um país como o Brasil, em pleno regime militar - se tornam faróis para as demais pessoas. Como se houvesse um misto de inveja com admiração [talvez toda inveja tenha um pouco de admiração, não?] daquele ser que conseguiu sair das regras impostas, ou autoimpostas e seguir adiante.
Isso é muito facilmente identificado com gays que, após anos de negação, conseguem reunir forças para "sair do armário". Percebemos que eles ficam, de uma hora para outra, mais leves, mais tranquilos, mais felizes, por serem, simplesmente, eles mesmos. Isso acontece, obviamente, em diversos outros aspectos. Os filhos que têm que lutar para sair da barra da saia dos pais. A mulher ou o homem que fica se prendendo ao casamento para manter as aparências. Quem não larga aquele emprego, por exemplo, com medo de não conseguir um outro para se sustentar. Etc., etc., etc..
O processo, claro, não é nem um pouco simples. Como saber, ou ter uma noção bastante forte, sobre quem é você? Ou sobre aquilo que você quer, realmente? Ou, para usar uma linguagem mais filosófica: quem é o seu ser? E "ser", nesse caso, é quase um sinônimo para muita gente boa que pensou esse assunto, de "estar". Não é algo imutável, algo que te torna a mesma pessoa aos 20, aos 40, ou aos 60. Porque isso seria, claro, outra prisão. É descobrir esse ser a cada momento, a cada instante, e saber para onde ele aponta. É escutar a voz interna, o sopro que nos remete a ir em direção a algo, é conhecer o nosso querer, a cada vez que ele quiser. E, à medida que não atrapalhar a convivência em sociedade, praticá-lo com o maior gozo possível.
Ser você mesmo, sem olhar a quem. Ou, como diz um verso do poema lido por Mirian, escrito por Drummond em homenagem a Leila Diniz no dia em que ela morreu, num acidente de avião, na Índia, quando voltava da Austrália: "A arte de ser, sem esconder o ser".
Toda essa história me lembrou aquele famoso - e repetido - poema do Paulo Leminski, "Incenso fosse música":
Nem a lembrança, já em outra mesa, de que talvez estejamos nos esquecendo de que esses e-livros não se utilizam de todos os recursos disponíveis em um leitor de obras eletrônicas, e, principalmente, de um tablete digital. E que caso comecemos a produzir esse objeto ainda sem nome que vai comungar texto, som e imagens [não necessariamente nessa ordem], e que foi apelidado por uma palestrante de "pós-livro", as editoras, atualmente, não estão preparadas para disputar mercado com outras indústrias, como a do cinema e de games.
Foi algo menos prático, menos informação para ganhar dinheiro e mais para, hum, pensar. Foi algo mais [com o perdão da palavra] filosófico. Mesmo que a palestrante fosse uma antropóloga. Mirian Goldenberg foi a escolhida para fechar o ciclo de palestras do Fim - em outras palavras, para ser o fim do Fim. E ela decidiu falar sobre um temas que lhe são mais caros: Leila Diniz.
A professora Mirian indicou e eu confirmo o filme do Domingos
Oliveira sobre Leila Diniz: "Todas as mulheres do mundo"
Oliveira sobre Leila Diniz: "Todas as mulheres do mundo"
Uma das questões mais interessantes levantadas pela professora foi o caso de Leila, apesar de ter se transformado em um mito, não ter sido uma personagem política, nos sentidos mais estritos do termo, em sua época. Não era feminista - e, como Mirian lembrou, era até meio mal vista pelo grupo por "gostar demais de homens" -, não militava em grupos de esquerda - apesar de se relacionar bastante com o grupo - nem era uma panfletária, que queria impor suas ideias sobre os outros. Por que, então, ela se transformou nesse ícone, nesse exemplo, nesse fim para onde todos gostariam de convergir? Porque era alguém que queria apenas ser ela mesma, e nada além. E foi isso, essa informação aparentemente simples, que me chamou bastante a atenção.
Há personagens que, apenas por serem elas mesmas, conseguirem descobrir quem são e terem a coragem de seguir em frente, apesar de todas as demais críticas e censuras - e imaginem um país como o Brasil, em pleno regime militar - se tornam faróis para as demais pessoas. Como se houvesse um misto de inveja com admiração [talvez toda inveja tenha um pouco de admiração, não?] daquele ser que conseguiu sair das regras impostas, ou autoimpostas e seguir adiante.
Isso é muito facilmente identificado com gays que, após anos de negação, conseguem reunir forças para "sair do armário". Percebemos que eles ficam, de uma hora para outra, mais leves, mais tranquilos, mais felizes, por serem, simplesmente, eles mesmos. Isso acontece, obviamente, em diversos outros aspectos. Os filhos que têm que lutar para sair da barra da saia dos pais. A mulher ou o homem que fica se prendendo ao casamento para manter as aparências. Quem não larga aquele emprego, por exemplo, com medo de não conseguir um outro para se sustentar. Etc., etc., etc..
O processo, claro, não é nem um pouco simples. Como saber, ou ter uma noção bastante forte, sobre quem é você? Ou sobre aquilo que você quer, realmente? Ou, para usar uma linguagem mais filosófica: quem é o seu ser? E "ser", nesse caso, é quase um sinônimo para muita gente boa que pensou esse assunto, de "estar". Não é algo imutável, algo que te torna a mesma pessoa aos 20, aos 40, ou aos 60. Porque isso seria, claro, outra prisão. É descobrir esse ser a cada momento, a cada instante, e saber para onde ele aponta. É escutar a voz interna, o sopro que nos remete a ir em direção a algo, é conhecer o nosso querer, a cada vez que ele quiser. E, à medida que não atrapalhar a convivência em sociedade, praticá-lo com o maior gozo possível.
Ser você mesmo, sem olhar a quem. Ou, como diz um verso do poema lido por Mirian, escrito por Drummond em homenagem a Leila Diniz no dia em que ela morreu, num acidente de avião, na Índia, quando voltava da Austrália: "A arte de ser, sem esconder o ser".
Toda essa história me lembrou aquele famoso - e repetido - poema do Paulo Leminski, "Incenso fosse música":
isso de quererConfesso que acredito bastante nisso.
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além
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