Chego assim ao fim desta minha apologia do romance como grande rede. Alguém poderia objetar que quanto mais a obra tende para a multiplicidade dos possíveis mais se distancia daquele unicum que é o self de quem escreve, a sinceridade interior descoberta de sua própria vontade. Ao contrário, respondo quem somos nós, quem é cada um de nós senão uma combinatória de experiências, de informações, de leituras, de imaginações? Cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilos, onde tudo pode ser continuamente remexido e reordenado de todas as maneiras possíveis.
Mas a resposta que mais me agradaria dar é outra: quem nos dera fosse possível uma obra concedida fora do self, uma obra que nos permitisse sair da perspectiva limitada do eu individual, não só para entrar em outros eus semelhantes ao nosso, mas para fazer falar o que não tem palavra, o pássaro que pousa no beiral, a árvore na primavera e a árvore no outono, apedra, o cimento, o plástico...
Ítalo Calvino mostrando que todo texto é, e não deixa de ser, autobiográfico. [Retirado dessa dissertação aqui, que me parece bem interessante].
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