Este caso mostra que não vivemos no único país que enfrenta esse tipo de problema. E que Londres é mais legal que Nova York e Paris. |
Há muitos anos - tantos anos que não sei se a memória já se confunde com a imaginação anedótica, mas que, para o fim aqui proposto, não faz qualquer diferença - eu li uma reportagem falando sobre o problema do cocô de cachorro nas ruas do Rio de Janeiro. Era uma matéria grande, articulada com correspondentes em Nova York e em Paris. O grande mote era dizer como estávamos abandonados aqui.
Em Nova York, dizia a jornalista, o dono do cachorro era obrigado a recolher o cocô das ruas, sob pena de receber multa. Portanto, era a aposta no individualismo e, se quisermos aumentar a alegoria, no liberalismo: cada sujeito tinha sua própria responsabilidade e cabia ao Estado - esse ser visto como pantagruélico por estes senhores - apenas coibir. Mais ou menos o papel de uma agência [só que não - as brasileiras].
Já em Paris, o dono do cachorro podia deixar o cocô nas ruas porque um empregado do Estado iria logo limpar a sujeira. Portanto, era a aposta do coletivismo, e, para continuar no mesmo tom, do Estado forte, que traz seguranças sociais. O mesmo que deveria tratar todos igualmente.
Em ambos os casos, porém, uma certeza: a calçada ficava limpa. No Brasil, claro, nem o dono é obrigado [moral ou legalmente] a limpar o chão, nem o Estado cumpre esse papel. O resultado é sujeira.
Há casos que fogem dessa normatização. Por exemplo, o fulano, imbuído de um espírito de cidadania - ou seja, a cidade não é apenas minha, mas de todos - limpa o cocô. Em outros casos, um sujeito imbuído do espírito da cidadania e o do direito, tenta fazer justiça com as próprias, hum, com a própria atitude. Reclama com o dono do cachorro que ele não pode deixar o cocô na rua. O dono do cachorro, por sua vez, pode simplesmente, hum, ignorar essa cobrança - já que o cobrador não tem qualquer poder além o de encher o saco - ou, envergonhado por se saber um - hum - sujo, se agachar e limpar o chão. E, assim, os casos de exceção seguem à diante.
A verdade, como se vê, é que aqui existe apenas uma política: a da farinha pouca, meu pirão primeiro [essa deveria ser a frase da nossa bandeira]. Ou, o que me ocorreu mais recentemente: a política da peixeira, que pode ser resumida por outro dizer, a do cada um por si, e deus contra todos. Nos meus momentos mais otimistas, eu acredito que essa nossa individualidade é uma resultante de anos de abandono completo, e que somos um país muito jovem, e estamos ainda amadurecendo as nossas instituições democráticas. No restante do tempo, penso em comprar uma peixeira.
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