terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Podíamos estar pior

"Em um bombardeio, deve-se esconder debaixo da mesa; se explodir uma bomba, é preciso ficar com a boca aberta para não prejudicar a audição posteriormente; ao avistar um helicóptero ou ver pessoas abandonado os carros no meio das ruas ou estradas, é importante sair do carro porque é sinal de bombardeio aos veículos; evitar circular perto de edifícios oficiais como delegacias de polícia e ministérios, em caso de retaliação, é comum Israel alvejar essas instituições."

Daqui.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Tiro certeiro

Digam o que quiserem sobre "Capitu". Mas é inegável a beleza de "Elephant gun", essa música do Beirut, a.k.a. Zach Condon, um rapaz do Novo México que resolveu conhecer o mundo com a sua música.



A direção, nos conta Inagaki, é de Alma Har'el.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

O português capitulou

O primeiro episódio da "Capitu" não surpreendeu: entregou aquilo que estávamos esperando. Dramaturgia de alta qualidade, com experimentações estéticas. Maquiagens exageradas, roupas espalhafatosas e músicas de Hendrix, Johnny Rotten e cia. e Beirut para dar o verniz pop para o livro mais famoso de Machadão.

Há passagens bem interessantes e o Melamed segura bem a onda de Bentinho. Dá gosto de ver. Entretanto...

Poisé sempre há "poréns" e nesse caso há dois: um leve e um gravíssimo, principalmente em se tratando do fundador da Academia Brasileira de Letras. Comecemos por retirar os devidos três pontos na carteira de Luiz Fernando Carvalho. O narrador escolhido para ler as cartelas de episódios é risível. Talvez tenha até sido a intenção, já que o Machadão era um sujeito que gostava da ironia, principalmente a de viés humorística. Mas fica estranho quando uma cena é tensa e o sujeito faz voz de palhaço.

Agora, o problema maior, que merece nota zero nessas colunas de TV e até em qualquer coluna é o erro de português em uma das intercessões do texto em si de "Dom Casmurro". Explico. Um dos recursos pós-modernísticos de Carvalho foi escrever, com fonte de 1900, trechos da obra, enquanto o narrador-protagonista está falando sobre algo impossível de ser ilustrado. Ou apenas para dar uma bossa. A questão é que não pode errar o português. Não pode, não dá, fica feio, feíssimo. Horroroso. E eles erraram. Copio a prova abaixo.

"Voltou dali há duas semanas", Carvalho? O português capitulou.

ps. Agora, vendo o site da série, percebo que o erro de português é contagioso. Escreveram como eu escrevia há muito tempo, sem a devida preposição: "assista todos os vídeos". Ou seja, "ajude todos os vídeos".

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Balanço

Coisas que não gosto (mas tenho que fazer):
Amarrar os cadarços.
Arrumar a cama.
Cortar o cabelo.

Coisas das quais me orgulho:
Ter aprendido a andar de bicicleta, quando velho.
(Devo pensar mais sobre item.)

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Radiohead

Para quem está desesperado, com medo de perder o show mais importante da década, já está rolando de comprar - inteira no site dos moços. Aqui.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Nasce uma nova Caetana

"Você sai pra dançar?
Dentro de mim, lógico.

E fora?
Não. Mas às vezes é legal. "

Ou ainda:

"Acho que o mundo é completamente talvez"

Mais aqui.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Cheio de bateria

Uma conclusão curiosa a que se chega quando se procura instrumentos musicais em sites como mercado livre e balcão: a grande maioria dos vendedores - portanto, uma amostragem confiável dos músicos - fica na Zona Norte, subúrbio e Baixada. A Zona Sul, a considerada mais rica, quase não tem bateristas.

Isso me levantou uma sobrancelha. O que quer dizer: que a Zona Sul não toca música? Não creio. Que a ZS, expoente das novidades, acha a música analógica como do passado? Hum... Duvido. Acredito numa questão mais simplória: a ZS tem mais prédios - portanto não podem suportar som alto.

Acrescentam argumentos à minha tese o fato de eu ter só procurado bateristas, portanto os que mais fazem barulho. Mas posso estar completamente errado e isso ter sido só coincidência momentânea de fatores externos e diversos.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Ancora gli italiani

O ócio me faz pesquisar coisas inúteis, como é perceptível nesta página. Descobri, por isso, a cidade de onde vêm os meus antepassados: Montalto Uffugo, que fica na Calábria. Ou seja, temos a máfia com o nome mais legal: 'Ndrangheta.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Mamma mia

Em "Concorrência desleal", Ettore Scola faz uma piada sobre o modo como os italianos emigraram para outros países. Diz que há mais italianos fora da bota que dentro. Não tenho estatísticas, mas só nos EUA são 20 milhões de descendentes, segundo "Os Sopranos".

A série americana que coloca a máfia no divã, de maneira dramática, tenta fazer um inventário desse personagem imortalizado por, além dos poderosos chefões e dos bons companheiros, pizza e... o que mais? O que é ser italiano hoje em dia? Vale a pena, aliás, ser considerado italiano, ainda hoje, após quase cem anos de imigração?

Entretanto, um dos detalhes da série é mostrar como os ítalo-americanos, para usar uma expressão politicamente correta, são mal vistos, de maneira em geral, pelos norte-americanos - seja lá quem essa minoria represente hoje. Não pertencendo à WASP como a conhecemos, o grupo entra no caldeirão dos excluídos. Durante toda a temporada, eles brincam que nunca haverá um presidente italiano nos EUA. O posto acabou com outra minoria - mas esse é um papo para outro pôr-do-sol.

Por outro lado, o nosso lado, os italianos são extremamente bem-vistos, como os europeus que vieram nos salvar e gentilmente deixaram os seus genes. É incrível a quantidade de sobrenomes com letras duplicadas entre os de classe-média.

De certa forma, para os americanos do norte, isso já é uma forma de identificar os italianos. Basta que o seu sobrenome termine em uma vogal - diz Tony Soprano, o cappo que também chora. Aqui, nem isso.

Aqui, num país que era separado entre casas-grande e senzalas, os italianos vieram para ser a classe-média. Lá, eles formaram o povo americano, ou seja aquela grande classe-média, em que todos tentam se diferenciar uns dos outros vestindo meias de cores diferentes compradas na mesma loja.

Por isso, é importante, para eles, tentarem identificar do que são feitos. Para nós, o melhor é esquecer a pronúncia correta dos nossos nomes. Antes de sermos italianos, ainda temos que aprender a ser brasileiros. Ou, sendo mais radical, esquecermos qualquer limite geográfico.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Vedas

Hino a Agni

1 Eu louvo Agni, o sacerdote escolhido, Deus, ministro do sacrifício,
O Hotar(1), o mais pródigo da riqueza,
2 Mais digno é Agni, agraciado por viver com os profetas antigos.
Ele trará para aqui os Deuses.
3 Com Agni, o homem obtém riqueza, aumentando dia a dia,
O mais rico entre os heróis, glória.
4 Agni, o sacrifício perfeito a qual tu circundas
verdadeiramente vai para os Deuses.
5 Pode Agni, o sábio sacerdote, verdadeiro, a maior glória,
O deus, vir para cá com os Deuses.
6 Qualquer benção, Agni, tu concedes ao teu adorador,
que, Aṅgiras(2), é de fato a tua verdade.
7 Para tu, dispersador da noite, Oh, Agni, dia a dia, com prazer
trazendo tua reverencia, nós viemos
8 Governante dos sacrifícios, guarda da lei eterna, radiante Um,
Aumentando a tua própria moradia.
9 Seja de fácil aproximação, como o pai é para o seu filho:
Agni, esteja conosco para a nossa riqueza.


(1) aquele cuja função era invocar os deuses.
(2) Angiras é o nome de um rishi dos Vedas (ou sábio).
Para saber mais sobre Agni.
Para ler outros hinos, em inglês.
Traduzi "wealth" do inglês para "riqueza", mas o sentido obviamente não é o material.

domingo, 9 de novembro de 2008

frente para trás De

Mexer com a estrutura narrativa de um produto audiovisual é algo que me interessa. Lembro do Gondry e seu clipe genial para a dupla japa-americana Cibo Matto, e do "Memento", do Chris Nolan, que depois faria "Batman begins". Já tinham me falado desse "Palíndromo", do Barcinski, que já até dirigiu um longa. Mas nunca tinha visto. É interessante - principalmente os diálogos.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Temporada de trocadilhos

Com a eleição de Obama, Paes e a agressão de Dado em Luana, estamos em uma temporada de trocadilhos. O melhor, claro, foi a manchete do "Meia hora" sobre os dois atorezinhos: "Luana não tem mais (foto do ator) em casa". Genial. Escutei dois outros: "Cesar pede a Paes (acrescente qualquer coisa)". E "Obama ou odeia". Faça o seu.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Cover

"É instigante pensar as motivações que levam o sujeito a gravar músicas dos outros e jogar no YouTube. Mas não acho mesmo que seja para se fazer conhecer. Sei lá o motivo real. Num primeiro momento, parece ser a razão pela qual tantos postam vídeos sobre qualquer coisa; claro, também não sei por que se faz isso. Acho que qualquer previsão é um chute tremendo."

Daqui.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

O cara do TimFest



Um camarada meu conseguiu tirar uma foto com o sujeito mais figura do Tim Festival: o Har Mar Superstar.

Mais informações sobre a apresentação do sujeito, leia aqui.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Chame o síndico

"Custou-me alguns dias para retomar a agenda política após inesperado revés eleitoral, motivado, em grande parte, por ações ilegítimas de setores da imprensa e de institutos de pesquisa os quais, além de repugnarem a consciência democrática do povo carioca, se prestaram à pratica de atos de mediocridade moral e intelectual incompatíveis com o padrão cultural do nosso povo."

Adivinha quem anunciando apoio a quem.

sábado, 11 de outubro de 2008

Questão de gosto

Não é pedantismo, mas acho que tenho bom gosto - seja lá o que isso queira dizer. Não é pedantismo porque não quero mostrar para os outros a única coisa boa a se gostar. Longe de mim. E, agora pensando, concluo que, talvez, todas as pessoas tenham bom gosto - para elas mesmas.

Dito isto, tenho a acrescentar: e quando se lê algo próprio que não ficou bom, que não agradou? Saber que quem escreveu aquilo não consegue fazer melhor é um pouco deprimente. Me agarro na idéia que o importante é apenas escrever. O que dá prazer é escrever, repito como um mantra. Mas seria dispensável o leitor? A essa questão, não sei a resposta.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Braço sem palmar

"Quando lhe perguntei como ele conseguia ser tão bom no braço sem palmar, a resposta foi: 'Porque eu gosto de fazer braço sem palmar'. Dificilmente vou conseguir explicar a grandeza metafísica dessa resposta para quem não a identificou de cara."

Simplicidade deveria ser o sobrenome desse cara. Profundidade, o segundo nome.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Fight the power

"O desafio do direito autoral hoje é lidar como uma economia híbrida. A nossa legislação de direito autoral, tal qual a maior parte da legislação em todo o mundo, dá guarda a um tipo de modelo de negócio específico. Trata-se do modelo em que os autores cedem todos os seus direitos para um intermediário (uma gravadora, editora, etc.). Esse modelo continua a existir, mas com a tecnologia, vários outros tornaram-se possíveis. Apesar disso a lei não mudou e não reconhece esses outros modelos que dependem não só da exclusividade mas também do compartilhamento. Nesse sentido, uma boa lei de direitos autorais seria aquela que conjugasse de forma equilibrada a exclusividade, quando necessária, com o compartilhamento, reconhecendo a importância econômica e dando proteção legal também a este."

Por isso que eu gosto das idéias do meu xará Ronaldo Lemos. A entrevista está aqui.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Medo

Recebemos dois amigos ingleses neste fim de semana. Por coincidência - ou não - vimos dois filmes brasileiros: "Tropa de elite" e "Cidade dos homens". Ambos com muitos tiros, violência e gente pobre morrendo. Eles gostaram dos filmes.

No domingo, de manhã, tentamos explicar como está na nossa eleição e o poder que a Universal e o Crivella exercem sobre grande parte da população. Eles ficaram com muito medo.

domingo, 7 de setembro de 2008

Fugaz

Na Rua Jardim Botânico, havia uma loja de roupas cujo muro era ilustrado por duas pinturas de mulheres. A primeira tinha os cabelos esvoaçantes e a segunda usava um vestido que imitava tijolos. Ambas tinham traços que me encantavam pela simplicidade e delicadeza, além de serem sensuais. Aproveitavam bem o espaço urbano, tinham uma ginga, eram melífluas, sedutoras, calmas e tranqüilas.

Foram cobertas, esta semana, por uma camada de tinta branca, que logo recebeu desenhos de uns bichinhos. A loja de roupas se transformou em uma veterinária. Ou em uma pet shop, como se diz em português. Ainda não consegui reparar nos novos habitantes do muro, mas admito que, mesmo que gostasse bastante das antigas imagens, não fiquei triste com a mudança.

A arte das ruas é a maior representante do nosso tempo histórico. E a sua fugacidade só mostra como vivemos no hoje-em-dia. Somente lembramos de alguns detalhes do todo. Somos especialistas em nada. Ou melhor, em generalizações. Acumulamos informações inócuas, umas sobre as outras, como delle lasagne, e sentimos o gosto só do molho. A massa fica escondida.

Já vou esquecendo os traços de uma das mulheres do muro.

ps. Achei o rapaz.
E tenho que fazer uma correção: a loja sempre foi - ou já era há muito tempo - uma loja para bichos. Como se vê aqui.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

War

Pela internet

Navegando por aí, encontro algumas pérolas:

"Ser um tímido notório é uma contradição. O tímido tem horror a ser notado, quanto mais a ser notório. Se ficou notório por ser tímido, então tem que se explicar. Afinal, que retumbante timidez é essa, que atrai tanta atenção? Se ficou notório apesar de ser tímido, talvez estivesse se enganando junto com os outros e sua timidez seja apenas um estratagema para ser notado. Tão secreto que nem ele sabe. É como no paradoxo psicanalítico, só alguém que se acha muito superior procura o analista para tratar um complexo de inferioridade, porque só ele acha que se sentir inferior é doença." Dele.

"Ao observar a discreta cobertura dada até aqui à passagem de Wim Wenders pelo Brasil (em comparação com a euforia provocada há alguns dias por David Lynch), não pude evitar um pensamento cruel: o cineasta alemão tornou-se uma espécie de Ronaldinho Gaúcho do cinema. Um sujeito que brilhou intensamente no passado, que teima em nos decepcionar no presente e que decidiu viver meio que a passeio." Do Calil, em novo endereço.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Olimpíadas

Dividindo pensamentos sobre o quadro de medalhas:

O Reino Unido ficou em quarto. Em 2012, vai ficar, mole, em terceiro.

A Coréia do Sul ficou na frente do Japão. Impressionante.

A Grécia não teve nenhuma medalha de ouro. Estranho.

Três potências do atletismo, como sempre, só ganharam medalhas na modalidade: Jamaica, Quênia e Etiópia.

Achei a participação do Brasil boa, não ótima. Poderia ser melhor, claro. Só pensar nos nossos favoritos que não ganharam nada. Mas achei 15 medalhas - e aqui penso no sentido de crescimento esportivo como um todo - um resultado bom.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Por uma vida menos ordinária

Um camarada meu, de outros tempos, me pediu para escrever a orelha de seu livro. Que louco, pensei, pedindo a mim para fazer um dos textos mais importantes de apresentação. Só tenho a dizer que foi uma honra. O mínimo que posso fazer é retribuir por aqui. A divulgação não é exatamente para uma multidão, aliás, muitíssimo pelo contrário. Mas vai que um desavisado aparece por aqui? Deixo perdido o link, então.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Olímpicas

Robson diz que brasileiro não gosta de esporte, quando muito, vê futebol e gosta mesmo é de ganhar. Creio que generalizações são complicadas de comprovar, mas, de qualquer maneira, dá para pensar em algo parecido no meio dessa olimpíada. É comum ouvir as pessoas reclamarem que estamos abaixo de países com pouca ou nenhuma tradição esportiva no quadro de medalhas. Como se isso fosse realmente importante.

Olimpíadas não valem para ver o seu país ganhar uma partida de futebol. Elas existem para mostrar o que de mais impressionante o gênero humano produziu até aquele momento, em todas as suas modalidades. Descobrir o mais rápido, o mais forte e o que salta mais longe - como defende o lema. É ver um jogo de pingue-pongue entre um norte-coreano e um chinês e achar ótimo. É ver hóquei sobre a grama de holandesas e argentinas. É conferir equitação, tiro com arco, pólo aquático. É apreciar a superação, os suores, as lágrimas, as compensações, as frustrações, as alegrias e tristezas, as belezas e as feiúras, o que há de melhor e o que há de pior na raça humana.

Mesmo que o lema do barão tenha sido deixado para trás há cem anos e que o amadorismo seja apenas uma lembrança ingênua, o prazer de uma Olimpíada vale o dobro - no mínimo - de uma copa do mundo. Só para ficar no exemplo mais boboca.

Coincidências

Coincidências históricas não provam nada e você pode criar qualquer teoria fazendo paralelos entre dois tempos e duas potências. Mas não deixa de ser intrigante - e assustador - pensar que o último país que fez uma olimpíada com a intenção de provar uma superioridade (racial, hegemônica, etc.), está crescendo economicamente de maneira assustadora, principalmente com dinheiro americano, e que, além disso tudo, vive sob uma ditadura, com todos os seus contras implícitos, como a falta de liberdade generalizada, antes da China foi a Alemanha Nazista.

A diferença primordial talvez seja a figura do ditador, vivíssimo na presença de Hitler, em 1932, e uma sombra virtual, que aparece em frente à cidade proibida no caso de Mao.

Isso não prova nada, mas, de qualquer maneira, deixo escrito que espero que, daqui a sete anos, nenhum país seja invadido pelo exército vermelho. Mas se for, pelo menos temos no Brasil o consolo que a nossa Copa do Mundo já teria passado.

sábado, 16 de agosto de 2008

Centésimos

Pequim não é a primeira olimpíada do Oriente em que um americano chega tentando bater o recorde do Mark Spitz de medalhas de ouro. Em 1988, em Seul, Matt Biondi era o cara. Menos versátil que Phelps, nadava "apenas" os 50m, 100m livre e 200m livre, além dos revezamentos. E os 100m borboleta. Sua primeira prova.

Ele vinha de algumas derrotas em provas nos EUA contra um surinamês moreno chamado Anthony Nesty. Na prova, Biondi sai na frente, sem dar margem para o adversário. Mas, ao alcançar o T final da piscina, o americano ondula, estica os braços e encosta na borda, marcando 53'01. O adversário crava 53'. No T, com quase um antebraço de desvantagem - uma eternidade - ele dá uma segunda braçada curta e rápida. O sonho das sete medalhas de Biondi já tinham acabado antes mesmo de começar.

Depois, ele ainda viria perder os 200m livre para o australiano Duncan Armstrong, zebríssima para a prova. Entretanto, achava Biondi um dos melhores nadadores de todos os tempos, talvez até maior que Spitz, em considerando as diferentes épocas.

E, então, veio Pequim. E Phelps devolve a derrota por um centésimo, na mesma prova, na sua sétima medalha de ouro. E dizem que coincidência não existe...

ps. E o Cesão? Além de tudo, fica a dois centésimos do recorde mundial. Impressionante.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Flagrantes


Estacionamento proibido em frente ao meu prédio.



Fila tripla, na esquina da minha casa.

E o grand finale:

A fila quádrupla.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Por que torço por Phelps

Ele é americano, logo, normalmente recebe minha antipatia gratuita. Nada as principais provas de dois dos nadadores brasileiros. E é franco favorito para tudo o que entra, portanto os adversários receberiam as minhas atenções em condições normais. Mas a questão é que torço para Phelps na sua tentativa de chegar aos oito ouros.

O principal motivo é de ordem anti-saudosita: não agüento mais as comparações com Mark Spitz. Sei que começará, agora, as comparações com o próprio Phelps. Isso quer dizer que já começarei a torcer por quem quer que seja que tente quebrar a barreira dos oito ouros - caso Phelps consiga, claro.

Mas Phelps é um garoto que parece do bem. É norte-americano do tipo inofensivo. Diferentemente de Spitz. Minha mãe sempre dizia que, em 1968, o americano chegou afirmando que levaria sete medalhas e entraria para a História. Ganhou duas, apenas em revezamento. Apenas quatro anos depois, de bico fechado, é que levou as douradas.

O nadador de 23 anos é um atleta moldado para ser fora-de-série. Provavelmente, seria finalista de qualquer prova que disputasse. Concorreria a medalhas em 75% delas. Mas o mais impressionante, na minha humilde opinião, é que, além de ganhar as provas, Phelps está batendo todos os recordes mundiais. Exatamente o que Spitz fez em 1972.

Porque ganhar sete medalhas de ouro pode ser sorte. Uma safra ruim poderia deixar um sujeito "apenas" acima da média com essas medalhas. Lembre de 1996 e os seus tempos ridículos - com a exceção honrosa dos 100 m livre. Mas, ao bater os recordes, Phelps e Spitz mostram que são o que melhor se produziu até aquele momento na natação. E, como disse Kobe Bryant, eu gosto de presenciar os melhores,

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Recorde (para sempre)

Você tem a responsabilidade de fechar um revezamento. O revezamento é o 4x100 m livre. Sua equipe é os EUA, que não ganham tal prova desde 1996. Você é considerado um amarelão por jornalistas de seu país. O seu rival direto é o francês que até dois minutos atrás era o recordista da prova. Ele está em vantagem de um corpo.

Jason Lezak, não sabendo que era impossível, foi lá e cravou 46'06. O resto é história.

ps. Phelps, correndo atrás das suas medalhas, agradece.
ps. 2 Cesão terá um problemão no 100 m livre. Vários caras nadaram abaixo de 48'.

sábado, 2 de agosto de 2008

Editora

Tudo bem que eu não tenho leitores, mas não custa nada fazer uma propaganda a mais na rede. Será como aquelas placas publicitárias que ficam em postos de gasolina a beira da estrada no meio do deserto. Geralmente servem como referência para um viajante perdido. Por isso, cabe dizer que os meus camaradas da Multifoco lançaram há mais de meses um espaço que chamam de cultural - eu apelido de vital.

Onde, além de montarem o escritório, tem um café-que-se-transforma-em-bar com cervejas, que fogem dos clichês - como um Erdinger ou uma Paulaner -, um segundo andar onde se faz festa, como a Curinga (Leia sobre aqui, escute o que toca aqui e cadastre-se para descontos aqui), também de amigos, e, o mais importante, um ponto de venda dos livros.

Assim, quem quiser folhear, além de comprar, pode ir à Avenida Mem de Sá 126, na Lapa.

ps. Dia 8 próximo, também conhecido como sexta que vem, outra festa Curinga, comandada por Alexandre, Paulo e Bamba, rola no mesmo bat-lugar.

quinta-feira, 31 de julho de 2008

Assobiando

Começo a ficar preocupado com a minha saúde mental. Agora, após Anathallo (aliás, cabe uma "correção": o grupo de post-rock que eles mais se parecem não é Sigur Rós ou Explosion in the Sky, mas Tortoise, com o seus multi-homens), cismei com um sujeito chamado Andrew Bird.

Também multiinstrumentista, como Sufjan Stevens - olha ele aí - e nascido em Chicago, no estado americano de Illinois, que inspirou o álbum mais aclamado de mr. Stevens, Bird pousou no meu computador através das sugestões do last.fm - grande site - como artista parecido desse aí citado.

Sim, ele tem um pé no folk, é um desses sujeitos que fazem tudo na banda, assim também como Stevens, mas seu estilo é menos viajante, mais pé no chão. Sem, entretanto, de vez em quando, fazer sons viajantes, como a última faixa ("Yawny at the apocalipse") de seu último disco ("Armchair Apocrypha"), que parece ter uma baleia cantando.

Leio no wikipedia que o moço se formou na faculdade de música, tocando violino. Ou seja, não é um qualquer. Mas saber música não quer dizer fazer algo legal-divertido. E ele, além de não ser complicado, faz música para assobiar:

terça-feira, 29 de julho de 2008

Renascido

Misture Arcade Fire com Sufjan Stevens e acrescente um pouco de post-rock, da vertente Sigur Rós ou Explosion in the Sky. Sirva pela manhã. Os sete garotos que formaram o Anathallo (diz o Wikipedia que vem do grego "renascer", numa tradução livre da tradução) em Mt. Pleasant, Michigan (por acaso a terra de mr. Stevens), mereceram a minha atenção imediata quando os escutei pela primeira vez. Algo raro hoje em dia.

Conseguem fazer um som peso-pluma, que tende a crescer, sempre com uma melodia lindíssima. Usam de vocais trabalhados, instrumentos inusitados e, diz a lenda, ao vivo, são impressionantes.



O septeto tem três discos lançados, e alguns outros EPs. Toda a minha empolgação é só por causa do último, "Floating World", que usa histórias da mitologia japonesa como matéria-prima para as letras. Assim como Stevens usava as histórias dos estados de Michigan e de Illinois, em dois de seus trabalhos mais aclamados.

Mas não pense, apesar da similaridades e da utilização de instrumentos variados, que eles tocam rock progressivo. Claro que se pode comparar, assim como se compara Mogway ou mesmo Radiohead. Mas, hoje em dia, em tempos que o rock acabou faz 15 anos e tudo o que aparece parece chupado de algo com três acordes e nenhum neurônio ou vontade verdadeira, uma música um pouquinho mais trabalhada, sem perder o punch para isso, e ainda utilizando a formação de uma banda de rock é um alento.

sábado, 26 de julho de 2008

Sem sustos

Infelizmente não me assombro com algo que tenha lido há muitos anos. Posso ter ficado impressionado, ter gostado e até achado legal alguns livros, mas a maioria é chata. Abandono no meu do caminho. Talvez o problema seja comigo.

Para tirar um pouco o peso das minhas costas, vi dois amigos meus dizendo que o mesmo acontece com eles com música e cinema - uma arte para cada pessoa. Acham tudo monótono, repetitivo, contando a mesma história de há cinqüenta gerações.

Talvez, com a idade, as novidades vão se escasseando. Ou simplesmente ficamos mais chatos. Infelizmente.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Além da 'Comida'

A milícia consegue o seu dinheiro vendendo suposta proteção para moradores das áreas pobres da Zona Oeste. Ou seja, lidam com um bem público, como a segurança, de maneira privada - fazendo com que as pessoas não tenham em quem confiar.

E demonstrando que, mais que um problema que se deve atacar a conseqüência - a milícia em si -, deve-se cobrar atitudes contra a causa - a falta de policiamento adequado, que traria paz à galera dali, que não deixaria ter traficante na região, que prendesse os ladrões... Enfim.

Os paramilitares arranjam grana controlando a máfia das vans piratas. O que também é a intervenção direta no domínio do estado. Se o município fosse mais cuidadoso com as pessoas que moram longe dos centro urbanos, dando ônibus decente, trem razoável e metrô de qualquer tipo, não teria como haver tanta Kombi caindo aos pedaços na área cobrando dos real para levar gente de Sepetiba a Campo Grande. A prefeitura encara o serviço público - transporte - como uma disputa privada - só as áreas ricas têm linhas suficientes (e até mais que o necessário, muitas vezes).

Outro braço da milícia que poderia ser facilmente desarticulado, sem um único tiro, apenas com investimento estatal, é o gás. Os milicianos também controlam a venda dos botijões, tascando um ágio no preço do distribuidor. Se a empresa que controla esse serviço investisse em levar o encanamento às áreas pobres... o resto você pode imaginar. Se não rolasse, que pelo menos organizasse a venda dos botijões mesmo. Mas não. Os milicianos que tomam conta.

Entretanto, o lucro maior da milícia, segundo um amigo meu que, além de fotógrafo de crianças, estuda o assunto violência, é o gatonet. Para quem não tem idéia do que é isso, uma explicação boboca e rápida: a pirataria do sinal de internet e TV a cabo de uma determinada empresa, cujo nome não precisamos repetir. Taí um serviço que não é público.

O "desvio" desse serviço é até curioso, porque - diretamente - ninguém sai perdendo, além da própria companhia. Pelo contrário, os moradores geralmente têm o mesmo serviço que os da Zona Sul e pagam apenas um terço por ele. A empresa em si também não perde nada - novamente: diretamente -, mas deixa de ganhar. O seu serviço não é atrapalhado, nem ela deixa de atender alguém porque o seu sinal está sendo multiplicado. Ou seja, é quase uma pirataria inócua - assim como o download de músicas, filmes etc.

Só não vou escrever que o ato de popularizar o acesso à internet e ao conteúdo diferenciado dos canais pagos é até interessante porque vão dizer que estou fazendo apologia - muito pelo contrário, sou 100% contra a milícia. E, ainda por cima, aqui em casa, nem temos TV por assinatura. Mas que a questão lembra a letra de "Comida", do Titãs, não tem como negar.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Teste

Copacabana é um bairro curioso. Talvez o mais sui generis de todos. Provavelmente uma espécie de metonímia da cidade. As antíteses, já evidentes no restante da urbe, aqui se aproximam do paradoxo. O abandono hiperbólico pelas ruas, com milhares de mendigos sobrevivendo dos restos da sociedade, convivendo com a grande parte dos turistas que aporta na Zona Sul. São os prédios com centenas de apartamentos pleonásticos, vítimas da especulação imobiliária, e a Atlântica que recebe livre a brisa da manhã. As calçadas lotadas de vendedores informais e as grifes caríssimas ao lado dos hotéis com várias estrelas. Os meninos de rua e as madames que andam, lado a lado, eufemisticamente, sem reparar uns nas outras, pelo calçadão. É aquela areia que parece que não acaba, sitiada, dividida entre figuras das mais diferentes estirpes. São as putas presas na praia, à noite, e as babás com seus bebês, da manhã. Copacabana é o microcosmo que reflete e antecipa o restante do Rio. Os engarrafamentos da Rio Branco na Barata Ribeiro. A praia de Ipanema, prima-irmã, que é menor e menos bonita. Os dois fortes que são mirantes tal qual o do Leblon e que foram construídos para a proteção da praia. É a população que vem da Zona Norte, da Baixada, dos subúrbios, do Nordeste, de todos os lugares. Copacabana é o Rio em menor escala, ou, como já disseram, o Rio é uma grande Copacabana.

domingo, 20 de julho de 2008

Faça a coisa certa

"Em protesto contra a morte do motoboy, por volta das 9h de sábado (19), os moradores do Morro Azul depredaram uma agência do banco HSBC, incendiaram lixeiras, pneus, móveis, barracas de camelôs e ainda danificaram ao menos quatro carros, dentre eles um veículo da Polícia Militar. A rua chegou a ser fechada pelos policiais por algumas horas até o início da madrugada de domingo."

No Flamengo. Chamem o Spike Lee.

sábado, 19 de julho de 2008

Ligações ocultas

"You may be interested to know that global warming, earthquakes, hurricanes, and other natural disasters are a direct effect of the shrinking numbers of Pirates since the 1800s. For your interest, I have included a graph of the approximate number of pirates versus the average global temperature over the last 200 years. As you can see, there is a statistically significant inverse relationship between pirates and global temperature."

Gostei desse cara.

quinta-feira, 17 de julho de 2008

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Puritano

Além de me corrigir nos momentos mais inoportunos e de me sugerir não iniciar as frases com o pronome oblíquo, mesmo após o célebre "me dá um cigarro", o word não aceita eu incluir palavras de baixo calão, como "merda" ou "puto". Detalhe, ambas estão dicionarizadas no Aurélio.

domingo, 13 de julho de 2008

Entre mim e você

O altruísmo não existe. (Optei por começar esse pensamento com uma afirmação simples, em vez de fazer uma pergunta que apenas tiraria a negativa e tascaria uma interrogação ao fim da frase. Mas a questão continua. Obviamente cada um tem a sua opinião sobre o assunto, e eu só quis criar uma polêmica - ou simplesmente não seja fã de começar um texto com uma pergunta, como categoricamente me disse um amigo meu. Isso não importa e só demonstra que fiz esse parágrafo como nariz-de-cera).

Não foi Nietzsche quem disse que somos apenas egoístas? Bem, se não disse, o bigodudo deve ter pensado. É bem a cara do filósofo mais destruidor dos últimos séculos dizer que até os gestos mais bondosos, em que, em tese, fazemos em prol dos demais, o fazemos apenas para inflar, mesmo que intimamento, o nosso ego.

Claro que esse raciocínio tem via dupla - e por isso a escolha da frase inicial é aleatória, como expliquei no primeiro parágrafo. Ou seja, mesmo quando age simplesmente em prol de si mesmo, ele pode argumentar, filosoficamente, que estava agindo para tentar diminuir o ego do outro, ou que qualquer ajuda seria demonstrar como ele próprio se sente superior ao outro, ou ainda que ele não se sente capaz de auxiliar ninguém em nada.

A questão, provavelmente, é outra. Seria tão ruim o egoismo? Se o altruísmo não existe mesmo, como proposto aleatoriamente no início do texto, todas ações seriam egoísticas, ou seja, feitas sempre em prol de si mesmo. Bastaria a nós tentar diferenciar cada uma delas e separá-las em três grupos, as inócuas, as produtivas e as venenosas.

Mas, diferente do que foi dito até agora, proponho que o altruísmo exista, sim, mas apenas como utopia. Aconteceria quando alguém agisse sem pensar nas conseqüências de suas atitudes, sem imaginar ou esperar um bem das próprias ações. Ou seja, quando alguém é inocente, no sentido que a palavra tem de "não contaminado". Algo que só as crianças - de todas as idades - seriam capazes. Por isso a "utopia".

Dá para montar um esquema em que as atitudes são divididas em (a) impulso inicial, (b) ato em si, (c) conseqüência. (b) geralmente não muda, é um produto de (a) com (c). Se agirmos sem pensar em (c), estamos sendo altruístas. Mas para interromper essa história, porque isso daria um artigo enorme, fica uma pergunta: e quem é que consegue fazer isso?

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Sem parar

"It's sort of bittersweet for me because I've made my fifth Olympic team, but I'm going to be away from my daughter for a month and that's really hard emotionally. But I'm happy to be going to Beijing", said Dara Torres, 41.


quinta-feira, 26 de junho de 2008

Três mundos

Vendo "Do outro lado", filme do diretor alemão-turco Fatih Akin, sentimos como somos parecidos com a Turquia: preconceituosos, burocráticos, pobres e violentos - entre diversos outros detalhes. Já a Alemanha, também retratada no filme, bem, a Alemanha é a Alemanha, não precisa dizer muito mais. Organização e limpeza devem ser o sobrenome da república.

Em determinado momento do longa, um alemão-turco (uma espécie de retrato do diretor que sugere a pergunta: qual é a nacionalidade de um filho de pais turcos nascido na Alemanha?) vai (volta?) a Instambul, para ajudar uma personagem turca. Mas os policiais que a identificam sugerem, por motivos que só ficam claros muito depois, que ele ajude as crianças curdas, normalmente analfabetas, que vivem nas ruas da cidade.

O que me leva a pensar que, novamente, estamos vivendo uma divisão em três mundos, com o Brasil, obviamente, se localizando no segundo lugar.

Os brasileiros não passamos fome, como acontece com países da África subsaariana, mas continuamos com problemas que a Europa Ocidental resolveu há décadas, talvez séculos, como a universalização do ensino.

Temos indústria pesada, que gera lucros exorbitantes, e poluição idem. Enquanto isso, os japoneses desenvolvem projetos de nanotecnologia e os curdos não têm nem um país para chamar de seu.

Imigramos ilegalmente para EUA, Portugal, Inglaterra, como boa parte da América Latina e recebemos bolivianos, que estão criando uma colônia em São Paulo.

Enquanto isso, a União Européia dificulta a entrada da Turquia para o clubinho, o que poderia ajudar a alavancar a economia turca e também provocar um imigração em massa para a Alemanha e outros países. Curiosamente foram os alemães a "convidar" os turcos, ainda no início do século xx, para ajudar a reconstruir o país, trabalhando em áreas de mão-de-obra pouco qualificada. Abriram a porteira.

Os turcos são a personificação do estrangeiro errado na Alemanha, um dos países mais liberais que há, sem considerar os nórdicos, claro. São os argelinos da França, os latino-americanos na Espanha.

E ainda têm que aguentar a derrota da sua seleção - que tem dois alemães-turcos - para a adversária.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Estatística do medo

O Rio não está nem entre as 200 cidades mais violentas, se considerarmos a taxa número de homicídios por habitantes. Entretanto, como qualquer número, esse não demonstra toda a realidade.

Semana passada, o ator Lázaro Ramos escreveu uma carta para um jornal de Salvador falando que as pessoas lá acham que "tá ficando que nem o Rio". Provavelmente, na estatística, o Rio é menos violento que Salvador, mas as pessoas têm uma percepção diferente.

E o que vale, no fim das contas, é a percepção, que não tem como ser mensurada. Se vc perguntar a qualquer pessoa qual é a cidade mais violenta do Brasil, o Rio chega na frente.

Claro que isso é fruto de uma série de desinformações, tais como a ignorância dos dados estatísticos, a não propagação desse tipo de notícia, a cultura do medo, a espiral da violência como fato jornalístico e por último, mas não menos importante, a presença da periferia carioca dentro das suas áreas ricas.

Mas, independentemente de quaisquer fatores, a verdade é que o carioca se sente mais inseguro que um sujeito que mora, por exemplo, em Nova Iguaçu. Para isso, há outros fatores, como a síndrome do peixe-piloto, como diz um amigo meu. Como esse peixe, que vive ao lado dos tubarões para se alimentar das migalhas que escorrem pela sua bocarra, os lugares onde há mais riqueza atraem mais pessoas pobres, que vivem dos subempregos, da subserviência e de outros subs.

Isso faz com que a percepção dos "formadores de opinião", a.k.a. "classe média", que de média não tem nada, seja de perigo constante e iminente. Qual é a verdade, nesse caso? Adianta saber que temos menos, muito menos, homicídios proporcionalmente que qualquer cidadezinha pequena rural, em que haja disputas de terras? Não muito. Portanto, esses dados estatísticos não servem para dar o grau de segurança de um lugar - nem, talvez, de violência, já que medem um dos tipos de crime.

Para mensurar essa percepção, talvez fosse necessário criar um outro tipo de indicativo, mais qualitativo. Assim como fazem as grandes empresas quando querem avaliar a receptividade de um determinado produto. Mas isso seria muito mais caro.

E, talvez, fosse necessário os poderes públicos e privados mostrarem mais como funciona esse tipo de pesquisa apenas para deixar os cidadãos mais tranqüilos em relação ao lugar onde vivem.

terça-feira, 17 de junho de 2008

Provi

A história da morte dos três garotos do Morro da Providência só piorou de sábado para domingo. A primeira informação era: os jovens tinham sumido. Os moradores acusavam os militares. Já era ruim a desconfiança cair sobre o Exército. Nota oficial da força armada negou envolvimento e disse que tinham liberado os três, após revista. Protesto, ônibus queimados, tiroteio, empurra-empurra, violência.

No dia seguinte, a partir da tarde, o caldo foi azedando aos poucos. Primeiro acharam os três corpos jogados num lixão em Caxias. Em seguida, mais protesto, passeata, acusações, confusão e, novamente, violência. Ou seja, os militares tinham, certamente, ligação com, não um desaparecimento momentâneo, i.e., seqüestro, mas com a morte de três caras que tinham menos que a minha idade.

À noite, a pior notícia – para os militares, porque, para todos, a pior havia sido ter encontrado o corpo deles em um lixão. A tropa levou os meninos para a Mineira, cujos traficantes são rivais dos da Providência. Ou seja, além de seqüestro, homicídio, ligação com traficantes de drogas. (Também vale ressaltar a irracionalidade dos traficantes que se matam – com requintes de crueldade - apenas porque são de outro endereço. Algo só comparável a idiotice das guerras entre torcidas organizadas – muitas vezes do mesmo time!)

Na segunda, se descobriu que os sujeitos foram torturados, tiveram – dois deles – as mãos cortadas fora e o outro, a perna. E, então, chegamos ao fundo de uma história triste, muito triste. Não sem antes ter mais protesto em frente ao quartel general do Exército, tiros, bombas, fogo, pedras, violência

O assunto chocou muitas pessoas, e de diferentes classes sociais, por motivos variados e que fogem da obviedade. Os garotos, dois com alguma passagem na polícia, um terceiro, com familiares envolvidos com o tráfico de drogas, foram levados pelos militares a um capitão por terem desacatado a tropa. O oficial disse que deveriam soltá-los. Mas o tenente não aceitou as ordens superiores e decidiu, by his own, aplicar uma lição nos garotos. Encontramos outro problema: a insubordinação.

Se coloquei no parágrafo que eles não eram santos, foi para deixar claro que, nem se eles tivessem cometido o pior dos crimes – pensem em algo escabroso – a atitude dos militares deveria ser essa. Primeiro pela ilegalidade – óbvia – segundo pela crueldade.

Mas a questão chocou a classe média simplesmente porque, órfãos da ditadura, ainda acreditavam que os militares, e o Exército é a arma mais representativa das três, seriam a última alternativa para resolver o problema da insegurança pública. Como se pensassem, "quando os militares tomarem os morros, tudo vai funcionar". Ou, "quero ver os traficantes encararem o Exército".

Agora a ilusão de que as fardas são a salvação terminou. Descobrimos que os militares são tão ruins e cruéis como qualquer outro funcionário da segurança pública que vive nas ruas, em contato com traficantes, milicianos, bicheiros e outras corporações ilegais.

Além de percebermos que compartilhamos da culpa no episódio da tortura e da morte dos três rapazes ao apoiar ou desejar que os militares combatessem o tráfico nos morros (ou seja, bem longe "da gente"), nos sentimos sem hipóteses para resolver o problema da criminalidade. Como se tivéssemos jogado nossa última carta. Estamos, agora, sozinhos e sem esperança alguma. Sobrou apenas o pessimismo.

domingo, 8 de junho de 2008

Europeus pré-colombianos na américa

Curiosidades:

http://en.wikipedia.org/wiki/Newfoundland_%28island%29

http://en.wikipedia.org/wiki/John_Cabot

http://en.wikipedia.org/wiki/Hy-Brazil

e em espanhol:

"Otras teorías sostienen que Colón había oído, por
habladurías de marinos, de la existencia de tierras mucho más cercanas
a Europa de lo que se suponía científicamente que estaba Asia y que
emprendió la tarea de alcanzarla para comerciar sin depender de Génova
ni de Portugal.

Específicamente, la teoría del prenauta sugiere que durante el tiempo
que Colón pasó en las islas portuguesas del Atlántico, se hizo cargo
de un marino portugués o español moribundo cuya carabela había sido
arrastrada desde el golfo de Guinea hasta el Caribe por las
corrientes. Para algunos investigadores podría tratarse de Alonso
Sánchez de Huelva. Esta teoría sugiere que el prenauta le confió a
Colón el secreto. La prueba más contundente a favor de esta teoría son
las Capitulaciones de Santa Fe, ya que hablan de las tierras
"descubiertas" al tiempo que otorgan a Colón una serie de privilegios
no otorgados hasta entonces a nadie. [cita requerida]

Aunque es sabido que los siberianos habían llegado a América en el
Pleistoceno, y que lo mismo hicieron los vikingos cerca del siglo XI,
es a partir de los viajes de Colón y otros exploradores y
conquistadores que lo sucedieron cuando se establecieron vínculos
permanentes y puede hablar de descubrimiento, al tener reconocimiento
de las naciones implicadas y testimonios contrastables en la época."

Daqui.

ps.: Leif Eriksson

Tchurma

"Colombo e la sua ciurma furono accolti con grande cortesia e condiscendenza dai Taino, la tribù abitante dell'isola."

Depois dizem que inventamos alguma coisa. Daqui.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Alho e cebola

Em certo momento de "Estômago", de Marcos Jorge, o personagem Raymundo Nonato (João Miguel), na cadeia, diz para o dono do pedaço que basta trazer alho, cebola, pimenta do reino e um pouco de alecrim para resolver qualquer tipo de prato, não importava qual.

Ao sair, fiquei pensando que, antes de serem condimentos ou ingredientes, o alho e a cebola, principalmente, são condições para se cozinhar no Ocidente. Praticamente não há um prato em que, pelo menos um deles, não se encontra escondido ou à mostra. Você pode ter preferências, ou não gostar de um deles, mas é improvável que, morando da Europa para cá, não tenha comido, na vida, uma vez, pelo menos, os dois.

Com essa, me despeço por um mês, quando vou provar as variações peruanas e colombianas dos ingredientes.

domingo, 27 de abril de 2008

O efeito "maneiro"

Seguindo a linha do texto anterior, e cortando uma bola já levantada, vou iniciar com um lugar-comum, só para esquentar: o que seria arte, em qualquer formato? Respondo, sem rodeios, hoje em dia, é aquilo que, ao ver / ouvir / ter acesso o interlocutor tem que falar "maneiro". O que é algo "maneiro"? Não sei, mas a impressão, a sensação, o que a arte transmite, ou deveria transmitir, é exatamente essa. De algo "maneiro".

É fútil, é bobo, simplista e infantil. Exatamente como a nossa época.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

As coisas simples

(Vou começar esse texto com uma frase bem clichê, mas que, com o decorrer, vai ter o seu motivo desvendado) Para que serve a arte e a literatura? Vários filósofos já discutiram esta razão, e obviamente não há uma conclusão universal. Há várias possibilidades, tantas que você pode se agarrar a uma para chamar de sua.

Como sempre cito Schopenhauer (aliás sonhei que haveria uma série de TV ambientada numa escola para criança chamada "Schopenhauer". Que viagem), farei dele a idéia que permeia esse texto. Muito resumidamente e numa interpretação pra lá de pessoal, arte (literatura, música, pintura...) seria a única coisa importante do mundo. O motivo pelo qual vivemos, já que não haveria nenhuma outra razão - não à toa chamam o alemão nascido no território da atual Polônia de pessimista.

A arte seria a maneira genuína de ligar nossa intuição e ativar nossa emoção. Viver para a arte e pela arte, portanto, seria o único modo de encarar a vida. Enfim.

Entretanto, temos outro problema, e outra pergunta clichê: o que seria arte, então? Seguindo o raciocínio de Schopenhauer, aquilo que nos desperta a intuição e ativa a nossa emoção. Pode-se perceber, contudo, que esse processo não é algo comum a todas as pessoas. Cada um tem o, digamos, botão em um diferente lugar. Portanto, não há como fazer um grande índex do que seria a arte - mesmo porque em um centésimo já ficaria defasado.

Isso tudo para dizer que estou lendo e adorando Dashiell Hamett, um clássico menor. Ou seja, uma arte considerada de "segundo escalão". Ele não faz parte dos norte-americanos da geração perdida, apesar de retratar o lado B dessa mesma época, não foi beatnik nem lembrado por essa galera, mesmo tendo antecedido muito da parte biográfica e do "live and let die" de Kerouac e cia., e fazia literatura, literalmente, barata.

Escrevia para revistas impressas em papel de péssima qualidade, as pulp fictions imortalizadas por outro rei do lado b, Quentin Tarantino, sobre detetives - basicamente - assassinatos e o submundo em geral. Criou a figura do detetive soturno, de capa de chuva e chapéu para se esconder, sempre com um cigarro na boca e andando pelas sombras. Daí um apelido dessa literatura: noir (já comentado no post anterior).

Ele não aborda o drama da existência humana, como os russos fazem, não passa horas tratando de uma decisão de vida ou morte, não há dramas de consciência. Ele é ágil, prático, mordaz, irônico, perfurocortante. Seu texto é tão planejado que chega a ser uma obra de engenharia, um cálculo matemático.

No fundo, a questão continua a mesma. Dashiell Hamett faz, claramente, parte do grupo "literatura de trama" (em oposição à de "personagem"), apesar de ter repetido seus protagonistas em mais de uma história. Sabe como é, ele ganhava por palavra escrita.

Mas é aí que mora a minha diversão. É aqui que eu falo "maneiro" (maior indicativo do que é obra de arte, nos dias de hoje. Mas isso é papo para outro post). A arte, às vezes, está nas coisas mais simples.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

O meio é a mensagem

O filme noir (preto em francês) é chamado assim pelas sombras e contrastes exagerados, oriundos do expressionismo alemão da década de 1920. Por sua vez, a literatura noir, que recebeu esse nome por causa dos filmes e de uma série de livros de uma editora francesa.

Já a letteratura gialla (literatura amarela, em italiano), tem essa alcunha porque era impresso com capa... amarela.

Já "pulp fiction" porque utilizavam a polpa da celulose, mais barata, para imprimir os livros e revistas, geralmente cheios de violência e estilo. Curiosamente Dashiell Hammet é conhecido pelos seus livros de pulp fiction e noir. Mas, principalmente, pelo hard boiled, algo como "muito cozido".

Ah, as metáforas.

sábado, 12 de abril de 2008

Separados ao nascer

A "Dança do quadrado" é a versão tupiniquim para "Macarena" (ou uma versão atualizada da "Dança da pamonha").

Realismo real

Entre as várias qualidades de "À sangue frio", de Truman Capote, está a ambivalência de seus personagens. Uum sujeito é e ao mesmo tempo, ou em outra oportunidade, não é determinada coisa. Ele pode simplesmente se contrariar, agir opostamente como se previa, se dizia que ia agir, ou como teria agido havia cinco minutos. As opções são praticamente infinitas.

Por ser uma história real - ou pelo menos baseada em, segundo os seus detratores - Capote teve a liberdade de narrar uma situação - na falta de expressão melhor - real. Em que a ambigüidade é a regra. Os seres humanos somos múltiplos, ora.

A curiosidade fica, curiosamente, nas obras de ficção ditas realísticas (mas não somente desta categoria). Os autores, com medo de suas personagens serem encaradas como incongruentes, via de regra seguem uma determinada cartilha em que a contrariedade, ambigüidade e a ambivalência não são possíveis. O mais engraçado: fazem uso desse determinado índex exatamente para ser encarado como factíveis. Isso quer dizer: para serem vistos como realistas, devem escrever menos realisticamente.

Capote tinha a vantagem de descrever situações reais, portanto, não poderia inventar nada. Ou nós que acreditamos no retrato fidedigno das situações. Mas, se o resultado é uma obra-prima, que diferença faz ser a realidade ou a invenção?

terça-feira, 1 de abril de 2008

Sociologia gastronômica

Já escrevi sobre minha teoria de que os pobres de cada cultura emplacam a comida típica da sua região / país. Como exemplo dou sempre os mesmos: a feijoada no Brasil, a paella de Valência e adjacências - uma espécie de feijoada sem feijão e com frutos do mar no lugar do porco - e o fondue, suíço, uma mistura de diversos queijos que, no inverno, haviam ficado duros demais para comer e que eram esquentados numa panela com vinho (mais informações aqui).

Mas a questão é que há outra interpretação sociológica para a gastronomia. Uma interpretação digna do epíteto "de botequim". Foi desenvolvida em parceria com um amigo meu, que fez a, digamos, introdução.

Como diria Luís Fernando Veríssimo, o mundo está nas escolhas. Entre abotoar a camisa de baixo para cima, ou inverso, se barbear de cima para baixo, ou o inverso, ou colocar o feijão em baixo ou em cima do arroz. Isso pode demonstrar mais do que sugere nossa vã filosofia.

Segundo o meu amigo, ao colocar por baixo o feijão, isso demonstra uma origem mais modesta do cidadão, que compactava a sua comida em dois grandes temas: o feijão-com-arroz e o resto. Assim, o arroz faria a separação entre o feijão e os demais ingredientes, não permitindo que o grão escuro e suculento manchasse a carne ou outros legumes.

Além do que, o feijão-com-arroz seria a base de tudo podendo variar na quantidade de acordo com sua fome - o que é o cargo chefe da teoria de meu amigo. Como é mais barato, a possibilidade de tê-lo em maior quantidade que a carne, por exemplo, teria criado esse hábito de se precaver.

Já quem coloca o feijão por cima do arroz, geralmente deixa a dupla num canto do prato, acrescentando o que tiver no restante do recipiente. A separação, portanto, é mais complexa e demonstra uma maior variedade de componentes. O feijão e arroz, aqui, é apenas mais um coadjuvante, em vez de uma espécie de exército de ocupação.

Outra teoria seria na forma de apresentação do feijão: mais ou menos grosso? Com muito ou pouco caldo? A conclusão desta é ainda mais simples. Os que preferem com mais caldo seriam das extrações populacionais com menos poder aquisitivo por motivos óbvios. Lembrai da música de Francisco Buarque de Hollanda. E o inverso seria verdadeiro, por motivos também explícitos.

Agora fica a dúvida: e quem gosta do feijão em cima do arroz e com pouco caldo? Ou o inverso? Ah, a classe média, sempre inclassificável.

sexta-feira, 14 de março de 2008

Com juízo e justiça

Conversei esta semana com Maria Augusta Ramos, diretora de "Justiça" e "Juízo". Publicamos uma materiazinha pequena, com algumas informações. Um amigo sugeriu publicar a íntegra. Copio abaixo. Vai dar um bom trabalho terminar de ler tudo. Ótimo para passar o tempo até o próximo post.

I) Por que voltar ao tema justiça?
Porque eu curti muito fazer “Justiça”. Não que tenha sido fácil fazer, porque é uma realidade muito dura e em “Juízo” é ainda mais. Mas eu achei o filme necessário. E eu achei que a “Justiça”, as audiências, o teatro da Justiça me possibilita fazer o cinema que eu quero fazer. Sem entrevista, um cinema de observação. E o meu trabalho tem mais interesse pelos relacionamentos humanos, as relações sociais. E, com a Justiça, você não precisa fazer as coisas acontecerem.

II) Documentário “não-jornalístico”?
Porque é o meu barato. Eu estou interessada nessas relações humanas. Retratar as relações sociais, as relações humanas. Como o meio influencia (as relações).

II.I) Intervenção:
Não é só uma questão de interferência. Eu também, por um lado, existe também um, eu não quero intervir ali porque, a mim, me interessa, retratar isso, esse relacionamento em si, as pessoas em si convivendo com esse meio. Como eles convivem com nesse ambiente, no caso, que é o universo da Justiça, ou o universo social da sociedade brasileira. Os dois filmes, mal ou bem, abordam. A questão da luta de poder...

III) Reflexão do público
Por um lado um sinal de respeito, por outro tem uma razão estética, de levar o público a uma reflexão. É olhar para aquilo que está se passando na tela e refletir sobre o que está vendo. É claro que eu manipulo o tempo todo. Mas há níveis de manipulação. Eu acredito que não traz, não interfira, não traz as questões prontas. E eu nem tenho como explicar, eu não sei. Porque o filme para mim, quando eu começo a filmar, é uma viagem de descoberta. Eu não vou fazer “eu quero dizer isso ou aquilo”. E nem no final, eu sei exatamente o que eu quis dizer. Eu acho que o barato é, justamente, deixar que a realidade fale por si só. E que o público veja muito mais do que eu, cada um veja um pouco o que quer ver...

IV) Sentir o filme.
Eu aprendi tanto ao fazer o filme que essa questão... Nem o “Justiça” nem o “Juízo”, se propõe a informar como o sistema penal no Brasil funciona, mas eu acho que também é importante a gente sentir. Chegar ao público também não só apenas da via da reflexão, mas se colocar um pouco no papel daqueles personagens.

V) Personagens à vontade
Porque elas se acostumam com as câmeras. As audiências são tão tensas, do lado dos réus e dos familiares que eles só estão interessados na sentença, no que a juíza vai dizer. No caso dos personagens principais (de “Justiça”), fiquei muito amiga das pessoas.

VI) Filmes bem recebido pelo Poder Judiciário,
O “Justiça” foi bem recebido pelo Poder Judiciário, pela ala mais progressista dos magistrados. Tanto o “Justiça” como o “Juízo” não apontam o dedo para quem é o culpado. Eu acho que é uma tendência que a mídia tem, “ah, esse é o culpado”. Acho que tudo é mais completo. Por que aquelas pessoas foram parar ali, etc. O Judiciário não pode dar conta das mazelas, da falta de, da precariedade de tudo, para tomar conta dos adolescentes, no caso do “Juízo”.


VII) Autorização para filmar as audiências
Quando eu fiz o “Justiça”, fui falar com os juízes... Primeiro eu passei cinco dias indo de uma vara a outra ouvindo audiência. Eu escolhi alguns juízes porque eu achei interessante. Eu fui a esses juízes e propus e falei para eles que não era, que eu não ia, de maneira alguma apontar o dedo, ou criar um “scapegoat” (bode expiatório). Mas justamente humanizá-los. Porque fica esse maniqueísmo entre juiz bom e juiz mau, que esse juiz é corrupto, que esse juiz não é corrupto. Mas que eu estava interessada em histórias, complexas, que é uma realidade complexa, queria humanizar tanto o réu, como o juiz, como o defensor, como o promotor.

VIII) Lugar dos personagens
Você queria estar na cadeira da juíza ali? Ninguém quer. Eu não quero ficar no lugar da juíza. E nem no lugar do agente do Degase. Porque a gente mete o pau... mas entra ali. Uma instituição que não tem recurso, que o estado não via com bons olhos, não existe uma vontade política para mudar a realidade do menor infrator. Essas pessoas que vão trabalhar nesses lugares, às vezes tem que levar lâmpadas. O sabonete, os pais que levam. Sabonete, os chinelos...

IX) Audiência maiores x menores
O ministério público da vara (da juventude e da criança) abraçou o filme. Eles (juízes, promotores e defensores) são muito mais amáveis com os menores.

X) Ficção
Estou trabalhando agora num roteiro, para fazer ficção, mas é uma ficção em que não vou usar atores profissionais. E é uma ficção muito próxima da realidade. Mas eu gosto muito de trabalhar com documentário. Me inspira muito a realidade.

XI) Como foi dirigir os atores
Eu sempre coloquei para eles, que eu não queria que eles atuassem. Queria que eles fossem eles mesmos. Que eles falassem aquele texto, que eles contracenassem com a juíza, que no caso era eu, como se eles estivessem sentados ali naquela cadeira. Então, sobre a questão do próprio texto. Eles não repetiam exatamente o mesmo que havia sido dito. Eles diziam a mesma coisa da maneira deles. Há situações, em que se você prestar a atenção, há respostas que são movimentos de cabeça. É um “não”, é um jeito, todos os trejeitos que são deles mesmo, são coisa que eu acontecer, eu disse: “é isso o que eu quero”. O Alexandre tem uma hora que ela pergunta e ele faz um trejeito dele. Foi isso que eu tentei. A gente trabalhou muito nisso com eles. O meu trabalho com eles, eu apontei para eles nessa direção. A maneira que eles fossem como eles realmente agem. Eu apontei para eles a maneira como eles faziam. Eu dizia “Faz assim, eu gosto, é você”.

XII) Credibilidade dos atores em um documentário
Isso tem dois aspectos. Primeiro é esse trabalho com os meninos, para os meninos serem eles mesmos. E segundo o fato dos meninos serem de realidades, absolutamente, quase iguais.

XIII) Realidades quase iguais
Alguém me perguntou se foi difícil achar esses meninos, eu acho que não. Esses meninos são talentosos, mas eu acho que não foi difícil e não seria difícil achar meninos que vivem a mesma realidade porque todos eles vivem. 75% das meninas adolescentes estão grávidas ou são mães, isso é muito assustador. Ali em Bangu, quase todas as meninas estão grávidas. Com exceção da Karina, que não quer ir embora, e de uma outra, todas elas tinha filhos. A Isabela, que foi a primeira, que tem o filhinho, que aparece, a irmã dela ficou grávida também com 13 anos. Foi muito assustador. Isso é que foi tão importante. Porque é uma realidade muito próxima. A gente às vezes não dá conta de que filmar no Padre Severino era uma barra. Eu dizia para eles, vocês vão encontrar gente da favela, até colegas de vocês e não pode falar nem cumprimentar. E obviamente eles encontravam e cumprimentavam. E isso foi importante. A consciência de que eles poderiam estar ali. E também para o público, que o público vê isso, essa realidade deles, está estampada no rosto.

XIV)Filme sobre uma geração
Acho que é sobre essa geração. E é por isso que eu quis mostrar o rosto. De jovens, de crianças, de adolescentes, de gente de comunidades carentes, que sabem, que tem consciência da miséria em que vivem, da falta de possibilidades, da perspectiva de vida, que se sentem explorados, que acham que têm mais direitos lhes é dado, e que ao mesmo tempo estão sedentos, que querem sair dali, que querem trabalho, que querem estudar. Que tem uma sede de possibilidades. Eu acho que isso está ali, porque tem isso mesmo.

XV) Rio
Eu gosto muito do Rio, meu pai é do Rio. Eu acho que para Brasília eu não voltaria. Eu adoro o Rio, eu adoro o jeito de ser do Rio. O povo do Rio, o carioca.

XVI) A violência no Rio
Ao ver o filme, o público vai ver uma violência constante. Eu acho que você sente a violência. Ela não é explícita, ela não é como “tropa de elite”, mas tem uma coisa da violência explodir ali. Pela violência que esses meninos vivem, pela opressão que eles sentem ali, naquele momento, a própria impotência da juíza, dos promotores, de nós de classe média, que, mal ou bem, é uma violência. A gente vive uma tensão. A violência implícita, porque eu não vi ninguém bater em ninguém, que é esses meninos terem a liberdade restringida. Qualquer presídio, pode ser aqui ou na Dinamarca, pode ser limpo ou não, existe uma violência nisso – não vou entrar no mérito se merece, ou não. Nesses lugares, você tirou a vida dessas pessoas. Isso é uma violência.

XVII) Más condições do Padre Severino
Eu e a equipe inteira, depois de passar um dia inteiro no Padre Severino, a gente ficava moído. Saía de lá... é muito pesado. E é pesado por causa da tortura? Não, nem precisa. E não era eu ou a gente ser cuidadosa. Eles não são preparados e querem ser preparados. A falta de recurso é generalizada. Imagina. Jogar a culpa nos caras....

XVIII) Pena de morte
Sou totalmente contra. Esse argumento de que “se aumentar as penas ou penas mais severas para os presos, a criminalidade vai diminuir” é uma besteira. Já foi provado estatisticamente que não funciona. Os EUA têm a maior população carcerária do planeta. Inclusive você tem 73 adolescentes que estão cumprindo prisão perpétua nos EUA. Porque em vários estados não existe Vara da Infância e da Juventude e eles são julgados como adultos. Isso para mim é um pecado.

XIX) reduzir a maioridade penal
Não vai adiantar de absolutamente nada. Você só vai colocar mais gente no presídio. Porque aí o garoto vai sair do Padre Severino e vai para Bangu. Eu acho que essa não é a solução.

XX) Solução
A solução é fazer com que eles não cheguem ali. É conter essa massa de acusados, de delitos. Enquanto eles chegam ali, tentar, porque não dá para mudar a sociedade de uma hora para outra, dar a possibilidade de ressocialização, que essas pessoas não precisam reincidir. Mas é isso que acontece. Ele sai sem a menor possibilidade de trabalho e aí volta. Você vai passar fome?

XXI) pessimismo
Às vezes a gente fica muito pessimista. Por causa da impotência, né?

sexta-feira, 7 de março de 2008

De coração

Um atacante se chama Washington, o outro, um nome dissílabo. No meio, um armador com sotaque espanhol. No gol, um goleiro com nome composto. Não é nada disso (Fluminense 1984) que você está pensando, é da versão 2008 que eu estou falando. Que, tirando o pó de arroz, essa tradição boba e vergonhosa, fez muito bonito na quarta-feira. Dodô fez o gol mais bonito que eu vi na minha vida inteira de tricolor, por exemplo.

quarta-feira, 5 de março de 2008

Pensamento enquanto o trabalho não me exige

Mais uma falsa autobiografia foi revelada. "Love and consequences", que narraria a vida de Margaret B. Jones, é apenas uma obra de ficção. Como biografia, foi elogiada - reparem na contradição.

A questão acontece depois de "Misha: A memoire of the holocaust years", de Misha Defonseca, e "A million little pieces", de James Frey, que também deveriam ser relatos "verídicos" e se descobriram farsas - sublinho as acepções da palavra. Ou seja, há uma interação com o leitor. É quase uma instalação. Isso sem falar no J.T. LeRoy.

Tudo bem, hoje em dia eu até já admito que há mais interesse em obras que seriam espelhadas na realidade (seja lá o que isso quer dizer), ou em outros termos, ""biográficas"". E também é claro que eu entendo por que as pessoas ficam irritadas ao descobrirem o, digamos, engano.

Mas sugiro que essas pessoas, esses autores enganosos, estão fazendo o que todo escritor faz: mentir. E estão fazendo muito bem - pelo menos por um tempo.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Lua de mel com o mundo

Os EUA estão em lua de mel com o mundo. Primeiro é a campanha presidencial que está levando os terráqueos a prestar a atenção, ainda mais que nos anos anteriores, em um negro filho de nigeriano cujo sobrenome é Hussein e que estudou numa escola muçulmana na Indonésia. Agora foi essa cerimônia do Oscar - que eu não vi em protesto contra a Globo que a transmitiu pela metade - que premiou todos os meus preferidos - com a exceção da Cate Blanchett.

Talvez tenha uma ligação entre o cinema e a situação política americana. Os filmes - e a sua receptividade por parte da tradicional academia - seria o medidor (me recuso a usar a expressão batida "termômetro") de como anda a percepção geral sobre o país e o mundo. Um exemplo do "liberalismo" deste ano são os vencedores de ator / atriz / e coadjuvantes. Nenhum é americano, sendo que dois não são nem anglófilos e uma interpretou um papel falando em francês. O clima anda multicultural.

Entretanto, os meus preferidos são:



Diablo Cody, roteirista de "Juno". Assim como Obama, ela foge do estereótipo de sua categoria. Tudo bem que os roteiristas são os mais loucos entre os loucos, vide a indicação do irmão gêmeo inexistente de Charlie Kaufman, por "Adaptação". Mas ela está um passo além.

O meu segundo favorito é:




"Once" é um filme pequeno até para os padrões de pequeno. Pequeno é "Juno", aí de cima, o longa irlandês, sobrinho do "The Commitments" é minúsculo. Filmado entre amigos, em três semanas, com uma grana ínfima... e é bom. Divertido, interessante e as músicas são ótimas. Assisti-lo só uma vez é impossível.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

I beg your pardon?

É inegável a minha empolgação com Barack Hussein Obama, na corrida pela presidência americana. Claro que isso não vai me afetar em nada, diretamente. Mas, saber que um sujeito filho de queniano, negro, que estudou numa escola de muçulmanos, ex-morador da Indonésia, que já admitiu ter usado drogas, que tem 90% das contribuições de campanha de eleitores que deram US$ 100, pode ser o presidente dos EUA é muito inusitado para me deixar inerte. O que demonstra que, em termos de igualdade entre os diferentes, estamos ainda muito atrás deles.

A questão é outra. Já ouvi dizer que, por causa das prévias, os americanos demonstram que o sistema de escolha de candidatos é muito mais democrático que o nosso. Bem, isso é inegável. No Brasil, os partidos são chefiados por caciques desde Pedro Álvares Cabral. A negação fica ao quererem generalizar a questão da democracia.

Se disserem que os EUA são o país mais democrático do mundo, desconfie. Não é porque eles tiveram líderes respeitáveis - Lincoln, Washington, Franklin D. Roosevelt, até o Kennedy, por que não? - que eles podem se gabar por completo. A primeira eleição de Bush filho está aí para nos lembrar que o sujeito subiu ao poder tendo menos votos que o adversário, Al Gore.

Obviamente o sistema de correção de votos, nos EUA, funciona principalmente porque o sufrágio é universal, mas não obrigatório. Eles optam por compensar a importância dos estados, sem que o Iowa tenha mais importância que a Flórida, por exemplo. Mas, na minha cabeça de ignorante, democracia é o poder do povo, e se o povo não quis opinar, estava aceitando qualquer coisa. Quem ganhou, deveria levar o trono. O resultado, todo mundo sabe.

Portanto, americanos, votem no Obama. E mostrem que são democratas, ainda.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Tráfico de dengue

Qual a diferença entre o traficante de drogas e o cara que deixa água parada em casa transformando o local em criadouro de dengue? Os dois sujeitos são vetores das suas respectivas doenças. Então, de um ponto de vista de política pública, os dois causam basicamente os mesmo prejuízos.

O traficante vende drogas de propósito; o criadouro, muitas vezes, age sem pensar. É a mesma diferença entre o homicídio doloso e o culposo. Um ganha a pena menor, mas o fim, em si, é o mesmo e causa a mesma dor.

Claro que o traficante, com o dinheiro do seu comércio, compra armas pesadas e o dono do pneu velho ou da garrafa vazia ou ainda do pratinho de plantas não tem nenhum "lucro" ao empoçar água limpa. Mas o comércio, em si, não deveria ser um argumento, salvo para aqueles ligados ao marxismo.

Já a compra da arma é conseqüência da subdivisão das gangues em morros. Dizem por aí que incentivada pela própria polícia. O curioso, porém, é que, em tese, o comerciante não gosta de guerra, gosta de ganhar dinheiro. Ou estou errado - o que é 50% possível? Ou seja, se fosse apenas uma grande facção, haveria menos violência.

Ou, heresia das heresias, se legalizássemos a venda de drogas, não haveria como substituir, a curto prazo, os valores arrecadados com o comércio de entorpecentes - para usar uma expressão burocrática.

Mas, argumentam alguns, com a legalização das drogas, haveria uma demanda grande dos serviços públicos de saúde, pelo menos na fase de desbunde. Ou seja, teríamos uma epidemia de viciados.

E, então, voltamos a dengue. Se essa hipótese acontecer - o que eu duvido, visto o que aconteceu em outros países que abrandaram as medidas de coerção - teríamos tanto ou mais problemas com o que estamos tendo com a dengue. O que torna, na essência, o produtor de água parada tão nocivo à sociedade quanto o traficante.

Mas essa idéia é idéia é por demais exótica para ser defendida em voz alta por aí. Não aconselho nem a reprodução.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

Épocas

Jonathan Swift nas suas "Viagens de Gulliver" afirma que as teorias de atrações dos corpos de Newton seria apenas uma das muitas teorias sobre o caso na evolução da ciência. O irlandês cita outras, de Aristóteles a Descartes, que explicaram o mundo nas suas épocas.

Além de demonstrar que o passo de Newton, seu desafeto oficial, era um arremate para uma longa caminhada, diferentemente do que aprendemos nas aulas de física, Swift avisa de algo mais interessante. Nem mesmo as ciências naturais estão a salvo do revisionismo histórico. Está aí a física quântica que não me deixa mentir.

Mais que uma visão, a picuinha pessoal de Swift demonstrou que devemos crer descrendo até da mais sólida realidade. Que uma conclusão final é apenas a metade do caminho para outra. Ou, como dizia o próprio Newton, "o que sabemos é uma gota, o que ignoramos, um oceano".

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Espaço ideal para Day-Lewis

"Sangue Negro" é um veículo para Daniel Day-Lewis que, por durante duas horas e quarenta minutos, é transformado na pele de um self-made man americano da área de petróleo na virada do século XIX para o XX.

Isso não quer dizer que vemos o estereótipo do capitalista sem escrúpulos que tenta de todas as maneiras que conhece enriquecer. Ou melhor, não vemos SÓ isso. O filme do ex-independente Paul Thomas Anderson (conhecido por "Boogie Nights", "Magnólia" e "Embriagado de Amor") foge do lugar-comum. À medida que o épico avança, vamos conhecendo mais facetas de Daniel Plainview (Lewis).

De mineiro que trabalha sem ninguém a um magnata petroleiro. Além de negociador de terras, pai amoroso, irmão vingativo, empresário interesseiro e ambicioso, homem de negócios que não enxerga rival e, principalmente, sujeito sozinho e rancoroso. Alguém que não tem vínculos com familiares ou amigos e que não sabe lidar com essa falta. Vive isolado e quer se isolar ainda mais – o que acaba acontecendo.

Nunca acontece
Mesmo com a duração acima dos padrões atuais, os créditos pegam o espectador de surpresa. Primeiro, porque nunca sabemos exatamente o que acontecerá na tela no momento seguinte. Segundo, porque o fim é, de certa forma, inesperado. Poderia ser o início de uma nova fase do filme. Terceiro, e principal fator, porque o filme nunca "acontece".

Apesar de imprevisível, as mudanças de rumo de "There Will Be Blood" (no título original) são sutis, quase imperceptíveis. Os conflitos são constantes e não marcam grandes transformações na trama. Talvez a mais marcante aconteça logo no início do épico, quando Plainview é avisado da existência de uma cidade que praticamente bóia sobre petróleo.

Esses conflitos constantes, bem distantes dos padrões hollywoodianos de marcar três grandes atos com duas reviravoltas do roteiro, podem ser encarados como um diferencial ou como um exotismo aos paladares mais conservadores. O espectador decide.

PT Anderson, entretanto, parece não se preocupar com tradições. Ele quer desvendar a personalidade de seu personagem e nos mostrar, camada por camada, quem é esse Daniel Plainview. Fazer com que pensemos que cada uma de suas ações tem uma motivação por trás e que aquele sujeito que enxergamos tem múltiplas faces que podem ser interpretadas de diversas formas. Sorte a dele, e a nossa, que Anderson contou com Day-Lewis para o papel.

Os memoriosos

"Segundo a revista, os cientistas da Universidade da Califórnia em Irvine, nos Estados Unidos, começaram a pesquisar sobre a habilidade da memória de AJ há sete anos, quando ela procurou os acadêmicos dizendo que se sentia "exausta" e que as lembranças eram como um "fardo" que ela tinha que carregar." Daqui.

"Ireneo começou por enumerar, em latim e espanhol, os casos de memória prodigiosa registrados pela Naturalis historia: Ciro, rei dos persas, que sabia chamar pelo nome todos os soldados de seus exércitos; Metríadates e Eupator, que administrava a justiça dos 22 idiomas de seu império; Simónides, inventor da mnemotecnia; Metrodoro, que professava a arte de repetir com fidelidade o escutado de uma só vez. Com evidente boa fé maravilhou-se de que tais casos maravilharam." Dali.

E ainda diziam que Borges era um escritor fantástico.

sábado, 2 de fevereiro de 2008

O país dos fortes

Um homem encontra uma pequena fortuna junto a corpos de criminosos. Começa a ser perseguido por um assassino obstinado em conseguir atingir a sua meta, que vai muito além de recuperar o dinheiro. Para impedi-lo, apenas um xerife interiorano e em fim de carreira. Podemos estar em qualquer época da História, mas, com certeza, estamos nos EUA.

A premissa básica do novo filme dos Coen ("No country for old man") parece simples. O desenrolar, entretanto, é surpreendente. Não porque situações inusitadas acontecerão, mas porque o significado dos símbolos exibidos tornam o filme muito maior que um faroeste deslocado de seu tempo.

Os personagens são atemporais exatamente porque no cerne americano mora este tipo de caubói, que quer resolver as diferenças com as próprias mãos. É o homem que foi para o Oeste idílico à procura de ouro, petróleo (tema do filme de PT Anderson: "There will be blood"), ou terra para começar uma nova vida.

Enquanto no Leste, os EUA eram formados seguindo uma lógica européia, tanto no Norte industrializado quanto no Sul escravista, o Oeste foi conquistado matando índios, expulsando os mexicanos, guerreando com espanhóis.

Homens como Anton Chigurh (um Javier Bardem numa atuação histórica) foram importantes e, às vezes, necessários como capangas de magnatas que queriam comprar, explorar, destruir terras. Enquanto que sujeitos comuns, que têm o seu trailer ou rancho, vão para o exército, caçam nos fins de semana, se casam com a namorado do colégio, como Llewelyn Moss (Josh Brolin), aparecem para reclamar da invasão de sua propriedade, da oportunidade perdida, a possibilidade de um sentido para a vida.

Senão por todos estes motivos, "Onde os fracos não têm vez" ficará eternizado pela dupla Tommy Lee Jones, como o xerife Ed Tom Bell, e Bardem. Se o primeiro consegue criar um experiente policial assustado com a violência, fragilizado pelo desconhecido que pode matá-lo a qualquer momento, Bardem institui um personagem único. Para entrar para a galeria dos melhores vilões de todos os tempos. Ao lado de Hannibal Lecter.

***

A cena em que Chigurh explode um carro para entrar na farmácia e roubar medicamentos é, simplesmente, antológica.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Contagem regressiva

Para os homens, filmes violentos devem conter tiros, carnificinas, mortes. A única semelhança com o mesmo conceito para as mulheres é no quesito “morte”. É o que mostra o “4 meses, 3 semanas, 2 dias”, que levou a Palma de Ouro do ano passado. Não quer dizer que o longa romeno não vai ser bem interpretado pelos com cromossomos Y. Afirmar isso seria, no mínimo, sexismo.

A questão é quase biológica. O filme aborda aborto, estupro, discriminação sexual, abandono de grávidas. Fatores que falam mais às mulheres que aos homens. Mas como dito no parágrafo anterior, não é uma produção voltada para elas. E talvez seja essa a sua grande qualidade.

Conseguir comunicar aos homens todas as dores e aflições que elas sentem, ou devem sentir, ao tentar interromper uma gravidez indesejada, num país em que isto é visto como crime. Ao optar pelo “mercado negro”, como, aliás, acontece cotidianamente na Romênia comunista da década de 1980, segundo o filme, estar à mercê de um sujeito que, pior que um carniceiro, se aproveita da fragilidade alheia para destroçar sua dignidade.

Ultrarrealista, capaz de captar diálogos sem a menor importância aparente, reproduzindo cenas perdidas e inócuas, o longa mexe com o estômago e outros órgãos que os homens nem sabiam que possuíam.

sábado, 26 de janeiro de 2008

E quem está?

Todd Haynes não é um sujeito de muitos filmes. Desde 1991, quando estreou na direção, fez apenas cinco. Ficou conhecido com uma cinebiografia sobre um músico inexistente, mas calcado diretamente nos ídolos glam, especificamente David Bowie e, forçando a barra, o seu "relacionamento" com Lou Reed. Era 1998 e o filme se chamava "Velvet Goldmine".

Quase dez anos depois e apenas um filme rodado (o falsamente capriano "Longe do Paraíso"), ele volta a dirigir um longa sobre um ídolo do rock. Mas, como uma antípoda de "Velvet", ele biografa alguém existente usando personagens e histórias inexistentes. Estamos em 2007, o longa se intitula "I'm not There" e o cantor "retratado" é Bob Dylan.

"Eu não estou lá", o estranho título aqui do Brasil, é um filme sensorial, sinestésico até. Não se atem aos fatos, mas às sensações. Não dá resposta, sugere sentimentos. Não é literal, é literário.

Para começar, no começo da projeção, há uma frase que explica que o longa é baseado nas várias vidas de Dylan. Para interpretar cada uma delas, Haynes escolhe seis atores - incluindo um garoto negro e Cate Blanchett - e seis estéticas diferentes. Do falso documentário ao filme dentro do filme, passando pelo século XIX, com Billy the Kid, himself, e uma entrevista tête -à-tête com Arthur Rimbaud, também lui-même.

Com Haynes, as influências de Dylan se transformam em Dylan. O imaginário, as conseqüências abstratas, exageradas ou inventadas de seus atos, as interpretações, adaptações, as figuras de linguagem, tudo que circunavega a vida do cantor, poeta e músico dono de um longo etc. se transforma no próprio Dylan.

Não falta interesse, portanto, sobre o longa. Mas falta cola. Talvez por ser tão sensorial, não se atém ao detalhe que é a necessidade de prender a atenção do espectador 100% do tempo. É possível se pegar flanando para fora da tela, acompanhando um raciocínio que o filme despertou. Talvez seja essa a intenção. Completar os sentidos atingidos pelo cinema, visão e audição, com uma outra característica: a imaginação.