[Já devo ter escrito isso, mas, se não...]
Eu tinha acabado de assistir a um dos melhores shows da minha vida: Blur, no Hyde Park. Tinha ficado muito impressionado ao perceber que os ingleses tratam a banda de Damon Albarn e cia. com uma reverência que podemos encontrar apenas nos fãs não-irônicos da Legião Urbana. Era uma relação que remetia à identidade daquelas pessoas ali.
A grande maioria ali era de ingleses [para desenvolver no futuro: shows de música estão para a Inglaterra como o carnaval para o Brasil] que cresceram com música como "Tender" [acima] tocando nas rádios, em festas, em todos os lugares possíveis. Se para mim o show era ótimo, porque eu adoro Blur, para eles era ainda maior: era se enxergar, era se ver, lembrar de si, de um passado em comum.
Ao fim do show, que acontecia exatamente no dia do encerramento das Olimpíadas, a organização do evento resolveu transmitir a cerimônia no telão. Nós, ainda sob efeito de muita endorfina, nos posicionamos para ver o outro show e com uma pontinha de orgulho pátrio: haveria uma pequena apresentação dos próximos jogos, que, como sabemos, acontecem no Rio, em 2016.
Antes de continuar, um pequeno flashback. Assistir à cerimônia de abertura das Olimpíadas - que eu gosto de fazer [é o máximo que eu me permito em relação ao carnaval carioca da avenida] - de Londres 2012 foi uma experiência curiosa. Porque eu, apesar de estar vivendo naquele país havia quase um ano já, não entendi bastante das referências que eles fizeram. O que eram todas aquelas crianças pulando nas camas dos hospitais? Qual é a importância disso? Por que o orgulho do sistema de saúde do país? Para mim, essa parte, especificamente, foi a de mais difícil compreensão. O passado da revolução industrial, o quase presente da influência pop são de conhecimentos gerais. Mas o fato de que o NHS, o tal sistema de saúde deles, ser um orgulho nacional, é algo que não sabemos - e é difícil, sendo do Brasil, acreditar.
Corta de volta para a final, para o encerramento. Estávamos enfileirados quando começou a parte brasileira. E foi uma sequência bem brasileira. Que eu duvido, duvido!, que os ingleses tenham entendido. Era um tal Marisa Monte fazendo a Iemanjá, Seu Jorge cantando "Não vem que não tem" [seria uma mensagem cifrada?], nossa energia atômica de maracatus...Confesso que quase chorei. Tive que me segurar para não pagar o mico de me debulhar em lágrimas com o que, depois, foi caracterizado pelos meus amigos nas internerds de brega, cafona, antiquado, parado no tempo entre outros adjetivos pouco benevolentes.
Aqueles sinais não representavam apenas o Brasil, representavam a mim. Depois de quase um ano sem entender por completo uma mensagem, eu, finalmente, sabia seguramente o que estava acontecendo. Era "eu", um "eu" que eu nem sabia que eu tinha, que existia, que estava ali, sendo mostrado para todo o mundo, era um "eu" brasileiro. Não adiantou anos tentando ser mais cosmopolita que os cosmopolitas, eu, ao fim, ou no início de tudo, sou brasileiro. Não dá para escolher.
Não me lembro se foi antes ou depois disso. Sei que houve um momento que tocou o hino brasileiro. Não chorei, mas cheguei a soluçar. Ao fim, um casal de ingleses, vendo que nós sabíamos a letra, chegou perto e disse a frase mais bonita de todos os quatro anos que se iniciavam ali: "Good luck".
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